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19/09/2023

Da Antiguidade aos dias atuais, a mão do cartógrafo em qualquer projeto

Soraya Misleh/Comunicação

 

Profissão cujas raízes são milenares, o engenheiro cartógrafo e agrimensor é indispensável em uma obra civil ou ao agronegócio. Quem explica é o profissional da modalidade Antonio Maria Garcia Tommaselli, “O mapeamento é o primeiro passo em qualquer projeto de engenharia”, afirma o profissional da modalidade Antonio Maria Garcia Tommaselli.

 

Professor titular de Engenharia Cartográfica da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), campus Presidente Prudente, onde se graduou em 1983, iniciou sua carreira na instituição como auxiliar de ensino em 1985, tendo posteriormente assumido uma série de funções, entre elas chefe de departamento e coordenador do curso de pós-graduação. Tommaselli é um dos 598 engenheiros cartógrafos e agrimensores no Brasil, registrados no Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea), dos quais 202 são mulheres.

 

Conforme o Mapa da Profissão elaborado pela área de Oportunidades na Engenharia do SEESP, estes “realizam atividades em topografia, geodésia e batimetria, levantando e calculando pontos; elaboram documentos cartográficos, estabelecendo semiologia e articulação de cartas; efetuam levantamentos por meio de imagens terrestres, aéreas e orbitais; gerenciam projetos e obras de agrimensura e cartografia; assessoram na implantação de sistemas de informações geográficas; implementam projetos geométricos; e podem pesquisar novas tecnologias”.

 

Professor Antonio Tommaselli: profissão milenar com muitas inovações na atualidade. Foto: Acervo pessoal 

Mestre em Ciências Geodésicas pela Universidade Federal do Paraná (1988), doutor em Engenharia Elétrica na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), na área de Automação (1993), livre-docente pela Unesp (1998) e pós-doutor pela University College London, Tommaselli é vice-presidente da Comissão I da Sociedade Internacional de Fotogrametria e Sensoriamento Remoto (ISPRS, na sigla em inglês). Com ampla experiência na área de Geociências, com ênfase em Fotogrametria, desenvolveu sua trajetória profissional na docência e pesquisa, com projetos que contribuíram para a evolução tecnológica na engenharia cartográfica.

 

É o que relata nesta entrevista ao SEESP, em que fala sobre a profissão com raízes na Antiguidade e hoje muitas inovações, vasto campo de atuação e amplas perspectivas de trabalho.

 

Fale sobre a profissão de Engenharia Cartográfica e Agrimensura.

É um campo profissional pouco conhecido, mas é milenar. Estive no Egito agora num congresso bienal de tecnologia, o Geoespatial Week, da Sociedade Internacional de Fotogrametria e Sensoriamento Remoto [realizado entre 2 e 7 de setembro no Cairo, em que há intercâmbio das inovações internacionais em workshops e conferências]. A gente procura as raízes da cartografia e agrimensura e estão lá no mundo antigo, há 5 mil anos. A tradição vem de lá, porque cada vez que o Rio Nilo enchia, eles tinham que reconstruir as propriedades, as parcelas. A agrimensura é mais antiga do que tudo, porque assim que se tornou um agricultor, o homem já tinha que desenvolver essas técnicas de medição, agrimensura e cartografia, e o agrimensor tinha alto status porque era justamente quem fazia isso. A cartografia, construção de mapas, começou na Mesopotâmia até antes disso, tem mapas lá descrevendo os rios, porque existem interesses na navegação e no comércio. Antes do homem fazer escrita ele já sabia fazer mapas e, principalmente, medir as áreas. No mundo antigo já se fazia isso, a cartografia e agrimensura eram fundamentais para gestão do território, cobrança de tributos e reconstrução das propriedades, então é uma ciência muito antiga, assim como a arquitetura e engenharia nas sociedades antigas tinham um papel fundamental. Obviamente que evoluiu muito e hoje, com todas essas ferramentas, há muitas possibilidades, mas é uma área muito instigadora para os jovens, porque tem várias possibilidades de se especializarem. É menos conhecida do que as outras áreas, como civil, mecânica, mas é muito interessante.

 

Durante congresso no Egito, professor Antonio Tomaselli revisita raízes da engenharia cartográfica e de agrimensura. Foto: Acervo pessoal

 

Sua carreira é na área de pesquisa e docência. Pode falar um pouco dos projetos que participou e qual destaca como de maior relevância?

Tenho vários projetos de pesquisa e desenvolvimento (P&D). Um muito relevante foi com uma empresa de engenharia que se chama Engemap, em que desenvolvemos um sistema de aerofotogrametria totalmente digital na época em que ainda no Brasil se fazia com câmeras de filmes. É um projeto de 2004, financiado pela Fapesp [Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo], e envolvi um aluno de doutorado, um de mestrado e vários de iniciação científica para desenvolver esse sistema que tinha uma câmera digital já de porte menor, direto com GPS, um sistema muito inovador no Brasil e até mesmo no mundo, porque era pequeno, leve, de custo muito menor que os outros. A Engemap tanto vendeu esse sistema para outras empresas quanto usou para produzir, fez [o mapeamento] dos estados de Santa Catarina e da Bahia inteiros com ele. Teve grande impacto na época. Para você ter uma ideia, a Bahia é do tamanho da França, e foi feito todo o mapeamento com esse sistema desenvolvido aqui. Muitos outros projetos até hoje atualizam e usam esses sistemas, e vendem para outras empresas. Foi um projeto muito à frente na época, havia muita desconfiança das empresas acostumadas com uma tecnologia mais tradicional. Essa empresa acreditou e teve um grande desenvolvimento com isso. Houve ainda um projeto de P&D com a Duke Energy na área de mapeamento de erosões pesqueiras, entre outros. Esses são de grande porte, de mais relevância.

 

Qual o percentual de custo e peso menores nesse projeto da Engemap?

Em termos de preço acho que 20% a 30% de um sistema comercial de grande porte, até menos. Era baseado em câmeras profissionais muito leves, enquanto uma grande pesava algo como 50kg, 100kg, estas eram de 3kg, mas ainda embarcadas em aeronaves. Hoje alguns sistemas similares são embarcados em drones, desenvolvidos pela própria empresa. É a tecnologia que vemos nos drones de mapeamento digital e GPS. E na época foi bastante inovador, havia algumas empresas internacionais que faziam isso, aqui no Brasil ninguém fazia. Como deu muito certo, muita gente depois seguiu esse caminho, várias empresas no Brasil têm sistemas mais leves, há aquelas que trabalham com sistemas convencionais que têm um rendimento melhor, cobrem uma área maior, mas muitas empresas usam essa solução hoje.

 

Quais as possibilidades e áreas de atuação para o engenheiro cartógrafo?

Hoje juntamos duas formações e chama-se engenheiro cartógrafo e agrimensor ou agrimensor e cartógrafo, tem um escopo de atuação muito amplo. Pode trabalhar fazendo mapeamento para várias aplicações, com aerofotogrametria, com sensoriamento remoto por satélite, tem os sistemas terrestres de mapeamento móvel, em um carro ou uma mochila, há várias aplicações, levantamentos para projetos de engenharia, rodovias, barragens. Qualquer projeto de engenharia, loteamento, é precedido antes por um levantamento que é feito por um profissional da área. Essa é uma área, fazer um levantamento para obras de engenharia e infraestrutura. Tem as aplicações ambientais, em florestas, e um grande campo é sensoriamento remoto para agricultura, que é uma área em que o engenheiro cartógrafo tem uma boa formação, na área de geodésia, de sensoriamento remoto, de fotogrametria, então tem também grandes perspectivas. A área de cadastro urbano e rural é importantíssima e outro grande campo de atuação do cartógrafo e agrimensor. O georreferenciamento de imóveis rurais também e na área de análise espacial, de infraestrutura e logística. Pode trabalhar com sistema de informação para determinar rotas.

 

O cartógrafo então participa de qualquer projeto de engenharia?

Um projeto de engenharia tem que ter um levantamento antes do meio físico, trabalho de topografia, aerofotogrametria para levantar as altitudes, o que tem lá, então o primeiro passo do projeto é o mapeamento. Sem isso, o engenheiro civil ou outro que vem depois não vai conseguir fazer o projeto. O cartógrafo participa no começo e pode também atuar depois no acompanhamento da obra, com topografia, aerolevantamento. Ele tem atribuição para fazer isso, em conjunto obviamente com os outros profissionais de engenharia.

 

Com a preocupação com a sustentabilidade, mudanças climáticas, nas aplicações ambientais, também se abre um campo de trabalho para o engenheiro cartógrafo?

Sim, conhecimento do meio físico e monitoramento. Controle de desmatamento nada mais é do que mapeamento. É óbvio que não é feito pelo cartógrafo, mas ele tem a possibilidade de participar dessa equipe.

 

O mercado de trabalho então está bastante aquecido e com boas perspectivas?

Eu acho. A empregabilidade é muito alta dos nossos ex-alunos, existem muitas demandas que a gente não consegue nem atender.

 

Quais as principais inovações na área nos últimos dez anos?

É uma profissão que está sofrendo muitas mudanças, são muitos sensores novos. Tem sistema de levantamento móvel em mochilas e carros, robôs terrestres, veículos terrestres com câmeras a laser, drones. Tem milhares de satélites no espaço que se pode usar, uma grande quantidade de sensores e plataformas se pode carregar. Muitas tarefas que antes o operador fazia manualmente, como o cálculo, hoje são automatizadas, o engenheiro tem a função de fazer a seleção da tecnologia apropriada, em termos de custo e para atingir a qualidade que os usuários precisam, e ser capaz de fazer o controle de qualidade. Como isso muda muito, o cartógrafo tem que se adaptar continuamente, diferentemente de um profissional que se formou há 30 anos, hoje ele vai para a faculdade tem um conjunto de técnicas, quando termina, são outras.

 

A educação continuada é então fundamental para o engenheiro cartógrafo?

E a formação básica. Não adianta ele aprender simplesmente tecnologias. Se não tiver fundamentos sólidos em matemática, em física, nas ciências que fazem parte, não consegue aprender depois, o cartógrafo tem que sair da universidade com uma formação sólida que lhe permita aprender por conta própria, porque as coisas mudam todo ano, software, equipamento, ele tem que ser capaz de ler e entender. A base sólida é o principal atributo do engenheiro.

 

Quais as dicas para o jovem que está ingressando na profissão ou pretende seguir pelo caminho da engenharia cartográfica?

Tem que gostar de ciências exatas. Para ter sucesso tem que ter uma formação em inglês mínima, ser capaz de ler e se expressar, mas fundamentalmente ter uma boa base em matemática, física, nas ciências exatas, ter capacidade de gestão.

 

 

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