Área tem protagonismo em diversos setores da economia e inovações que projetaram o País para o mundo
Rosângela Ribeiro Gil
Oportunidades na Engenharia
A Engenharia Elétrica é o ramo que trabalha com os estudos e aplicações da eletricidade, eletromagnetismo e eletrônica. Este setor surgiu, no mundo, em meados do século XIX quando da comercialização, distribuição e utilização da energia elétrica. No Brasil, o Dia do Engenheiro Eletricista é celebrado em 23 de novembro, data em que, no ano de 1913, foi fundado o Instituto Eletrotécnico de Itajubá (MG), abrindo o caminho para a criação de outros cursos no País.
A modalidade é a terceira com o maior número de registros profissionais junto ao sistema profissional da categoria – os conselhos federal e estadual de engenharia e agronomia (Confea-Crea) – totalizando 107.890, vindo atrás da Civil (351.329) e Agronomia (108.981).
O engenheiro eletricista, graduado em 1974, e professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), José Roberto Cardoso, também coordenador do Conselho Tecnológico do SEESP, nesta entrevista, pontua com entusiasmo diversos momentos históricos da área no desenvolvimento do País e indica um futuro promissor com as tecnologias de informação e comunicação (TICs). “Hoje, somos o ´clínico geral´ da engenharia, papel que já foi desempenhado pela engenharia mecânica”, observa.
Professor do Departamento de Engenharia de Energia e Automação Elétricas, obteve os títulos de mestre, doutor e livre docente também pela USP. Entre 1987 e 1988, realizou pós-doutorado no Laboratoire d´Electrotechnique de Grenoble, na França. Ele faz questão de dizer que se sentiu honrado em ilustrar a matéria em celebração ao Dia dos Engenheiros Eletricistas. “Espero poder homenagear a todos com as minhas palavras. Lembro que muitos diretores do SEESP são oriundos da área, inclusive”, diz.
O profissional da área está relacionado ao desenvolvimento e à aplicação de conhecimentos científicos necessários à pesquisa, ao projeto e à implementação de sistemas diversos utilizados para efetuar o processamento da energia elétrica e da informação na forma de sinais elétricos digitais e analógicos. A profissão tem um campo de trabalho que inclui empresas de energia elétrica e telecomunicações, escritórios de projetos e consultoria, firmas de montagem e manutenção de instalações elétricas e de telecomunicações, indústrias, manutenção de equipamentos e componentes eletroeletrônicos, hospitais, empresas de radiodifusão, informática etc. “Se for relacionar tudo o que a área faz vamos escrever um livro”, brinca.
Antes de traçar a trajetória da modalidade dos anos 1970 até os dias atuais, o docente afirma que os novos tempos exigem um profissional de engenharia além do conhecimento técnico, mas que tenha competências que envolvem aptidões mentais, emocionais e sociais, e que saiba se comunicar corretamente na escrita e na língua oral. “Acredito que aliado a tudo isso tenha que ter humildade para saber ouvir e aprender e interagir com equipes cada vez mais multidisciplinares, que incluem gente de Humanas”, ensina.
Como o senhor apresentaria a engenharia elétrica hoje para os jovens profissionais e para aqueles que pretendem se graduar na área?
Afirmaria que a profissão assumiu uma dimensão que extrapola muito aquele conceito de engenheiro eletricista do passado, sobretudo por causa da inserção da computação, com a parte dos circuitos digitais, por exemplo. Estamos vendo a área em franco crescimento de oportunidades e campos de atuação. Arrisco a dizer que a engenharia elétrica, se considerarmos a parte da computação, é a mais importante do mundo atualmente. Porque toda parte de TI [Tecnologia da Informação] é oriunda da engenharia elétrica e, hoje, não existe atividade humana em que a TI não esteja presente.
O senhor fala que a modalidade seria uma espécie de “clínico geral” da engenharia.
Ao meu ver, de um ponto de vista bem pessoal, a engenharia elétrica hoje assume o papel que antes era da mecânica, por volta dos anos 1980 e 1990. Tudo o que acontecia na engenharia, nessa época, a mecânica conseguia resolver, até porque a indústria era baseada na mecânica, inclusive a infraestrutura. Era um engenheiro que tinha uma aceitação muito grande no mercado. Com o advento da tecnologia da informação esse papel se transfere muito para o engenheiro eletricista, mas para aqueles que estão realmente atualizados. Temos aí a internet das coisas, a tecnologia 5G e tudo o que vai aparecendo de avanço tecnológico.
O senhor pode falar do protagonismo da profissão em grandes obras nacionais?
Com certeza. A partir da década de 1970, vamos verificar um trabalho conjunto e bonito entre as engenharias elétrica e civil no desenvolvimento e projetos de grandes obras. Data dessa época a projeção e construção das primeiras usinas hidrelétricas [energia elétrica gerada por meio do aproveitamento do potencial hidráulico de um rio] do País.
O Estado de São Paulo, por exemplo, sempre tomando a dianteira, vai construir importantes usinas hidrelétricas, com a Companhia Energética de São Paulo (Cesp), como as instaladas no rio Paraná, de Ilha Solteira, Jupiá [Engenheiro Souza Dias] e Porto Primavera [Engenheiro Sergio Motta]; e outras duas no Vale do Paraíba do Sul – Paraibuna e Jaguari. Iniciativas que deixaram o Estado bem servido no que se refere à energia elétrica. Acredito que elas foram essenciais para alavancarem o desenvolvimento brasileiro, com as usinas, linhas de transmissão e as grandes subestações.
Como a área se expande para outras atuações?
Muito boa a pergunta, pois vamos ter um destaque da engenharia elétrica brasileira no desenvolvimento do nosso metrô. Considero um dos trabalhos mais refinados da nossa área, que usou técnicas pioneiras. O metrô de São Paulo foi o primeiro, no mundo, a utilizar a eletrônica de potência, que é o controle do motor de modo eletrônico, com circuito eletrônico.
Até então, os metrôs do mundo, mesmo o de Paris, considerado um dos mais antigos, funcionavam como bonde, uma tecnologia eletromecânica conhecida como “cames”. O Brasil foi o primeiro a usar eletrônica nesse modal. Engenharia genuinamente brasileira, que depois foi exportada para diversos países, como Estados Unidos, Portugal e várias cidades da América Latina. Foi uma competência criada pela engenharia brasileira, em especial pela modalidade elétrica. Assumimos esse protagonismo.
O pioneirismo também está na linha de transmissão de energia elétrica?
Exatamente. Aqui também pelas mãos da engenharia elétrica. O Brasil vai conceber e construir a primeira linha grande de transmissão de corrente contínua, com mais de 1.300 quilômetros, com a usina hidrelétrica de Itaipu [inaugurada em 1984 e pertencente ao Brasil e Paraguai]. Todas as linhas são de corrente alternada, Itaipu é a única. Agora, temos Belo Monte [Pará] e Jirau [Rondônia], usinas grandes, longe do centro e a energia vem na transmissão de corrente contínua. Todos os projetos foram feitos pelos brasileiros, os equipamentos não. Também aqui exportamos esse conhecimento para outros países. Outra competência muito grande adquirida pelo Brasil. Criamos tecnologia que foi utilizada em grandes obras no mundo inteiro.
Professor, como bem o senhor destacou hoje o mundo é movido pela tecnologia da informação. Como a engenharia elétrica entra nesse campo?
A engenharia elétrica está também na informática, na computação. Outra vez, seremos precursores de uma inovação. Fomos o primeiro país a realizar a declaração de tributos, como o Imposto de Renda, em programas de computador, isso a partir de 1991. O Brasil partia na frente na automação do preenchimento da declaração de imposto de renda. Isso teve o saber e o trabalho de engenheiros eletricistas brasileiros. E não podemos nos esquecer da grande inovação que foi a eleição via urna eletrônica, em 1997. Inovações que têm a engenharia elétrica na origem.
Na questão da matriz energética, onde a presença da engenharia elétrica é fundamental, como estamos em termos de sustentabilidade?
Não existe país que tenha uma geração de energia elétrica tão limpa quanto o Brasil. Oitenta por centro da nossa matriz são de fontes renováveis – hidráulica, fotovoltaica, eólica, por combustão do etanol. Em 1975, quando ainda não se falava tanto em sustentabilidade, o Brasil desenvolveu o projeto do etanol. Somos o único País, no mundo, que se o petróleo acabasse amanhã teria como substituí-lo.
Toda energia nossa é 40% sustentável. Você pode pegar qualquer país, como os Estados Unidos ou Alemanha, esse número não chega a 10%. A distância é muito grande pelo fato de termos aqui etanol e usinas hidrelétricas. Em tudo isso tem engenharia elétrica.
Na agricultura brasileira também?
Primeiro, importante lembrar que o Brasil, há um tempo, comprava quase todos os seus alimentos, e isso encarecia muito os preços de qualquer produto, da carne de frango ou de porco até diversos tipos de grãos. Ocorre que a produtividade do campo brasileiro ganhou um fôlego enorme, e hoje o País é um grande exportador para o mundo. Aqui também tem muita engenharia: desde a mecânica, com as máquinas agrícolas, até a elétrica, com a aplicação da tecnologia de precisão, na parte de gestão e controle. É claro que estão nesse desenvolvimento diversas outras engenharias, todas muito importantes.
O campo de atuação da engenharia elétrica também está em pesquisas científicas?
A área tem presença fundamental e marcante nas pesquisas de alto nível, que levaram, por exemplo, à descoberta de grandes equipamentos de imagem para a área de saúde e medicina. Um caso muito bom para falar aqui é o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), de Campinas (SP), com o acelerador de partículas, o Sirius. Aqui é engenharia elétrica na veia!
Para finalizar, como o senhor incluiria todas essas competências da engenharia elétrica dentro da perspectiva do engenheiro moderno?
O ensino da Engenharia, no País, conta, agora, com novas diretrizes curriculares onde ganham destaque entre as competências a importância das soft skills, competências que envolvem aptidões mentais, emocionais e sociais. Por isso, o nosso estudante e o profissional precisam estimular essas habilidades. São atributos que vieram para ficar.
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