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Rodoviarismos e outros “ismos”

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Nestor Tupinambá

 

591OpiniaoIndividualMuitos têm advertido a Prefeitura de São Paulo e o Governo do Estado quanto aos projetos que supostamente visam melhorar a mobilidade, mas incorrem no ultrapassado "rodoviarismo". Contudo, o corpo de engenharia dessas instâncias de administração pública tem competência e não cometeria tal falha. Assim, o que se conclui é que o saber técnico foi subjugado pelo "imobiliarismo", ao qual interessa favorecer o automóvel.

 

Pela última Pesquisa Origem-Destino (OD), elaborada pelo Metrô de São Paulo, transportes individuais conseguiram um feito inédito e nefasto: ultrapassaram os modais coletivos, respondendo por quase 51% das viagens. Seguindo o exemplo das metrópoles europeias e asiáticas, deveríamos estar atingindo, ao menos, cerca de 60% no transporte coletivo. Daí, percebemos que os congestionamentos ficaram corriqueiros, enquanto a poluição atmosférica e a temperatura aumentaram.

Ou seja, gasta-se dinheiro, mas os resultados são ruins. Além de trens, faltam corredores ou faixas segregadas para ônibus. Na última gestão municipal da capital paulista, a ampliação destas não chegou a 5km; em administrações anteriores, foi possível atingir 440km dessas pistas. Isso levou o SEESP a propor na etapa municipal da Conferência Nacional das Cidades, encerrada em 27 de abril último, a meta de 200km de corredores e faixas construídas ao longo de quatro anos de uma gestão municipal.

 

Mau passo

 

Mas por que "imobiliarismo"? Vamos analisar rapidamente dois projetos propostos.


Túnel da Av. Sena Madureira
Uma construção cara e problemática, pois cruza a Linha N-S Azul do Metrô na Rua Domingos de Moraes, que apenas transfere o congestionamento para a Av. Ricardo Jafet ou para a Av. Sena Madureira, com a agravante de se prender automóveis dentro de um túnel emitindo CO2, o que põe em risco as pessoas dentro dos veículos. No entanto, apesar dos óbvios malefícios, abre espaços para se construírem torres, shoppings e hotéis em zonas nobres da cidade, nas quais o preço do solo é caríssimo. Com um consórcio de empresas tudo se resolve. E os ganhos serão superlativos.


Nova Raposo Tavares
– Mais pistas para autos e mais pedágios free-flow, impermeabilizando o solo numa área de concentração de nascentes e minas d'água, hoje alimentadas pelas chuvas. Da mesma forma, abrem-se espaços em áreas urbanisticamente consolidadas, com parques e áreas verdes diversas, para se construírem torres e/ou shoppings. E o governo omite o fato de ele próprio já ter soluções verdadeiras para os congestionamentos dessa rodovia, como a Linha 22 Marrom, já projetada pelo Metrô.


Engenharia posta de lado

 

O SEESP apresentou, durante audiência pública realizada na Assembleia Legislativa, em 23 de abril último, sugestões para vários problemas de mobilidade. Entre elas, o projeto da linha de Metrô que sai da Estação Sumaré, passa pelas estações Faria Lima, Pinheiros, Morumbi, USP, teria várias estações na Rodovia Raposo Tavares e nos municípios de Osasco e Cotia. Terá a demanda de 689 mil passageiros diários, dentre os quais cerca de 380 mil optarão pelo Metrô. E seria toda subterrânea, conforme preconiza a equipe metroviária, segundo a qual, ao longo da rodovia, não se deve mais construir para não arrasar bairros já consolidados ou devastar áreas verdes. Por que o governo ignora um projeto feito sob sua égide, preferindo promover uma verdadeira agressão urbana?


Na expansão da Linha 4 Amarela, de Vila Sônia a Taboão da Serra, a estação intermediária Vila Jussara, prevista inicialmente, foi abandonada pela concessionária e substituída por uma na Chácara Parque do Jóquei. Decisão equivocada, pois o local da futura estação deixa de ser equidistante entre as outras duas, amplia a extensão da desapropriação e atinge uma área do parque. Nada justifica tal opção, a não ser, novamente, interesses do setor imobiliário em construir altas torres. Teremos mais impermeabilizações, polos geradores de tráfego e poluição. A urbe perde; incorporadores e consorciados aos empreendimentos ganham.

 

Interesses econômicos

 

Ao que parece, essa tem sido a tônica dominante no município de São Paulo, e não só envolvendo o transporte público. Exemplos são a intenção de instalar a área administrativa do Estado em Campos Elíseos e na Favela do Moinho e o aterro sanitário em São Mateus, em reserva florestal próxima ao Parque do Carmo, com corte de 10 mil árvores frondosas. Ainda, o corte de 5 mil árvores no Instituto Butantan para dar lugar a instalações farmacêuticas.


E, por fim, temos o Jardim Pantanal, onde os moradores sofrem historicamente com enchentes sem que uma solução efetiva – a exemplo das que foram discutidas em seminário realizado no SEESP em 27 de fevereiro último – seja posta em prática. Mas, nesse caso, não há atrativo para incorporadores – inexiste beleza paisagística, e as águas do local afluem com lamas e detritos.


Enfim, lamentavelmente, o que se evidencia hoje são projetos que se caracterizam por engenharia, mobilidade e urbanização adequada postas de lado, enquanto construções de torres e shoppings são favorecidas, sem levar em conta as necessidades da maioria da população.

 


 

 

Nestor Tupinambá é engenheiro civil, mestre em Planejamento Urbano e diretor do SEESP. Trabalhou na Codrasa Construtora, na Promon Engenharia e, por 47 anos, no Metrô-SP

 

 

Imagem: Depositphotos/Arte: Eliel Almeida | Foto Nestor Tupinambá: Acervo SEESP

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