Murilo Pinheiro – Presidente
O projeto de construir um país verdadeiramente democrático e com oportunidades para todos enfrenta vários obstáculos, entre os quais a contradição histórica que precisa ser superada com urgência: o racismo e a desigualdade ainda gritantes na atualidade, apesar da maioria negra que forma a população brasileira, com 56% de pretos e pardos, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
São vários os indicadores a confirmar a triste realidade, herança do passado tenebroso da escravidão, a começar pela expectativa de vida de um homem negro, que é quase seis anos menor que a de um branco, como aponta estudo do Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social (IMDS).
No mercado de trabalho, a questão racial é determinante. Para se ter uma ideia, a taxa de desemprego entre mulheres negras, relativa ao segundo trimestre do ano passado, ultrapassou o dobro da verificada entre homens brancos, revela o Ministério do Trabalho e Emprego.
Em 2024, o rendimento médio das pessoas negras foi cerca de 40% inferior ao das brancas, conforme levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Embora se reduza para 32%, a discrepância notável se mantém para aqueles com formação superior. Nesse caso, ao longo de uma carreira de 40 anos, o valor recebido a menos ultrapassa R$ 1 milhão, estima o levantamento.
Essa exclusão também marca o universo da engenharia, área estratégica para o desenvolvimento nacional e que não pode abrir mão de parcela majoritária da população entre seus profissionais.
Conforme o Painel Estatístico do Censo da Educação Superior do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), os concluintes pretos, pardos e indígenas na área “Engenharia, produção e construção” passaram de 26%, em 2015, para 40%, em 2024. Trata-se de um avanço inegável, mas o quadro é inversamente proporcional à composição racial da sociedade brasileira, com os graduados brancos representando 57% do total no último ano.
Assim, a desigualdade persiste em praticamente todas as etapas da formação e da carreira. Embora os dados oficiais do registro de profissionais no Sistema Confea/Crea não incluam raça ou etnia, o dia a dia nos locais de trabalho evidencia realidade parecida, com o número de profissionais negros felizmente se ampliando, mas ainda minoritários, especialmente nas posições de lideranças. A situação se agrava quando se trata das engenheiras negras.
Essa sub-representação é uma injustiça lamentável e se configura prejuízo ao País como um todo. Cada jovem negro que não opta pela engenharia ou desiste do curso iniciado por falta de apoio, de formação escolar básica adequada ou por se sentir um estranho no ninho é uma perda para a sociedade.
A engenharia, como profissão essencial ao desenvolvimento e motor da inovação, não pode reproduzir o atraso. Superar essa realidade exige ações concretas: aprimorar o ensino público fundamental e médio de forma decisiva, ampliar políticas de acesso e permanência na educação superior, estimular programas de diversidade nas empresas e instituições públicas e garantir oportunidades reais de ascensão profissional.
Contribuir para essa transformação do Brasil, alcançando o imprescindível avanço civilizatório da igualdade e do fim do racismo, deve ser também uma meta da Engenharia Unida. Ao celebrarmos mais um Dia da Consciência Negra neste 20 de novembro, firmemos esse compromisso com um futuro de dignidade e justiça que já tardou demasiadamente.






