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Cidades precisam de planos sólidos para enfrentamento das mudanças climáticas

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Jéssica Silva*

 

Representantes de mais de 130 países discutem neste mês de novembro, durante a 30ª Conferência das Partes das Nações Unidas (COP 30), em Belém (PA), planos nacionais para o enfrentamento das mudanças climáticas e pactos globais de mitigação. Adaptação, segundo o presidente designado à COP 30, André Corrêa do Lago, é uma questão de sobrevivência.

 

“Os impactos climáticos estão corroendo conquistas de desenvolvimento, ampliando desigualdades e empurrando milhões de pessoas de volta à pobreza [...]. A adaptação não é uma alternativa ao desenvolvimento – é sua própria essência”, afirmou ele, em carta à comunidade internacional.

 

Em São Paulo, o Plano Estadual de Adaptação e Resiliência Climática (Pearc), lançado no Dia Mundial do Meio Ambiente – 5 de junho – pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística (Semil), reconhece a emergência atual e coloca como premissa a promoção da justiça climática e de infraestruturas mais resilientes.

 

O Pearc foi detalhado durante a sétima edição do Encontro Ambiental do Vale do Paraíba (EcoVale), promovido pelo SEESP e Federação Nacional dos Engenheiros (FNE), com o apoio de diversos patrocinadores, em 22 e 23 de outubro último, no Hub de Inovação Tecnológica de Taubaté (HITT).

 

São cinco eixos temáticos que compõem o plano, sendo eles zona costeira, segurança hídrica, segurança alimentar e nutricional, saúde única e biodiversidade. “De forma transversal, em todos esses temas temos a justiça climática, em que olhamos para cinco direções: raça, gênero, idade, renda e grupos étnicos, além da infraestrutura, para entender como elas interferem na capacidade de resposta à emergência climática”, afirmou Marina Balestero dos Santos, diretora de planejamento ambiental da Semil.

 

 

Marina Semil EcoVale2025Da esq. para a dir., Breno Botelho Ferraz do Amaral Gurgel, presidente da Subsede Sindical do SEESP em Taubaté; Renato Veneziani, representante do Comitê das Bacias Hidrográficas do Rio Paraíba do Sul; Marcela Nectux, diretora de recursos hídricos da Semil; Gabriel Alcântara, secretário de Meio Ambiente e Bem-Estar Animal de Taubaté; Marcelo Pereira Manara, secretário de Urbanismo e Sustentabilidade de São José dos Campos; e Marina Balestero dos Santos, diretora de planejamento ambiental da Semil (em pé). Fotos: Valeria Gonçalves de Souza Ferreira

 

Segundo ela, o Pearc é incremental e propõe ciclos de implementação a cada três anos, “para podermos avaliar o que está surtindo efeito, as dinâmicas e deixar o plano vivo”. No primeiro ciclo, são oito blocos com 46 ações e 101 subações. Aprimorar o planejamento e a implementação de políticas públicas é a primeira ação. “Como subação temos incorporar e apoiar a inserção de estudos de ameaças e projeções climáticas nos planejamentos municipais, regionais e setoriais. Ou seja, queremos influenciar que outras políticas públicas tenham esse foco”, afirmou Santos.

 

Taubaté, conforme assegurou o secretário municipal de Meio Ambiente e Bem-Estar Animal, Gabriel Alcântara, vai começar a construir o novo plano diretor da cidade com base nas ações do Pearc. “Temos o dever de internalizar o conceito e as preocupações com mudanças climáticas nos planos diretores”, concordou Marcelo Pereira Manara, secretário municipal de Urbanismo e Sustentabilidade de São José dos Campos.

 

Descarbonização

 

Esta última localidade iniciou uma jornada para se tornar a primeira cidade carbono neutro, como apresentou Manara durante o EcoVale. O município teve, pelo terceiro ano consecutivo, a tripla certificação de cidade inteligente, resiliente e sustentável no nível máximo, concedida pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Para alcançar o equilíbrio entre emissões de gases de efeito estufa (GEE) e medidas de compensação, segundo relatou ele, o desafio é ainda maior.

 

Leia também: Normas técnicas apontam planejamento urbano ideal
 

A gestão municipal de São José dos Campos aderiu ao Centro de Ciência para o Desenvolvimento (CCD) Cidades Carbono Neutro, programa elaborado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), que apoia e oferece soluções, visando reduzir as emissões de carbono, especialmente o dióxido de carbono (CO2) e o metano. “São 38 entidades envolvidas, 31 produtos elencados. Daí sairão plataformas, sistemas de gestão, procedimentos analíticos”, explicou Manara. E frisou: “Pretendemos criar o mercado municipal de crédito de carbono. Desde o pipoqueiro, o pequeno empreendedor, até a refinaria, todos serão convidados a aderir ao programa de carbono neutro.”

 

O secretário também listou as atividades em andamento que contribuem para redução de CO2 na atmosfera, como o plano de arborização da cidade, com plantios registrados por código QR, e o monitoramento por satélite de todo o território. Também está em curso a conversão de toda a matriz energética dos veículos oficiais municipais, como viaturas e ônibus, e o incentivo a outros modais. “Temos 310 quilômetros de ciclovias, 1.200 bikes compartilhadas. A pessoa pode descer no ponto de ônibus e terminar o trajeto até a sua casa de bicicleta, utilizando o mesmo bilhete”, contou.

 

Com isso, segundo Manara, a cidade de São José dos Campos já deixa de emitir cerca de 2,3 milhões de toneladas de CO2 por ano. O município investe na produção de biogás em aterro sanitário, com a geração atual de 1.6MW/h, que fornece 30% da energia consumida em prédios da Prefeitura. Ainda, possui código de obra sustentável, em que já se prevê pontuação a projetos de carbono neutro.

 

No final de 2024, foi sancionada a lei nacional que regulamenta o setor, criando o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE). A legislação vai ao encontro de políticas praticadas em diversos locais do mundo, como o CBAM, mecanismo da União Europeia para controle sobre as emissões de CO2 de produtos importados. “Eles querem saber quanto foi gerado e, assim, não permitir a compra de algo mais poluente”, simplificou João Pedro Siqueira, da Deep ESG.

 

A companhia oferece soluções para empresas e instituições, como inventário de carbono e estratégias de descarbonização. “É um diferencial competitivo, dá acesso a linhas de créditos especiais, é uma ferramenta de gestão e transparência”, afirmou ele. No mapeamento de fontes de GEE consideram-se emissões diretas e indiretas. “A empresa é responsável pelo que produz e por como o seu fornecedor trabalha também”, disse. O dado é relevante, já que mais de 70% da pegada de carbono provém da emissão indireta,  de “como a empresa compra ou o que faz para entregar seu produto”, frisou Siqueira.

 

Siqueira Neto QueridoJoão Pedro Siqueira (à esquerda), Delanney Di Maio Neto e Edson Aparecida de Araujo Querido Oliveira, em suas apresentações no EcoVale.Nessa perspectiva, Delanney Di Maio Neto, relações institucionais da Companhia de Gás de São Paulo (Comgás), destacou no EcoVale a urgência de se sair do combustível fóssil, apresentando a geração de biometano a partir do gás natural como uma das alternativas, combinada com outras, como o hidrogênio verde.

 

O biometano, segundo sua explanação, é suficiente para substituir 70% da demanda nacional por diesel. Na cidade de São Paulo, informou que os caminhões de lixo já o utilizam e um projeto de lei busca proibir ônibus a diesel. “A descarbonização do transporte pesado é realidade no mundo”, enfatizou.

 

Transição energética e mudança da matriz de transporte caminham juntas. Sob esse mote, inovação à mobilidade sustentável também esteve na programação do EcoVale, a partir da apresentação do eVTOL, aeronave elétrica de pouso e decolagem vertical. Os desafios e caminhos da nova tecnologia, desenvolvida junto à Embraer pela sua subsidiária, a EVE Air Mobility, foram apresentados no EcoVale pela responsável pelas áreas de EHS (meio ambiente, saúde e segurança) e ESG (ambiental, social e governança) dessa empresa, a engenheira Raphaela Ferreira. O tema foi objeto do seminário “eVTOL: tecnologia, potencial e implicações urbanas – Como a aeronave de pouso e decolagem vertical pode contribuir com a mobilidade”, realizado pelo SEESP em 29 de outubro último (confira aqui).

 

Para o reitor do Centro Universitário ETEP de São José dos Campos, Edson Aparecida de Araujo Querido Oliveira, uma governança eficaz, com roteiro claro para cumprimento das regras, planos e estratégias, bem como ação coordenada e integração eficiente são o caminho para construção de um futuro às próximas gerações. “São 193 países signatários da Agenda 2030. Se os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) saírem da promessa, aumentamos a chance de sobrevivência”, concluiu.

 

Economia circular

 

Como contribuição à descarbonização, ainda durante o Encontro Ambiental do Vale do Taubaté, Anderson Luiz Dias de Oliveira, gestor do Retióleo, apresentou o trabalho de transformação do óleo de cozinha reciclado em biocombustível, lembrando que lamentavelmente apenas 10% em média do produto é reaproveitado anualmente, de um total de 4,7 bilhões de litros consumidos.

 

“O óleo é um dos principais responsáveis pela contaminação de lençóis freáticos e de rios, por enchentes”, pontuou. Oliveira observou que, ao ser despejado nos aterros sanitários, o oléo de cozinha “libera gás metano, 21 vezes mais poluente que os gases de efeito estufa”, destacando a importância da reciclagem inclusive à produção de energia renovável.

 

Pensar na redução de resíduos é substancial. Nessa ótica, a consultora em sustentabilidade e fundadora da startup In Tempore Sustentabilidade, Giselle Jobim Roessler, falou no EcoVale da economia circular, que reduz impacto ambiental, cria novos mercados e ainda propicia fortalecimento de marca no mercado e economia de recursos. “Temos que focar na reutilização e principalmente na redução. Extraindo menos se preserva mais”, defendeu.   

 

MesaMarcellie EcoVAle2025 500Giselle Jobim Roessler (à esquerda), Marcellie Dessimoni e Maura Silva Oliveira Watanabe.Segundo ela, mesmo com a atualização de 2024, que incluiu a logística reversa de embalagens, a Política Nacional de Resíduos Sólidos é ainda muito incipiente. Não são todas as cidades que possuem cooperativas que recolhem todo tipo de embalagem, e muitas delas, como a blister, são difíceis de reciclar.

 

Para que a economia circular ganhe escala, destacou a especialista, é preciso investir em educação, infraestrutura, políticas públicas específicas, tecnologias, colaboração e parcerias.

 

O lixo, a poluição e a degradação afetam o meio ambiente e todo o seu ecossistema, como explanou a médica veterinária Maura Silva Oliveira Watanabe. “Com a expansão das cidades, é mais comum encontrar animais e espécies peçonhentas que antes habitavam apenas as matas. E novas doenças, como a Covid-19, aparecerão cada vez mais”, alertou. 

 

“Antes, a máxima da produção era do berço ao túmulo, mas qual seria esse túmulo? Os aterros, os rios? Agora falamos do berço ao berço, essa matéria tem que ser reutiizada”, reforçou a vice-presidente eleita do SEESP, Marcellie Dessimoni.

 

 

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Sobre o EcoVale

 

O Encontro Ambiental do Vale do Paraíba (EcoVale) é promovido pelo SEESP desde 2003. “Com o sucesso das primeiras edições, ampliamos a discussão pelo Estado, pelo País, fizemos o EcoSP, o EcoPiauí. Entendemos que o sindicato, a engenharia, tem a sua contribuição na discussão do meio ambiente”, declarou o presidente do SEESP, Murilo Pinheiro, na abertura das atividades da edição deste ano.

 

Realizado nos dias 22 e 23 de outubro último, o encontro de 2025 contou com mais de dez palestras em seis seções plenárias e ainda expositores de produtos, serviços e inovações voltadas à sustentabilidade.

 

“Estamos há 20 anos nessa jornada, com muitos parceiros, com o objetivo de transmitir e discutir boas práticas ambientais e levar à população esse conhecimento”, pontuou o coordenador do EcoVale e vice-presidente do SEESP, Carlos Alberto Guimarães Garcez.

 

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Assista às palestras no canal do EcoVale no Youtube

 

  

*Colaborou Soraya Misleh

**Foto no destaque: Freepik

 

 

 

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