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07/10/2011

TCU aponta teto para lucro em obra pública

Fontes ouvidas pelo jornal Valor acreditam que, a partir de agora, dificilmente um edital de licitação será publicado com percentuais de BDI fora das margens recomendadas pelo tribunal

       O Tribunal de Contas da União (TCU) baixou um acórdão estabelecendo o teto de Bonificação e Despesas Indiretas (BDI) para serviços e obras públicas de engenharia. O BDI é a soma do lucro, dos impostos e das despesas indiretas que um empreendedor tem na obra. Junto com os custos diretos, ele compõe o preço global do empreendimento. A decisão, publicada no dia 20 de setembro, no acórdão 2.369/2011, pegou de surpresa o setor de construção, que vê na medida uma tentativa de tutelar o lucro privado.O TCU informou, em nota, que as tabelas são apenas referências de "parâmetros aceitáveis". Fontes ouvidas pelo Valor, entretanto, acreditam que, a partir de agora, dificilmente um edital de licitação será publicado com percentuais de BDI fora das margens recomendadas pelo tribunal, para evitar fiscalizações e atrasos no futuro. Devido à decisão, editais de obras federais estão sendo recolhidos para adaptação aos novos percentuais. No setor portuário, três processos licitatórios para reforma ou construção de terminais de passageiros, dentro do PAC Copa, foram suspensos nos portos de Santos (SP), Natal (RN) e Rio.

       "Recomendar "parâmetros aceitáveis" é um eufemismo para dizer que se está tutelando o lucro", afirma o diretor-executivo da Associação Paulista de Empresários de Obras Públicas (Apeop), Carlos Eduardo Jorge. "O TCU nunca teve ingerência nisso, era uma relação entre contratante e contratado. O tribunal tem ampliado não só o poder de fiscalização, que lhe é devido, mas de normatização, que, acredito, não seja sua função, alcançando questões de orçamento e lucro", diz.

       O acórdão estabelece percentuais mínimos e máximos de BDI, de acordo com o valor do empreendimento e por segmento: saneamento, edificações, irrigação e canais, redes adutoras e estações elevatórias e de tratamento, estruturas portuárias, pátios e pistas aeroportuários, terminais de passageiros aeroportuários e fornecimento de materiais e equipamentos.

       No caso de obras de saneamento estimadas em até R$ 150 mil, o BDI mínimo é de 25,3%, e o máximo, 31,8%. Se o valor da obra for superior a R$ 150 milhões, os percentuais ficam entre 20,8% e 27%. Em obras aeroportuárias (pátios e pistas de pouso) com valor até R$ 150 mil, o BDI mínimo é de 21,5% e o teto, 22,7%. Para valores acima de R$ 150 milhões, os percentuais são 17% e 23%,

       Os empresários criticam a imposição de BDIs de acordo com os valores do empreendimento, pois cada obra tem uma especificidade. Por exemplo, quanto mais afastada do centro urbano, mais problemas de locomoção e mobilidade.

       "Essas despesas indiretas incidem no preço da prestação de serviço. É muito mais caro fazer uma rede de saneamento na Amazônia ou num lugar inóspito do que numa capital. As empresas levam isso em consideração ao fazer os orçamentos", diz o presidente da Apeop e diretor da construtora CVS, Luciano Amadio.

       Segundo Amadio, a CVS não participa mais de concorrências públicas federais por não aceitar os preços da tabela do Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (Sinapi), monitorados pelo TCU e que recaem sobre os custos diretos. "São inexequíveis", diz.

       Segundo o Ministério do Planejamento, os órgãos do governo estão avaliando caso a caso se há necessidade de revisão de editais. A estatal Valec, vinculada ao Ministério dos Transportes, disse que "como os processos licitatórios estão suspensos, desde julho, por determinação ministerial, não houve readequação de nenhum edital de licitação". O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) também informou que nenhum edital foi suspenso.

       No setor portuário, os novos editais de Santos, Natal e Rio de Janeiro podem sair hoje. A estimativa é que as intervenções sofram atraso de pelo menos um mês em relação ao cronograma original.

       "Vamos tirar a diferença no tempo da obra", afirmou o presidente da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), José Roberto Serra. Ontem foram publicadas as novas regras para o alinhamento do chamado cais de Outeirinhos no porto de Santos, em frente ao terminal de cruzeiros marítimos. Mais de 40 empresas tinham comprado o primeiro edital. O preço máximo, de R$ 325 milhões, caiu para R$ 319 milhões por conta da revisão do BDI. No caso da nova instalação para turistas no porto de Natal, a variação será quase nula, porque o percentual de BDI oscila pouco na faixa de preço em que a obra está orçada.

       Questionado sobre a razão da medida, o TCU disse, por e-mail, que os órgãos públicos precisam adotar valores referenciais de BDI "para poder avaliar se as propostas de preço oferecidas pelas empresas licitantes estão de acordo com os preços praticados no mercado, como manda a lei".

       Na resposta encaminhada à reportagem, o tribunal afirmou que a decisão não cria obrigações nem limita a atuação das empresas. "O fato de o TCU estabelecer uma faixa referencial de BDI não significa que as circunstâncias e particularidades presentes na execução de uma obra serão desconsideradas. Cada obra deve ter um BDI distinto, adaptado ao caso concreto."

       O órgão explica ainda que o acórdão estabelece referenciais de BDI para serem adotados pelo próprio TCU na análise do preço de obras públicas, "uma vez que uma das parcelas que compõem o preço é o BDI (a outra parcela é o custo direto). Portanto, o TCU não pretende estabelecer o BDI a ser adotado pelas empresas". 



(Fernanda Pires, Valor Econômico)
www.fne.org.br




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