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Feliz na engenharia, apesar das barreiras

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Rita Casaro

 

TamiresPinheiro ObraTamires Pinheiro, em fiscalização de obra no bairro de Cidade Ademar, em São Paulo. Foto: Acervo pessoalEntre as muitas tarefas a serem cumpridas para que haja igualdade na sociedade brasileira está assegurar oportunidades iguais a todas as pessoas, independentemente de raça ou gênero. Entre os setores em que ainda há um longo caminho a seguir para que isso aconteça está a engenharia. Dos cerca de 1,100 milhão de profissionais registrados no País, cerca de 223 mil, ou pouco mais de 20%, são mulheres. No aspecto racial, embora não haja dados oficiais, a experiência no dia a dia demonstra a reduzida presença de pretos e pardos na engenharia.

 

Entre os estudantes a desigualdade se reduz, embora ainda seja relevante. Conforme análise da agência Mira Pesquisa do Censo da Educação Superior 2022 (que contempla dados até 2021), dos 121.142 concluintes dos cursos de engenharia, 36,3% eram do gênero feminino e 63,7% do masculino. O mesmo estudo aponta também disparidade na distribuição racial: 58,6% de brancos, 38% de pretos e pardos, 3,2% de amarelos; a informação não consta para uma parcela mínima de 0,2%. 

 

Superando as estatísticas adversas, Tamires Pinheiro, mulher, negra e oriunda de família pobre, conquistou seu espaço nesse território majoritariamente branco, masculino e também considerado elitizado. Graduada em Engenharia Civil em 2019, ela tem pós-graduação em Construção Civil e já atuou em obras prediais, residenciais e reformas corporativas, no planejamento e na execução. Atualmente trabalha na Secretaria Municipal de Cultura da Cidade de São Paulo, no setor de licitações e obras públicas.

 

Diretora adjunta do SEESP, Pinheiro começou a atuar na entidade integrando a coordenação do Núcleo Jovem Engenheiro (NJE), que reúne estudantes e recém-formados. Também representa o sindicato como conselheira suplente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de São Paulo (Crea-SP).

 

Nesta entrevista ao Jornal do Engenheiro, ela fala sobre as dificuldades para ingressar e se manter na engenharia, os planos para o futuro e como a participação no SEESP contribuiu para que se encontrasse na profissão. “Foi um norteador para mim. A importância de estar inserida nisso é absoluta”, ressalta. Confira a seguir e no vídeo ao final.

 

Neste mês de novembro, comemora-se no dia 20 a Consciência Negra, data sempre propícia à reflexão sobre a urgência do combate ao racismo, embora essa seja uma tarefa para todos os dias do ano. Como foi para você escolher engenharia e ocupar um lugar nessa profissão que ainda é majoritariamente masculina e com pouca participação de negros?
Eu trabalho desde os 14 anos e minha família vem de trabalhadores da construção civil, não engenheiros, mas pedreiros, ajudantes e serventes. Sempre acompanhei e gostei. Como venho de uma família mais humilde, não tinha condições de custear, então demorei um pouquinho para entrar na faculdade de engenharia civil. Consegui entrar, de fato, na área no segundo ano da faculdade. Aí foi amor à primeira vista, comecei, não parei mais.

 

Você encontrou obstáculos na universidade e/ou no mercado de trabalho?
Esses obstáculos sempre existiram e existem. Quando comecei a procurar estágio, a me inserir no mercado de engenharia, teve bastante resistência, era jovem, mulher, não tinha nenhum contato, experiências na construção. Muitas pessoas não dão oportunidade a quem não tem experiência. Mas como ganhar experiência sem oportunidade? Algumas pessoas dentro das empresas tinham resistência em trabalhar com uma pessoa sem experiência e mulher. Na construção civil, você trabalha com várias classes sociais, tem uma certa resistência, sim. Isso não é necessariamente ligado à engenharia, é algo mais complexo, que vem de como a pessoa foi criada, como foi ensinada, é um problema muito maior.

 

Na sua experiência, a discriminação se deu mais por ser mulher que por ser negra?
A questão racial existe, tem o preconceito, mas eu senti mais por ser mulher. Já tive esse problema, hoje nem tanto. Você vai aprendendo a lidar com as situações, hoje não passo mais pelos perrengues.

 

Na sua avaliação, o que seria necessário para haver mais mulheres e pessoas negras na engenharia?
Num quadro geral, o que eu vejo muito é, desde o ensino básico, ter mais incentivos. Porque as pessoas que vêm da classe média ou alta têm preparo e incentivo muito maior; TamiresPinheiro3A engenheira destaca importância de incentivo e orientação desde cedo para que mais pessoas tenham condições de optar pela engenharia. Foto: Rita Casarosão estimuladas a pensar no que vão fazer após o ensino médio, que faculdade fazer, como se preparar para o mercado de trabalho. Isso não acontece muito com as pessoas de baixa renda. Creio que seria [importante] no ensino básico já estimular as nossas crianças a buscarem algo para fazer, um curso profissionalizante, [definir] qual faculdade [cursar], a qual área se dedicar, para poder trazer novos profissionais com a cabeça um pouco mais aberta. Está mudando, mas a engenharia ainda é masculina e elitizada. Não é um curso muito barato, é difícil entrar e mais ainda se manter. Porém, é um curso que ajuda a transformar a realidade social e econômica das pessoas.

 

Independentemente das questões raciais e de gênero, quais seus planos na profissão?
De estudar a gente nunca vai parar, isso é um fato! Entrou na engenharia, independentemente da modalidade, sempre vai estar buscando melhorias. Atualmente, quero migrar para a área de Segurança do Trabalho, é a segunda pós que pretendo fazer, começando no início do próximo ano. E quero utilizar isso para complementar os meus serviços.

 

Como entra o Building Information Modeling (BIM) nessa demanda por qualificação, especialmente na Engenharia Civil?
Eu trabalho com obras em que preciso conhecer a ferramenta BIM, que ajuda a fazer uma compatibilização de todas as matérias para verificar se há algum erro. Já fiz alguns cursos, inclusive no SEESP, que foram maravilhosos. Não consigo ver daqui para a frente o trabalho sem BIM, é essencial na área da construção, da mecânica e outras.

 

Paralelamente à sua atuação profissional, você vem também tendo participação coletiva na profissão. Foi do NJE, hoje está na diretoria do SEESP e é conselheira do Crea-SP. Qual a importância dessa inserção para você?
TamiresPinheiro NJEMilitância norteadora: participação no NJE foi fundamental para se encontrar na profissão, afirma Tamires Pinheiro. Foto: Rita CasaroEu vim parar aqui [no SEESP] por um acaso. Como eu disse, eu tive bastante dificuldade para entrar na área da engenharia. Eu estava procurando emprego e passei em frente ao SEESP. Vim conhecer, e o segurança [me sugeriu] passar na Área de Oportunidades e conversar com o pessoal. Acabei conhecendo o Núcleo Jovem Engenheiro e foi aí que comecei a entender muitas coisas, foi um norteador para mim. Tive oportunidade de conhecer outros engenheiros, aprender sobre a área. A importância de estar inserida nisso é absoluta. Como me disseram uma vez na faculdade, engenheiro não trabalha sozinho, mas em equipe. O NJE e o SEESP foram primordiais nisso. O SEESP ajuda o profissional que está entrando no mercado, o que já está inserido, o que precisa voltar e o que está se aposentando.

 

Que recomendação você dá aos jovens profissionais, estudantes de engenharia ou mesmo a quem está no ensino médio pensando se vale a pena encarar o desafio de estudar engenharia?
Persistência, tem que ter muita persistência. Para quem já está na faculdade eu aconselho vir conhecer o SEESP, o Núcleo Jovem Engenheiro, os programas. Para quem ainda não está no ensino superior, que procure as feiras de estudantes para conhecer as profissões. E um recado às mulheres negras, não negras, pessoas negras: não se abalem pelas barreiras que possam enfrentar. Se é sua vontade, siga e vá em frente, que você pode conseguir.

 

Assista ao vídeo da entrevista

 

Comentários  
# Mulheres Pretas - ResistênciaDebora Buzatto 01-11-2023 11:18
Excelente entrevista! É uma pauta super importante ser abordada dentro do mercado da engenharia. Não temos tantos representantes femininos nessa área e ver essas profissionais conquistando seus espaços, é um reflexo de evolução para nosso futuro!
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