Rita Casaro
Francilene Procópio Garcia, presidente da SBPC: produção científica brasileira é muito bem posicionada. Foto: Jardel Rodrigues/SBPCUma política de Estado, com planejamento de longo prazo e investimentos que não sofram descontinuidade, é o caminho para que o Brasil alcance o patamar necessário de desenvolvimento. Quem afirma é a presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Francilene Procópio Garcia, eleita em junho último para o biênio 2025-2027 à frente da instituição.
Segundo ela, ter diretrizes para ciência, tecnologia e inovação, além de investimento na formação de quadros e infraestrutura crítica, é essencial para que haja avanços efetivos a partir da produção científica brasileira, "já muito bem posicionada". Isso se dá, lembra, notadamente em áreas como agroindústria, saúde e aeronáutica.
Há ainda o potencial relacionado à biodiversidade dos biomas brasileiros, tema que ganha destaque no ano em que será realizada a COP30, a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, em Belém, em novembro próximo.
Com graduação e mestrado em Ciências da Computação e doutorado em Engenharia Elétrica, todos pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Garcia é pesquisadora da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG). Com experiência em processos de desenvolvimento de produtos de software, atuando ainda na gestão e avaliação de programas de C,T&I e governança na internet, ela acredita que o Brasil possa se inserir de forma soberana no universo da tecnologia da informação, embora tenha poucas chances de alcançar protagonismo em frentes como a inteligência artificial (IA), liderada por Estados Unidos e China. “Porque não começamos a nos preparar para isso no momento certo”, pondera.
Por outro lado, propõe a professora, o País poderia ousar galgar espaço em outro ramo promissor e crucial para o desenvolvimento tecnológico: “Quem sabe o Brasil possa se antecipar e tentar ser protagonista na ciência quântica”, sugere, lembrando que em breve um centro de referência voltado ao tema será instalado em João Pessoa.
Nesta entrevista ao Jornal do Engenheiro, a presidente da SBPC, que já foi secretária executiva de Ciência, Tecnologia e Inovação (C,T&I) do Governo do Estado da Paraíba e presidiu o Conselho Nacional de Secretários para Assuntos de Ciência, Tecnologia e Inovação, fala também sobre o desafio de superar a desigualdade de gênero nesse campo. A questão, aponta, precisa ser enfrentada desde o ensino básico, com o incentivo para que meninas optem pelas ciências, até a valorização das mulheres que já estão na carreira. “Você tem centenas de pesquisadoras importantes, fundamentais em várias áreas do conhecimento, e é preciso que a sociedade as conheça”, enfatiza.
Confira a seguir e no vídeo ao final.
A SBPC tem uma longa história, que vem desde o pós-guerra e está bastante conectada com os avanços brasileiros em C,T&I. Como é o trabalho da entidade hoje?
Mesmo a SBPC já atuando nessa missão de defender a importância da ciência para o desenvolvimento do nosso país com justiça social, igualdade e também soberania, foi desde o momento de redemocratização – especialmente a partir de 1988, quando a nossa Constituição Federal foi promulgada e passou a ser de fato uma competência do Estado o desenvolvimento da educação e da ciência no Brasil – que a SBPC e todas as iniciativas associadas a sociedades científicas afiliadas e várias instituições que compõem o Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação tomaram uma diretriz e um foco. Então hoje a gente tem muita clareza de que o Brasil precisa investir fortemente em ciência e em uma boa educação, pois esses são os dois pilares centrais para transformar o País de uma forma mais justa. Essa é a missão que a gente vem desenvolvendo, articulando a comunidade científica, a sociedade em geral, atuando junto ao Congresso Nacional e junto às iniciativas governamentais, especialmente na esfera federal.
Como a senhora vê os desafios nessa área hoje no Brasil?
Tem uma questão-chave que comunica bem com a importância da Constituição de 1988 que é, de fato, a gente ter uma política de Estado. Nós não podemos ter políticas de governo que tragam descontinuidades, como a gente viveu recentemente, um momento extremamente complicado de negação da ciência, descontinuidade dos investimentos, até desarrumação de algumas instituições que são importantes. Desde meados dos anos 1960, o Brasil, em vários ambientes, investiu muito fortemente na construção de um conjunto de programas de pós-graduação que são fundamentais. No início, a gente tinha programas muito fortemente concentrados em alguns estados do País, em algumas regiões, e se investiu muito fortemente já no início deste século XXI na interiorização desses programas, para que, de Norte a Sul, a gente tivesse boas pós-graduações. A gente tem hoje a honra de falar que a produção científica brasileira, apesar de algumas quedas da pandemia para cá, é muito bem posicionada, o que ficou muito claro na 5ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, realizada em 2024. Nós evoluímos muito na área da agroindústria, todos reconhecem a importância do conhecimento desenvolvido para colocá-la numa posição competitiva. O Brasil tem hoje, graças ao nosso singular Sistema Único da Saúde, o SUS, uma rede muito bem conectada. Temos problemas, mas temos avançado muito fortemente no desenvolvimento de tecnologias, com muita ciência presente, seja na área de vacinas, seja no combate a algumas doenças que são muito próximas a nós. Quando a gente olha para a indústria aeronáutica, o ITA, junto com o ecossistema inovador no seu entorno, incluindo a própria Embraer, [tem] muita ciência brasileira. Nós temos um desenvolvimento fantástico hoje nas áreas digitais. O Brasil inovou com o sistema importante de inclusão, através do PIX, a própria bancarização com as fintechs é um elemento importante, com muita pesquisa, com muito desenvolvimento científico e tecnológico realizado aqui. E nós estamos no ano de COP30. Com os desafios globais no enfrentamento da crise climática, nós temos nos preparado para utilizar as vocações e as capacidades dos nossos biomas, não apenas da Amazônia. E a gente está aí com metas de descarbonização, para que a gente possa usufruir de uma matriz de energia limpa, [com] todas as alternativas de fontes renováveis: a partir do sol, do vento, composição híbrida com biomassa e hidrogênio verde.
Houve muitos avanços e há grande potencial, portanto. O que falta para o País alcançar o patamar das nações consideradas desenvolvidas, com o consequente impacto positivo nas condições de vida da população?
O que eu quero dizer com essa visão, contextualizando de onde saímos e como estamos avançando, é que o Brasil precisa ter política de Estado com diretrizes, como planos decenais de investimento em ciência, tecnologia e inovação estabelecidos para que o financiamento se estabilize, seja regular, sem riscos de descontinuidades. E que, de maneira muito transparente, a gente possa mostrar à sociedade a importância da ciência, sempre muito presente nas políticas industriais, ambientais e mesmo nas educacionais. É importante que essa infraestrutura científica [tenha] abundância de formação de mestres e doutores, uma mão de obra qualificada extremamente importante para que o País atue em linha de ciência de fronteira no enfrentamento dos problemas locais e globais, mas também integre redes globais de pesquisa. Então nós precisamos resolver problemas de descontinuidade de investimentos. Mesmo tendo um Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico descontingenciado desde 2022, que tem sido fundamental para financiar e fomentar programas estratégicos, a gente ainda tem alguns problemas orçamentários a enfrentar. O próprio projeto da Lei Orçamentária Anual, recentemente encaminhado pelo Executivo ao Congresso Nacional, demonstra que o FNDCT sem os recursos orçamentários discricionários do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e de suas agências, especialmente do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), não é suficiente. Essa infraestrutura precisa se manter up-to-date com o desenvolvimento tecnológico para que a gente possa, de fato, assegurar que em algumas áreas estratégicas, como é o caso, por exemplo, da biodiversidade, o Brasil possa ser protagonista. Na área da segurança alimentar, da transição energética, nós temos muito a explorar. A própria produção de biofármacos, a partir do conhecimento dos ativos da nossa biodiversidade, é fundamental. Então essa soberania que o Brasil pode assumir é fundamental que seja baseada em estruturas de governança e gestão muito bem definidas, financiamentos estáveis, sem riscos de descontinuidade e planos de longo prazo. É nesse sentido que a gente vem trazendo não só para o MCTI, que lidera a construção de políticas públicas na esfera federal nessas áreas, mas também para os ambientes estaduais, as fundações de amparo à pesquisa, o coletivo das universidades públicas e as nossas sociedades científicas afiliadas. Então é uma agenda de discussão para transformar toda a reflexão emanada da 5ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em ação.
A tecnologia de informação é o segmento do momento, com muitas oportunidades de trabalho e big techs que são a face do grande capital hoje. Como o Brasil poderia se inserir nessa área e garantir soberania digital?
É importante dizer que o Brasil tem uma vantagem positiva nesse processo, que é o fato dessas tecnologias que estão habilitando essa transição digital no mundo dependerem muito de pessoas. Então, desde que nós tenhamos programas de formação continuados e qualificados no País [para] a formação de jovens que se dediquem ao desenvolvimento de tecnologias para uso nas várias áreas, é, sim, possível que o Brasil tenha soberania digital. Muito provavelmente não será um líder protagonista em algumas áreas, como é o caso da IA, porque não começamos a nos preparar para isso no momento certo. Hoje você vê dois países, duas grandes economias, ditando as regras nesse caminho, Estados Unidos e China. A China tem hoje quase 50% dos colaboradores, técnicos, engenheiros de software, formados do mundo; uma boa parte das patentes depositadas ano a ano, que já estão implicando mudanças importantes na área e no futuro, vem da China. Da mesma maneira, você tem uma boa parte das big techs como empresas vinculadas aos Estados Unidos. Mas o Brasil tem condições, com a sua infraestrutura científica e educacional, de ter soberania digital para trabalhar com os nossos próprios problemas. Para isso, foi lançado o Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA) recentemente, com um recurso até significativo de investimento, que precisa, inclusive, atrair investimento privado. O investimento público é importante, alavanca, direciona e acelera o desenvolvimento, mas é fundamental a presença do investimento privado. Nessa direção, eu acho que a gente tem alguns deveres de casa a fazer. O primeiro é muito relacionado à questão da educação: rever a política de formação, de maneira que essas novas tecnologias digitais estejam fortemente inseridas nas três grandes áreas, não apenas nas exatas, nas engenharias, mas também nas humanidades, nas biológicas e na saúde. É importante que a gente tenha processos de regulação claramente definidos. O Brasil já aprovou algumas leis e tem outras que estão em discussão no Congresso, a exemplo do [PL que] combate fake news e dá maior transparência nos algoritmos, para que a gente não tenha viés discriminatório. É importante dizer que o Brasil tem um modelo de governança de internet multissetorial, com a participação de vários atores. Eu acho que isso é importante enquanto musculatura para a discussão de futuras regulações em termos de plataformas, dos direitos das big techs estrangeiras que aqui atuam, entre outras coisas. E ligado a esse tema que está lá tratado no PBIA, há que se investir em infraestrutura crítica. Então é muito difícil perdurar numa situação em que a grande massa de dados gerados por todos nós no Brasil, em áreas como saúde, previdência, seja o que for, esteja armazenada em data centers de empresas estrangeiras e até fora do País. É preciso que com a capacidade que temos, com uma matriz energética limpa, possamos investir e atrair investimentos, inclusive estrangeiros, para montar os próprios data centers, talvez verdes, mais sustentáveis. Além disso, já que nós passamos a ser consumidores intensivos de dados, centenas de milhares de informações são geradas a cada minuto, e é preciso que esses dados sejam utilizados de maneira correta, a gente precisa ter capacidade de processamento. Mais uma vez citando o PBIA, uma das unidades de pesquisa do MCTI, que é o Laboratório Nacional de Computação Científica, tem uma das principais infraestruturas computacionais, junto com o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). A do LNCC, inclusive, está sendo atualizada para o Brasil gerar seu próprio modelo de linguagem importante para o desenvolvimento de IAs generativas, entre outras coisas. Essas infraestruturas críticas precisam ter soberania nacional, e para isso é preciso que o Brasil invista muito fortemente. Então, formação de pessoas, aprimoramentos nas regulações e investimentos em infraestrutura crítica, para garantir que, de fato, a gente siga no desenvolvimento em nível de fronteira tecnológica, mesmo sabendo que talvez não possamos ser protagonistas, mas, pelo menos, resolvendo em nosso território, com soberania, os problemas que a gente tem.
Há áreas em que o Brasil possa ter protagonismo?
Nessa direção, é importante dizer que recentemente o físico pesquisador Luiz Davidovich, que presidiu a Academia Brasileira de Ciências, antes da nossa querida Helena Nader, e é conselheiro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, foi reconhecido pela sua contribuição na área da evolução das ciências quânticas pelas academias mundiais do eixo Sul-Sul. Isso é fundamental, mas isso também nos diz o seguinte: se nós desenvolvemos ciência, se nós temos efetivamente caminhado, no caso da IA talvez isso não seja viável, mas quem sabe o Brasil possa se antecipar e tentar ser protagonista na área da ciência quântica. Nós sabemos que as ciências quânticas, além de incorporar a própria questão da mudança do paradigma do processamento digital, virá a ser uma área de importância. O meu estado, que tem um desenvolvimento importante na área computacional, firmou parceria com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e com duas instituições chinesas para implantar um primeiro centro de referência em computação quântica, que será instalado brevemente em João Pessoa. Nós precisamos ter ambição e criar as condições para que a gente possa, de fato, não só integrar essas redes globais de desenvolvimento, mas ser minimamente partícipe, produzindo conhecimento e aplicando aqui em nosso território.
Há um debate em curso sobre a proposta do Ministério da Fazenda de instalação de data centers das big techs estrangeiras no Brasil. Segundo o governo, isso traria investimentos e geraria empregos, mas especialistas no setor alertam para os problemas relativos ao consumo intensivo de água e energia, exaurindo recursos locais. Além disso, apesar desses centros estarem aqui, não significaria soberania nacional sobre os dados contidos neles.
Eu acho que a proposta do Ministério da Fazenda tem uma coisa positiva que é detectar a importância desse tipo de infraestrutura, entendendo que isso é um gargalo para que o Brasil possa lidar com todo esse processo de transformação digital que a gente está vivenciando, globalmente falando. A intensidade de dados gerada, como eu citei há pouco, é imensa. Quando a gente começar a ter a sensorização nas plantas industriais, por exemplo, numa fábrica de automóveis, gera-se durante um dia uma quantidade imensa de informação que precisa ser armazenada e tratada. Quando a gente chegar a processos de carros autônomos, que já começam a surgir para alguns usos pilotos, imagine a quantidade de informações que estarão sendo geradas em tempo real. Então, ao detectar que o Brasil precisa ter essas grandes infraestruturas de armazenamento, isso é um ponto positivo. É importante atrair investimentos estrangeiros, mas [também] discutir as condições de implantação deles aqui. Se alguma das big techs quiser trazer data centers para o Brasil, porque nós temos capacidade de oferecer uma matriz limpa de energia, que a gente tenha contrapartidas importantes, entre elas, o controle mais claro da utilização dos nossos dados; a gente precisa ter armazenamento em rede com soberania. É preciso que a gente tenha, inclusive, o estímulo ao desenvolvimento de uma cadeia. Você falou que esses data centers são altamente consumidores de água. Mas já existem pesquisas desenvolvidas no Brasil para a utilização de coolers que seriam sistemas mais eficientes em relação à manutenção das temperaturas que esses grandes armazéns de dados requerem com menos consumo de água. Com isso, eu quero dizer que também interessa ao Brasil fazer parte de um ecossistema de desenvolvimento para infraestruturas de data centers mais avançados e eficientes. Nós estamos num país tropical e sobretudo com os efeitos do aquecimento global, a escolha dos locais onde esses data centers serão instalados também [deve ser feita] a partir de critérios. Então eu diria que a política é oportuna, mas a gente precisa discutir os critérios de implementação.
Como superar a desigualdade de gênero em ciência, tecnologia, inovação e na engenharia, profissão ainda majoritariamente masculina?
Essa questão da igualdade de gênero e várias outras sobre trazer minorias sub-representadas para dentro do campo científico é uma luta, de fato, histórica da SBPC. É bom lembrar que a primeira presidenta da SBPC, a pesquisadora Carolina Bori, foi uma cientista fundamental no campo das humanidades, especialmente na área da saúde mental. Ela não só estabeleceu a presença de discussões humanizadas nesse campo, como influenciou muito fortemente as correntes na área da psicologia. A Helena Nader, que também foi presidente da SBPC, é a primeira presidente da Academia Brasileira de Ciências em 100 anos. Nós temos uma situação no Brasil em que a inclusão de gênero precisa ser avaliada [do ponto de vista do] acesso à educação de qualidade e nas escolhas que a jovem pode fazer desde muito cedo, quando está concluindo o seu ensino médio e pode ser incentivada a uma carreira científica. Nós batalhamos muito fortemente para reduzir a sub-representação do gênero feminino em STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática, na sigla em inglês) e, obviamente, isso implica aumentar a possibilidade de mais meninas fazerem escolhas por uma carreira científica. A gente sabe que há um problema sério de desigualdade salarial, [assim como] existem ainda barreiras de estímulo à progressão na carreira. O CNPq, recentemente, já na gestão atual do governo federal, procurou mitigar ao passar a considerar as licenças-maternidade na contagem para progressão da carreira. Junto com a Associação Nacional de Pós-Graduação, a gente tem discutido melhorias, algumas gerais, outras com impacto maior para mulheres. A SBPC tem, desde 2019, o Prêmio Carolina Bori, que premia, em anos alternados, meninas que se destacam na ciência e mulheres pesquisadoras sêniores, uma ação em parceria com as sociedades científicas. O Prêmio Carolina Bori, portanto, tem duas motivações: debater com a sociedade essas restrições e procurar soluções junto às instituições públicas, mas também a motivação de mostrar à sociedade brasileira o quanto é importante a presença do gênero feminino nas carreiras científicas. Quantas e quantas pesquisadoras a gente tem! A Johanna Döbereiner, que sempre é lembrada, foi uma das pesquisadoras que deu o maior impulso em relação à fixação de nitrogênio nos processos de plantio sem o alto uso de fertilizantes, fundamental para a produtividade que a agricultura brasileira tem. Você tem centenas de pesquisadoras importantes, fundamentais em várias áreas do conhecimento, e é preciso que a sociedade as conheça.
Alcançar postos de liderança na ciência ainda é um desafio para as mulheres?
Essa temática da inclusão das mulheres na ciência precisa ser discutida com evidências baseadas em números. O CGE, o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, que é uma organização social do MCTI, fez um estudo que traz muito claramente a baixa presença das mulheres nas áreas das exatas, nos programas de pós-graduação, entre mestres e doutores. É importante dizer que quando a gente olha os grupos de pesquisas, por exemplo, do CNPq, apesar de já ter avançado, o número de mulheres liderando ainda é menor do que a proporção nas carreiras acadêmicas. Então é preciso também entender por que as mulheres não são líderes. Muito provavelmente precisaria incentivar mais coautorias com essa perspectiva de inclusão e equidade de gênero. Quando se coloca a diversidade étnica, vamos olhar [também] as mulheres indígenas e negras. Eu tenho a satisfação de presidir o board científico, o SAB, do Instituto Serrapilheira, que é uma instituição de fomento baseada em endowment privado que tem incentivado muito fortemente essa questão da inclusão das mulheres. Isso é fundamental, [assim como] a valorização da liderança feminina. E tive a felicidade de me tornar presidente da SBPC, aliás a primeira mulher fixada numa região fora do eixo Sul-Sudeste e de uma área das exatas, por ser cientista da computação. A pluralidade é importante para o nosso conjunto em termos de país, para que a gente avance. Então são várias políticas públicas que estão sendo buscadas, e a gente, enquanto SBPC, vem trabalhando muito fortemente isso. Há também o programa “SBPC vai à escola”, que é uma iniciativa muito importante e acontece nos vários estados do País, formando professores que fazem a disseminação da ciência a partir de práticas que são colocadas nas escolas públicas. E a gente tem tido muita atenção, inclusive, para que, dentre as lideranças e a formação desses educadores na difusão e na popularização da ciência, a partir dos laboratórios e das práticas que são incentivadas nas escolas públicas, tenha ali, digamos assim, uma maneira de fazer com que a criança, a menina, a jovem, se estimule e não desista, porque, de fato, não existe nada que impeça que a escolha para o desenvolvimento de uma carreira científica se dê igualmente por meninos e meninas.
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