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Empresa nacional abre espaço ao protagonismo do Brasil na eletromobilidade

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Jéssica Silva

 

O País que possui nas cidades mais de 107 mil ônibus, responsáveis por 85,7% das viagens de transporte coletivo realizadas, tem grande papel na redução de emissão de poluentes e potencial proporcional para explorar mercado da eletromobilidade. Os dados da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) atestam a avaliação da diretora executiva da Eletra, Iêda de Oliveira, de que o Brasil demorou para entrar na eletrificação. “Somos uma das maiores frotas de ônibus urbano do mundo. Chegou o momento de investir e recuperar a liderança tecnológica no setor”, ela diz.

 

IedaOliveira EletraIêda de Oliveira: “Somos uma das maiores frotas de ônibus urbano do mundo. Chegou o momento de investir e recuperar a liderança tecnológica no setor.”
Foto: Divulgação Eletra
Em junho último, a empresa brasileira inaugurou sua nova fábrica, em São Bernardo do Campo, com capacidade de produção de 1.800 ônibus – quase cinco vezes mais do que alcançava em 2021, em torno de 400 – e com a possibilidade de aumentar em 50%. A ampliação é parte do plano de crescimento da Eletra, que contou com investimento de R$ 150 milhões e pretende ainda gerar 500 novos postos de trabalho nos próximos dois anos. A inauguração foi prestigiada pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, em visita com ministros à fábrica.

 

Há mais de 20 anos a Eletra desenvolve tecnologia de tração elétrica para veículos pesados, com foco em ônibus. Os trólebus, os mais conhecidos no mercado, deram início à caminhada pela eletrificação, conforme conta Oliveira. Em 1999 a companhia lançou o primeiro ônibus híbrido e, em 2014, o primeiro 100% elétrico com tecnologia nacional.

 

Atualmente, apresenta cinco modelos de veículos elétricos puros, como são chamados os movidos a bateria, com diferentes tamanhos – que vão de dez metros de comprimento para até 53 passageiros aos de 21 metros para 149. E ainda, abre espaço no mercado com um modelo inovador chamado e-Trol, que recarrega a bateria durante o trajeto. “Isso cobre praticamente todo o perfil de ônibus urbano que circula não só no Brasil, mas na América Latina”, afirma a diretora.

 

Segundo Oliveira, oito veículos foram vendidos e já estão em circulação em Salvador (BA), quatro em Vitória (ES), dois em Goiânia (GO) e um está em fase de testes em Curitiba (PR). Em São Paulo, o município de São Bernardo do Campo já anunciou interesse na compra de dez ônibus elétricos. Na Capital, a Eletra entregará 50, nos próximos 60 dias.

 

Descarbonização

Para alcançar a meta de redução de emissões de dióxido de carbono (CO2) de origem fóssil e outros gases de efeito estufa, a cidade de São Paulo prevê a substituição de 20% da frota de transportes coletivos por alternativa não poluente até o final de 2024. O prefeito Ricardo Nunes ratificou à imprensa esse compromisso, em junho último, o que implica colocar 2.600 ônibus elétricos em circulação no período estipulado.

 

“Vamos receber 1.110 veículos até o final de 2023”, afirma o secretário executivo de Mudanças Climáticas do Município de São Paulo, Antonio Fernando Pinheiro Pedro, que preside o Comitê Gestor do Programa de Acompanhamento da Substituição de Frotas por Alternativas Mais Limpas (Comfrota). Este último estuda ainda as possibilidades de substituição de caminhões de lixo, entre outros transportes que prestam serviços na cidade, para os de combustível limpo.

 

A diretora da Eletra explica que o consumo de um litro de diesel equivale a 2,64kg de CO2 na atmosfera. “Um ônibus pequeno, em média, faz 1,7km por litro. Rodando 220km por dia, chegando a mais ou menos 69 mil km por ano, ele joga na atmosfera, sozinho, mais de uma tonelada de CO2”, expõe. Seguindo essa lógica, se toda a frota da cidade de São Paulo fosse eletrificada, deixaria de emitir instantaneamente 1,5 milhão de toneladas de CO2 por ano.

PinheiroPedro PauloLimaÀ esquerda, o secretário Pinheiro Pedro e o diretor da Transwolff,
Paulo Lima. Fotos: Seclima / Divulgação Transwolff
 

A descarbonização dos transportes e a economia de baixo carbono estão ligadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), ação global da Organização das Nações Unidas (ONU) da qual o Brasil é signatário por meio da Agenda 2030.

 

A redução de emissão de poluentes causa impacto positivo ao meio ambiente e consequentemente à qualidade de vida da população, sobretudo aos usuários dos transportes coletivos e motoristas.

 

“A gente brinca com os motoristas que agora eles estão vivendo, porque é zero ruído”, conta o diretor de novas tecnologias da Transwolff, Paulo Lima. A empresa opera há quase quatro anos 18 ônibus elétricos na zona sul da Capital. No período, com mais de 3 milhões de quilômetros rodados e 8,5 milhões de passageiros transportados, não houve nenhuma ocorrência de guincho ou quebra de veículo.

 

A manutenção dos ônibus elétricos, de acordo Oliveira, é uma das grandes vantagens do modal. “É feita a cada 150 mil km, e como tem um sistema eletrônico abarcado, muitas vezes na garagem já é revisada qualquer eventualidade que o veículo tenha sofrido nos trajetos. É possível prever um problema que nos convencionais só é visto quando o carro para. Então até mesmo a disponibilidade da frota é maior”, garante a diretora executiva.

 

 

Eletra Sede 750Nova fábrica da Eletra tem capacidade de produzir 1.800 ônibus por ano, com possibilidade de aumentar em 50%. Foto: Divulgação Eletra

  

Indústria nacional

Em abril último, o Ministério da Fazenda sinalizou que incentivos ao mercado de crédito de carbono farão parte do chamado “pacote verde”, conjunto de medidas para impulsionar a economia com ações sustentáveis.

 

“A transição para a eletromobilidade é irreversível. Os avanços no desenvolvimento da célula de combustível prevendo o uso do hidrogênio verde também reforçam isso”, considera Jurandir Fernandes, coordenador do Conselho Assessor de Transporte e Mobilidade Urbana do SEESP.

 

Para ele, a pauta ambiental premente é uma grande oportunidade à engenharia brasileira. “Temos universidades reconhecidas internacionalmente e centros de pesquisa qualificados que podem contribuir. Além disso, a indústria automotiva nacional já possui expertise para a produção de veículos elétricos”, afirma.

 

Jurandir RicardoBastosJurandir Fernandes (à esquerda) e Ricardo Bastos.
Fotos: Beatriz Arruda / Divulgação ABVE
De acordo com Oliveira, 90% dos componentes utilizados na fabricação dos ônibus da Eletra são produzidos ou desenvolvidos no País. “Além de deter a tecnologia, nós temos os motores fabricados no Brasil, os inversores, a inteligência nas baterias”, conta. E frisa: “É importante que os governos olhem para isso, que vejam o que esse conhecimento pode representar para o futuro da indústria nacional.”

 

Essa visão é compartilhada pelo presidente da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), Ricardo Bastos. Na sua opinião, o País pode ser referência internacional em descarbonização no setor automotivo.

 

Nos últimos cinco anos, as vendas internas de veículos eletrificados cresceram, em média, 50% a cada ano, segundo a ABVE. “Tivemos incentivos com a redução do imposto de importação em 2015, agora precisamos de incentivos para produção nacional, uma política de eletromobilidade”, defende Bastos.

 

Edilson Reis, diretor do SEESP e membro do Conselho Assessor de Transporte e Mobilidade da entidade, faz menção à necessária estruturação de um programa de desenvolvimento para que as ações tenham continuidade. Ele cita como exemplo o projeto Sistran, realizado nas décadas de 1970 e 1980. “Com objeto principal de modernizar e implementar a segunda geração do sistema trólebus na cidade de São Paulo, o programa resultou em outros desdobramentos positivos, como os corredores exclusivos, especificações técnicas veiculares. Esses avanços ficaram como legado técnico”, conta.

 

Edilson CardosoOs engenheiros Edilson Reis e José Roberto Cardoso. Fotos: Beatriz ArrudaA produção local de ônibus elétricos traz benefícios econômicos e sociais significativos. Estimula o desenvolvimento da cadeia produtiva nacional e gera empregos, ao mesmo tempo que contribui para a redução das emissões de gases de efeito estufa e a melhoria da qualidade do ar nas cidades”, complementa Fernandes.

 

Desafios

A eletrificação ganha espaço como indutora da sustentabilidade na mobilidade urbana, mas não é a única rota tecnológica para a redução de emissão de poluentes. “Temos o etanol, que, por si só, emite menos CO2, tem a pegada de carbono em sua produção. E mais, já tem estrutura de abastecimento pronta, basta que as pessoas priorizem esse combustível”, avalia José Roberto Cardoso, coordenador do Conselho Tecnológico do SEESP e professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli/USP).

 

Em sua visão, a eletrificação é a melhor alternativa aos veículos movidos a diesel, como no caso dos transportes de passageiros. Não obstante, há desafios significativos ainda a serem sanados. “Os minérios que compõem essas baterias são extraídos de lugares em que se encontra trabalho infantil ou em condição análoga à de escravo. A engenharia não pode pensar apenas na produção, tem que considerar toda a cadeira produtiva, da extração ao descarte”, assevera Cardoso.

 

Sob essa ótica, o projeto “Cresce Brasil +Engenharia +Desenvolvimento”, iniciativa da Federação Nacional dos Engenheiros (FNE) com adesão do SEESP, traz ao debate a imperativa transformação do setor energético para a descarbonização da economia e atividades produtivas. Em sua edição mais recente, “Hora de avançar”, a publicação apresenta, entre outros pontos, a importância de implementação de um amplo programa de eficiência energética e geração limpa para superação dos problemas do setor no País. “Temos um sistema já próximo dos limites da capacidade de fornecimento. A geração precisaria aumentar substancialmente, e esta tem que ser com energia limpa, como a fotovoltaica ou eólica”, defende o professor da Poli/USP.

 

 

Foto da capa: Teste do ônibus elétrico em Curitiba/PR (24 de maio de 2023). Crédito: Ricardo Marajó/SMCS – Arte: Eliel Almeida

 

 

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