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“PEC da Transição é a mãe de todas as batalhas”

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Rita Casaro


39682 João Guilherme Vargas Neto Thiago JulioVargas Netto: expectativa de resgate do mundo do trabalho. Foto: Thiago JulioHá diversas tarefas a serem cumpridas no período entre o segundo turno das eleições, realizado em 30 de outubro último, e a posse, em 1º de janeiro de 2023, pelo candidato vitorioso Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O essencial, contudo, afirma o analista político e consultor sindical João Guilherme Vargas Netto, é garantir espaço no orçamento da União para começar a governar. Por isso mesmo, aponta, aprovar a chamada “PEC da Transição”, que permitirá alterar a Constituição possibilitando despesas além do Teto de Gastos estabelecido em 2016, “é a mãe de todas as batalhas”.


Na sua avaliação, a queda de braços travada agora para que o atual Congresso aprove a medida antecipa a disputa em torno da contradição entre o controle das contas públicas e as necessidades de investimento para atender as demandas da população e do desenvolvimento nacional. Otimista em relação ao desfecho do imbróglio, ele aposta em espaço para as sugestões do projeto “Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento”, lançado pela Federação Nacional dos Engenheiros (FNE) com participação do SEESP. “Portas estão abertas para a sinergia entre a experiência do sindicato e as necessidades do País e do novo governo”, avalia.


Também é alvissareira, prevê o consultor, a nova tônica que deve se estabelecer para o mundo do trabalho, área que enfrentou dificuldade nos últimos anos, especialmente após a mudança na legislação aprovada em 2017 retirando direitos e fragilizando a atividade sindical. “Existem melhores condições para rever o que de negativo vem se acumulando desde a ‘deforma’ trabalhista, mas também para enfrentar os desafios novos trazidos pelo desemprego, pela informalidade ou pelas nova profissões”, pondera. Enquanto isso, defende, cabe ao movimento intensificar suas ações regulares, até como “uma contribuição para normalizar a situação” no País, que enfrenta turbulências desde que foram divulgados os resultados das urnas.


Tais manifestações – que incluem bloqueios ilegais das estradas, vigílias em frente a quartéis militares à espera de intervenções nos poderes constituídos e até ações violentas – e a expectativa de pacificar o Brasil são outros pontos abordados por Vargas Netto nesta entrevista ao Jornal do Engenheiro. Na sua visão, representantes de instituições, como as Forças Armadas ou partidos políticos, envolvidos em iniciativas antidemocráticas serão isolados e punidos. “Quanto à população desavisada que foi a esses atos, temos que ter cautela e paciência, porque isso é uma agitação decorrente do estado de espírito que durante quatro anos ou mais foi construído”, analisa. Para o médio e longo prazos, indica, será preciso levar em conta a presença do bolsonarismo como força política, mas compreendendo que é “uma cebola: tem casca, tem casca, tem casca...”.  Confira a seguir e no vídeo ao final.


Qual a sua avaliação do processo de transição entre governos que têm agitado não só os partidos da aliança que elegeu Lula, mas também vários segmentos da sociedade?

O ano de 2022 foi muito conturbado para os brasileiros, principalmente na expectativa das eleições do mês de outubro. Na campanha, tivemos uma série de iniciativas do presidente Bolsonaro com gastos e medidas visando à reeleição. No segundo turno, Lula foi eleito por uma margem estreita – cerca de 2 milhões de votos –, apesar de todas as 561EntrevistaDestaques 1iniciativas que Bolsonaro havia tomado. Estamos em período de transição, que tem se caracterizado pela constituição de uma equipe múltipla, com cerca de 400 participantes, 31 subgrupos temáticos, cuja finalidade é preparar as condições de ação do governo a partir de janeiro: mostrar o estado da arte, que medidas práticas tomar e, sobretudo, ajudar a criar as condições de aliança capazes de ser refletidas pelo presidente Lula no novo Ministério. Do lado do bolsonarismo, nós temos o jus sperniandi; várias manifestações antidemocráticas, algumas criminosas, e que têm suscitado em alguns expoentes das instituições, como Forças Armadas, Tribunal de Contas e partidos políticos, posições incompatíveis com a regra da alternância do poder. No entanto, o principal hoje é a luta pela normalização da vida da sociedade. Tenho defendido que mesmo durante a transição, intensificar as ações sindicais é uma contribuição para normalizar a situação, principalmente porque trabalha no reagrupamento unitário da base.



O grande debate em curso é a aprovação de uma emenda à Constituição que permita furar o atual Teto de Gastos, possibilitando ao futuro governo cumprir compromissos básicos de campanha. Qual solução seria a ideal para esse imbróglio, na sua opinião?
A mãe de todas as batalhas é exatamente a disputa política em torno da chamada “PEC da Transição”. A tarefa de aprová-la é do atual Congresso e das forças políticas que apoiam o presidente eleito, não do grupo de transição, e é bom que não se confunda isso. O orçamento enviado pelo Bolsonaro foi uma grande fake news durante a campanha. As promessas do Bolsonaro não estavam contidas na previsão orçamentária que ele enviou. Então, o presidente eleito Lula está numa situação em que o orçamento previsto para o dia 1º de janeiro impede o início do cumprimento de suas promessas que são sagradas: bolsa-família de R$ 600,00, aumento real do salário mínimo, verbas para o Sistema Único de Saúde (SUS), para merenda escolar etc.. A grande tarefa é levar o Congresso a aprovar uma PEC que dê as mínimas condições de começar a governar. Não sei precisar qual o tempo ótimo, [discutem-se as opções] de duração indeterminada, por quatro, dois ou um ano, [o que indica] um campo possível de manobra. Por outro lado, a discussão e a aprovação da PEC também influirão, no ponto futuro, na discussão que tem que ser travada entre “fiscalismo” e gastos do Estado. Essa discussão existe nos setores dos economistas, mas terá um início de solução correto ou não, [conforme se dê] a aprovação da “PEC da Transição”, marcando essa contradição.


O SEESP e a FNE têm uma pauta consolidada de debate do desenvolvimento, com ênfase nas questões de ciência e tecnologia, da infraestrutura urbana e de produção. Quais as perspectivas em relação a isso no novo governo, levando em conta essa contradição apontada, já que as entidades defendem investimento público para a retomada do crescimento?

Do ponto de vista da ação do sindicato, as minhas expectativas são as melhores possíveis. [Isso se baseia] na sua experiência mais que decenal e, particularmente neste conturbado ano de 2022, no esforço durante a campanha eleitoral. O SEESP recebeu quase uma centena de candidatos de vários partidos e a vários cargos e, nessas reuniões, ao mesmo tempo que lhes oferecia tribuna, apresentava-lhes as nossas preocupações. Está trabalhando agora numa nova versão do “Cresce Brasil”. Portas estão abertas para a sinergia entre a experiência do sindicato e as necessidades do Brasil e do novo governo.


Em relação ao mundo do trabalho e à organização sindical, áreas que viveram sob ataque constante desde a reforma da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) de 2017, o que se pode esperar?

561EntrevistaDestaques 3O grupo do trabalho na transição tem uma preocupação essencial que é levantar a situação administrativa do Ministério do Trabalho e indicar algumas medidas. Já aparecem algumas coisas extremamente positivas, a exemplo da reunião do grupo com o [atual] Ministro, que foi muito amigável. Nesse grupo, Ricardo Patah, [presidente da UGT], fez uma proposta que eu considero corretíssima: que seja incinerado o que saiu do [Grupo de Altos Estudos do Trabalho] (Gaet), que era uma espécie de excrescência projetada da “deforma” trabalhista. Do ponto de vista do movimento sindical, [a tarefa é] apoiar o grupo, indicar algumas medidas e dar garantias de que a ação unitária com as centrais e mesmo sindicatos não filiados a nenhuma delas, como o SEESP, tenham voz ativa nas discussões futuras da organização do trabalho no Brasil. Está aberta a discussão, não no sentido de revogar a “deforma” trabalhista, mas de adequar a regra jurídica às necessidades de modernização das relações do trabalho.


Para além das mudanças de legislação que o prejudicaram, o movimento sindical sofreu perda de prestígio perante a sociedade nos últimos anos. As entidades podem retomar sua posição legítima a partir desse processo?
A pressão antissindical, assindical e contra os trabalhadores seria verdade se o Bolsonaro continuasse presidente; sua vitória representaria a extinção da realidade sindical existente no Brasil. Com a vitória de Lula, existem melhores condições para rever o que de negativo vem se acumulando desde Temer, com a “deforma” trabalhista, além das agressões bolsonaristas, mas também os desafios novos da realidade do mundo do trabalho, [trazidos] pelo desemprego, pela informalidade ou pelas novas profissões que colocam a necessidade de modernização. Estou triplamente otimista comparando o quadro da vitória de Lula com o que seria a vitória de Bolsonaro.


Fala-se muito na demanda de pacificar o País num cenário de turbulência política que persiste após as eleições, com questionamento pelos derrotados do resultado das eleições. Que desfecho você prevê para essa situação?

Em curto prazo, [haverá foco] na Copa do Mundo, no trabalho de aprovar a “PEC da Transição” e nos assuntos correntes do movimento sindical. Os arreganhos 561EntrevistaDestaques 2[antidemocráticos] serão isolados, e aqueles representantes das instituições que tiverem errado serão também isolados e punidos. Quanto à população desavisada que foi a esses atos, temos que ter cautela e paciência, porque isso é uma agitação decorrente do estado de espírito que durante quatro anos ou mais foi construído pelo bolsonarismo. Uma pessoa que acredita que a Terra é plana acha que foi fraude porque a urna eletrônica é coisa do diabo. No quadro político geral, mais em médio e longo prazos, é evidente que o bolsonarismo constitui uma força política no Brasil. Um exemplo é São Paulo, onde o governador eleito nas hostes bolsonaristas está tendo dificuldades na composição da sua equipe com o bolsonarismo raiz. O quadro político no futuro vai levar em conta a presença do bolsonarismo, mas sobretudo que é uma cebola: tem casca, tem casca, tem casca... tem diferenças. Essencial é a “PEC da Transição” para que, em 1º de janeiro, o presidente Lula comece a cumprir suas promessas e, em relação à base pobre do bolsonarismo, comece a ser ouvido em suas boas intenções.

 

 

Assista ao o vídeo da entrevista

 

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