Opinião

Proposta equivocada para saúde e segurança do trabalho

O Projeto de Lei 1.011/2003, de autoria do deputado Roberto Gouveia, trata da transferência da competência em fiscalizar e legislar assuntos relativos à Segurança e Saúde no Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego para o SUS (Sistema Único de Saúde). No entanto, a competência é exclusiva da União (art. 21, XXIV da CF/88), o que torna a proposta flagrantemente inconstitucional, já existindo manifestação do STF (Supremo Tribunal Federal) nesse sentido.

A atribuição ao SUS (que se organiza de forma descentralizada e está sujeito ao poder local municipal) para fiscalizar os ambientes de trabalho traduz-se numa desorganização do Sistema de Inspeção do Trabalho, afrontando a Convenção 81 da 0IT. Ratificada pelo Brasil, em seu art. 4°, preconiza que tal atividade deve estar sob vigilância e controle de uma autoridade central, que neste País é representada pela União Federativa dos Estados Brasileiros.

Da mesma forma, pelo fato de estar o SUS sujeito ao poder dos municípios, seus agentes seriam alvos fáceis de pressões políticas exercidas pelas empresas. Isso mais uma vez confrontaria a convenção da OIT, a qual, em seu art. 6°, determina que “o pessoal da inspeção deverá estar composto por funcionários públicos cuja situação jurídica e cujas condições de serviço lhes garantam a estabilidade no seu emprego e os independizem das mudanças de Governo e de qualquer influência exterior indevida”.

Outro ponto é que o PL 1.011, em que pese ter ementa relacionada à área da saúde, em verdade trata de matéria legislativa atinente ao Capítulo V da CLT. Como se sabe, está em discussão com a sociedade a reforma da legislação trabalhista no âmbito do FNT (Fórum Nacional do Trabalho). Portanto, entendemos como inoportuna qualquer proposta de lei relativa a matéria atinente à legislação do trabalho e que seja tratada fora do âmbito do FNT.

É importante lembrar que as condições ambientais de trabalho se inserem no âmbito da relação capital versus trabalho, não no âmbito da saúde, que deve ter papel de colaborador e participante das ações voltadas à prevenção dos infortúnios laborais. Mundialmente, são assim entendidas. Mesmo na Itália, que chegou a adotar um sistema descentralizado, já se voltou a “centralizar” as ações no Ministério do Trabalho.

Nas questões de Segurança e Saúde no Trabalho, o foco principal da proteção do trabalhador está no controle dos ambientes e riscos existentes nas atividades e métodos de trabalho, seja na preservação da integridade física ou na conservação da saúde do trabalhador, tarefa regularmente atribuída à área de segurança no trabalho a ser executada exclusivamente por técnicos e engenheiros de segurança no trabalho. Dessa forma, o primordial são as ações de controle dos ambientes de trabalho para se garantir a necessária segurança aos trabalhadores e não o  “conserto da saúde ou recuperação da vida dos cidadãos”, que é a atribuição do SUS.

A inspeção inerente às relações trabalhistas tem uma tradição de dezenas de anos e conta com um corpo técnico de auditores fiscais do trabalho em nível de pós-graduação em engenharia de segurança e medicina do trabalho, em permanente atualização e aperfeiçoamento. O Ministério do Trabalho, que conta com cerca de 3.300 desses fiscais, tem como política buscar ações conjuntas com vários órgãos de Governo e demais atores da sociedade, tais como ministérios, sindicatos e universidades. Apesar das dificuldades e dos desafios constantes, é importante ressaltar que a redução de acidentes fatais, nos últimos seis anos, foi de cerca de 38% em média no Brasil, que é um indicador do resultado positivo das ações do órgão. 

Quanto ao argumento de que o SUS estaria presente em todos os municípios, o MTE se organiza por meio de delegacias, subdelegacias regionais e postos de atendimento. Bastaria, portanto, um incremento na contratação de quadros por concurso público para se obter uma melhor cobertura local.

 

Eng. Celso Atienza
Vice-presidente do SEESP

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