Giro paulista

Lei que visa regularizar moradias é questionada em São Sebastião

Soraya Misleh

 

Aprovada em 5 de março último pela Câmara Municipal de São Sebastião, a Lei Complementar nº 81, que institui as Zeis (Zonas de Especial Interesse Social) na cidade, está sub judice. Conforme relata a assessoria de comunicação do Ministério Público Estadual, acolhendo representação formulada pela sua promotora de Justiça, Cláudia Maria Beré, o procurador geral ingressou em 12 de abril, no Tribunal de Justiça de São Paulo, com Ação Direta de Inconstitucionalidade, pedindo a suspensão dos seus efeitos via liminar. A justificativa é que, “com aparente propósito de regularizar e permitir a instalação de habitações de interesse social, coloca em risco concreto a ordem urbanística, o meio ambiente e a qualidade de vida das pessoas no presente e no futuro, já que o projeto foi aprovado sem o mínimo planejamento, sem os estudos técnicos indicados e sem consulta prévia válida à população e comunidades diretamente afetadas”. Uma das críticas que motiva o pedido de inconstitucionalidade é que sua votação antecedeu a definição do Plano Diretor, cujo projeto de lei está suspenso por decisão judicial, segundo o Ministério Público, devido a irregularidades.

A lei define que as Zeis serão descritas e caracterizadas por decreto do Poder Executivo, mas com participação e controle social. E implantadas somente nas chamadas áreas de especial interesse social, demarcadas em mapa anexo ao seu texto. Em tais zonas, deverá ser feito levantamento planialtimétrico com memorial descritivo, cadastro socioeconômico, bem como plano de urbanização. A norma determina a regularização de todas as construções já existentes identificadas, “mesmo estando em desacordo com os dispositivos das leis de uso e ocupação do solo”. No total, de acordo com o secretário municipal do Meio Ambiente de São Sebastião, Teo Balieiro, deverão ser beneficiados 42 núcleos, os quais foram congelados em 2005 para evitar novas ocupações e agregam aproximadamente 22 mil pessoas, quase 1/3 da população da cidade.

 

Riscos e verticalização
Segundo avaliação preliminar feita pela doutoranda do Departamento de Geografia da USP (Universidade de São Paulo), Cristina Rodríguez, cuja dissertação de mestrado trata do sensoriamento remoto e geoprocessamento aplicados na análise da legislação ambiental no município, a maioria das áreas demarcadas no mapa como destinadas às Zeis é, contudo, imprópria ou de proteção ambiental. Na sua concepção, necessita, portanto, ser resguardada, até para que se mantenha o fluxo hídrico da região. Ela continua: “Há áreas que estão na base das escarpas da Serra do Mar, o que favorece a suscetibilidade a escorregamentos e grande intensificação de processos erosivos, devido às altas amplitudes e declividades das encostas.”

A situação da região é peculiar. Segundo dados da assessoria de comunicação da Prefeitura, 70% da área do município, que conta com aproximadamente 100km de praias, insere-se no Parque Estadual da Serra do Mar. Na opinião de Elci Camargo, da CCY Advocacia Ambiental, consultora jurídica da SOS Mata Atlântica, o remanejamento da população tem que ser melhor pensado. Conforme Balieiro, em torno de 10% do total encontram-se em espaços onde não é possível a fixação. “Isso terá que ser discutido num plano de habitação e o Governo do Estado vai ter que estudar a remoção dessas pessoas.”

 

 

Além dos riscos, Mário Mantovani, diretor da SOS Mata Atlântica, enfatiza: “O prefeito está usando a questão das Zeis para negociar a verticalização. O que se propõe é colocar essa população mais para o fundo e usar o espaço territorial para a especulação imobiliária.” A possibilidade de construir prédios de até 20 metros (altura máxima incluindo-se a torre da caixa d´água) – oito a mais do que o permitido hoje – estava prevista em proposta de lei de uso do solo, a qual, contudo, por estar atrelada ao projeto do Plano Diretor, encontra-se suspensa. Márcia Mallet Machado de Moura, presidente da Associação dos Engenheiros, Arquitetos e Agrônomos de São Sebastião, não vê nenhum problema se a verticalização vier a ser definida nos limites da cidade. “Não interferiria no restante do município.”

 

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