Editorial

Uma coalizão em defesa da vida

Assim pode ser classificada a iniciativa lançada em São Paulo, em 18 de maio último, quando representantes de diversas organizações, redes e entidades, entre elas o SEESP, decidiram formar uma coalizão em defesa da água como bem público. Entre os pontos tratados, um consenso pela sua gestão cidadã e contra a privatização.Para tanto, ficou clara a necessidade de se construir uma plataforma nacional em defesa da água, inspirada na de caráter mundial apresentada durante o Fórum Social Mundial, ocorrido em Porto Alegre, em janeiro último.

O debate e a proposta de ação são mais que bem-vindos nas circunstâncias brasileiras. Se a água representará para o século XXI o que o petróleo foi para o XX, como prevêem os analistas, o Brasil será uma espécie de Arábia Saudita: o País concentra cerca de 10% da água doce do planeta. Apesar dessa vantagem, a situação geral do setor está longe de ser a mais desejável. Segundo diagnóstico do Ministério das Cidades, cerca de metade da população brasileira (83 milhões de pessoas) não é atendida por sistemas de esgoto; 45 milhões de cidadãos carecem de serviço de distribuição de água potável; quase 60% dos esgotos em todo o País não recebem tratamento; 65% das internações hospitalares de crianças de zero a cinco anos decorrem da ausência ou precariedade dos serviços de saneamento.

Diante de um cenário que combina água relativamente abundante e serviços precários, o Brasil despertou a cobiça dos grandes grupos que operam pelo mundo. Evidentemente, esses estão muitíssimo interessados em lucros astronômicos e bem pouco nas necessidades da população. Hoje, dezenas de municípios têm o saneamento básico a cargo da iniciativa privada. A cidade de Limeira, no interior de São Paulo, foi a pioneira e desde 1995 a Suez (ex-Lyonnaise des Eaux) opera o serviço local. O processo se notabilizou por aumento de tarifas e baixa qualidade dos serviços prestados, além de denúncia de corrupção levada ao Ministério Público. O Estado de São Paulo, particularmente, vive situação crítica nesse sentido. Como demonstrou reportagem da edição 255 do JE, a esmagadora maioria dos contratos de concessão entre a Sabesp e os municípios vencerão nos próximos cinco anos. Vários expiram ainda em 2005. Diante da lentidão da empresa em renovar esses acordos, técnicos do setor já advertem para o risco de que as cidades ofereçam os serviços à iniciativa privada.

Para evitar esse tipo de situação, seguramente catastrófica para o bem-estar da população, é que chega em boa hora a proposta de uma coalizão ampla e democrática. Essa deverá incidir articuladamente no cenário das políticas públicas em consolidação ou em discussão, integrar as agendas dos atores da sociedade civil, prover informações de forma sistemática, criar um banco de dados e planejar capacitações conjuntas, conforme a discussão iniciada em São Paulo e que deve prosseguir em Brasília ainda em junho.

O SEESP, sem dúvida, integra essa frente. Diante da necessidade de se preservar os recursos hídricos existentes no País e de garantir a universalização do serviço público de saneamento básico, é urgente criar mecanismos que impeçam o avanço da sanha privatizante no setor.

 

Eng. Murilo Celso de Campos Pinheiro
Presidente

 

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