Governo e sociedade

O Fome Zero e demais programas sociais propostos pelo Governo Federal devem receber apoio do movimento sindical e da sociedade em geral? Nesta edição, dois dirigentes do SEESP discutem essa questão e avaliam o início do mandato de Luiz Inácio Lula da Silva.

Participação, não mero adesismo
Apoiar ou não o Programa Fome Zero? Essa questão nos remete à reflexão sobre qual deve ser o papel dos sindicatos. Durante a ditadura militar, o sindicalismo atuou como agente das relações de trabalho e, já no final dos anos 70, também como catalisador de um grande movimento em prol das liberdades democráticas.

Hoje, devido a uma certa identidade com os propósitos e programas do Governo Federal, os sindicatos têm a possibilidade de ampliar sua interação com a sociedade e sua ação para  além de seus propósitos corporativistas. No atual sistema, o capital e o trabalho são partes indissolúveis e constitutivas das relações sociais, econômicas e políticas. Esses dois entes participam juntos do recém-criado Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social.

As comunidades e organizações não-governamentais começam a assumir sua responsabilidade social. A busca de novos papéis e parceiros, dentro desse novo cenário, levará o sindicalismo a interagir com aqueles projetos e propósitos do Governo, com os quais eventualmente se identificam, de forma autônoma e independente.

É imperioso o cuidado que o movimento sindical deverá ter para evitar um processo de transformação que o leve a ser apenas um apoiador das ações governamentais, perdendo sua identidade e se transformando em um movimento de chapa branca, como aconteceu em 1964. Por outro lado, virar as costas ao Fome Zero, entendendo-o como um programa essencialmente institucional e de responsabilidade governamental, e não apoiá-lo é abso­uta falta de visão.

Não se pode esquecer que o Fome Zero aponta, claramente, para a construção da cidadania, que tanto precisamos em nosso país e é um programa, antes de tudo, humanitário.

Cid Barbosa Lima Junior
Diretor do SEESP

Muda Brasil, já
Infelizmente, a impressão que tenho é que a lógica de Lampedusa, em “O Leopardo”, mais uma vez impõe-se lentamente – as coisas têm que mudar para que permaneçam como estão. Ou colocando de outro modo, vão os anéis e ficam os dedos. A sensação é que as forças progressistas no poder são domesticadas, imobilizadas pelas conservadoras.

A nova equipe (a das mudanças), pelo esforço que vem fazendo para dar continuidade à política econômica do governo anterior em detrimento do desenvolvimento do País, parece estar mais preocupada em conquistar para o governo o prêmio internacional de risco país zero.

Faz 20 anos que o País não cresce economicamente. Já perdemos três décadas, incluindo a em curso. O desemprego é brutal, a carga tributária e as taxas de juros asfixiam quem produz, diminuindo nossa competitividade e capacidade de gerar emprego e renda.

Tudo isso se exacerba com a chegada da nova sociedade do conhecimento e com o processo de globalização da economia, agravando os problemas não resolvidos pela economia industrial e colocando novos  desafios, muitos ainda desconhecidos e de difícil solução. Um deles é o da tendência da produção sem a participação do ser humano; outro, o analfabetismo tecnológico.

Por isso, votamos por mudanças, que só ocorrerão se houver ruptura com o atual modelo econômico. Fome Zero, renda mínima, bolsa escola, primeiro emprego e todo e qualquer programa social são bem-vindos. São paliativos, compensações, enquanto as soluções estruturais não vêm.

Há de se tomar cuidado, pois, embora muito paciente, o nosso povo pode acabar se cansando e almejando dedos, anéis e a mão toda.  Manifestando mais uma vez minha fé nas mudanças, finalizo parafraseando Bertolt Brecht: “As coisas vão mudar. Exatamente por serem o que são é que mudarão.”

Esdras Magalhães dos Santos Filho
Diretor 1º tesoureiro do SEESP

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