SEESP propõe intervenção na Eletropaulo

Após a medida, que foi solicitada ao Ministério Público Federal em 25 de fevereiro, seria necessária uma ampla auditoria na empresa e, se for o caso, a declaração de caducidade do seu contrato de concessão. A providência, além de evitar o colapso da companhia, cuja situação financeira é calamitosa, pode livrar os cofres públicos de novos prejuízos no caso AES Elpa.

Controladora da Eletropaulo, essa empresa deve ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) cerca de US$ 1,2 bilhão, referente a dois financiamentos e, em 31 de janeiro, anunciou a suspensão do pagamento. Para executar a dívida, o banco público tem como garantia apenas as ações da própria distribuidora, hoje cotadas em US$ 280 milhões. Grosso modo, o rombo fica em torno de US$ 1 bilhão. No entanto, nessa hipótese, iriam de contrapeso para a União as dívidas da Eletropaulo de aproximadamente R$ 5,9 bilhões e seu passivo trabalhista, ainda não calculado, relativo a milhares de reclamações desde a privatização, em 1998. Com o objetivo de evitar que mais essa conta seja paga pelo contribuinte, a representação do Sindicato ao MP pede que sejam propostas ações judiciais que impeçam o BNDES de assumir o controle da Eletropaulo.

A entidade reivindica ainda que a União seja obrigada a decretar a intervenção na direção da distribuidora, delegando a tarefa a alguém com “a isenção necessária para avaliar as razões que levaram a empresa a atingir a situação de desequilíbrio econômico que hoje se apresenta”, conforme o documento assinado pelo presidente do SEESP, Murilo Celso de Campos Pinheiro. Entre os pontos que contribuíram para a crise da companhia, pode estar a Resolução nº 20/99, pela qual a Aneel (Agência Nacional de  Energia Elétrica) deixou de exigir que as empresas solicitassem autorização para venda de ativos. “A distribuidora está acabando com o seu patrimônio sem que o poder concedente tome qualquer providência”, alerta o diretor do Sindicato, Carlos Augusto Ramos Kirchner. De acordo com ele, isso inclui a venda de oficinas de manutenção, que integram a sua atividade-fim e o objeto da concessão. Para completar o quadro, ela vem comprando energia da AES Tietê, geradora do mesmo grupo, por cerca de R$ 120,00 o MWh, embora o preço no mercado seja de R$ 50,00.

 

Caducidade em vez de reestatização
As propostas apresentadas ao MP pelo SEESP estão previstas no Artigo 32 da Lei 8.987/95 e no Decreto 41.019/57 e são mais que uma possibilidade. “É preciso lembrar que um serviço público, como é o fornecimento de energia elétrica, constitui obrigação do Estado, ainda que executado por um ente privado. Assim, se a concessionária não cumpre seus deveres ou apresenta uma situação econômica e financeira desequilibrada, o poder concedente tem de retomar para si aquilo de que é titular absoluto”, afirma Kirchner. Além disso, “a lei prevê, no caso de inadimplência ou de gestão temerária, a declaração de caducidade”. Por essa via, esclarece ele, a concessão é extinta e reverte ao poder público sem que esse tenha que se responsabilizar por obrigações contraídas pelo controlador privado, que teria direito apenas à indenização dos investimentos não-amortizados ou depreciados.  Com isso, a AES Elpa perde a Eletropaulo, mas fica com a dívida de cerca de R$ 5,9 bilhões e continua responsável por eventuais erros durante sua gestão à frente da energética paulista. A saída, explica Kirchner, é muito mais vantajosa à União que a simples encampação pelo BNDES ou a reestatização, o que hoje interessa mais à AES, que se livraria de suas obrigações após dar o calote no banco.

Caso para Mr. M

Utilizados os instrumentos legais disponíveis, a União terá a oportunidade de recuperar a situação e os serviços da Eletropaulo sem que sua dívida de aproximadamente R$ 5,9 bilhões seja transferida para as contas públicas. No entanto, resta a ser desvendado o mistério relativo aos empréstimos feitos pelo BNDES à AES sem que se exigissem as garantias devidas.  Companhia estadunidense com tentáculos pelo mundo, ela multiplica-se em várias subsidiárias, cujas obrigações não atingem a matriz. A que controla a Eletropaulo, por exemplo, tem sede no conhecido paraíso fiscal das Ilhas Cayman. Com isso, para se livrar do calote de US$ 1,2 bilhão anunciado pela AES Elpa, o BNDES não pode pôr as mãos em ativos do grupo pertencentes a outra subsidiária. Fica fora da jogada, por exemplo, a AES Tietê, em boa situação financeira, mas que não tem relação societária com a empresa inadimplente, sendo controlada por holdings, segundo divulgado pelo jornal Valor Econômico, sediadas em outro paraíso fiscal, nas British Virgin Islands. Para driblar esse emaranhado corporativo, o banco terá que enfrentar uma longa e tortuosa batalha jurídica.

Atualmente, conforme divulgado pela imprensa, o único a defender a operação tal como foi feita é o responsável por ela, José Pio Borges, ex-presidente do BNDES e hoje consultor da multinacional.

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