Integração à Alca ameaça trabalhadores

Flexibilização e precarização, arrocho salarial e aumento do desemprego. Esses efeitos devastadores no mercado de trabalho nacional e, conseqüentemente, nas condições de vida da população são apontados pelo jornalista Altamiro Borges, caso o Brasil acate os termos apresentados à criação da Alca (Área de Livre Comércio das Américas) e se insira nesse imenso bloco comercial.

O acordo, que tem por objetivo eliminar até 2005 as barreiras alfandegárias entre 34 países, atenta, conforme enfatiza o presidente do SEESP, Murilo Celso de Campos Pinheiro, contra a soberania das nações de economias mais frágeis, ao impor total falta de regras que protejam seus cidadãos, suas indústrias e possibilitem o desenvolvimento desses países. Organizador do livro “Como entender e combater a Alca”, o qual reúne diversos artigos, inclusive de sua autoria, que elucidam sobre o acordo, Altamiro Borges complementa: “As corporações empresariais passam a ter o mesmo estatuto jurídico de um Estado. Podem questionar as leis de uma nação e até solicitar sua revogação e pagamento de multa pelo Governo. A legislação trabalhista do País vai ser anulada. Nesse sentido, Fernando Henrique Cardoso já vinha preparando o terreno, com a proposta de reforma da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e as várias medidas de flexibilização.”

De acordo com ele, outro grave problema é que se tais corporações considerarem que manifestações públicas, como greves ou passeatas, afetaram-nas podem entrar com processo contra o Governo. “É um atentado à democracia e ao movimento sindical.”


Nafta piorada
Para saber os impactos da Alca no mercado de trabalho, conforme Borges, basta estudar os efeitos do Nafta (Acordo de Livre Comércio da América do Norte). “Representou um golpe violentíssimo inclusive aos trabalhadores norte-americanos.”

Desde que foi implantado, há oito anos, o Nafta gerou, ainda segundo Borges, mais de 750 mil demissões diretas somente nos Estados Unidos. “As corporações norte-americanas migraram para o México, onde a mão-de-obra é de dez a 15 vezes mais barata. Isso gerou queda de cerca de 30% no salário real nos Estados Unidos, de 1994 para cá. Além disso, houve aumento de desemprego e brutal precarização do trabalho.”

Se aos trabalhadores norte-americanos o Nafta representou desagregação, aos mexicanos, cujo país é sem dúvida mais frágil, significou o desmonte. “Segundo dados oficiais, antes havia 11 milhões de pobres no País, cerca de 16% da população. Em 2001, o número de miseráveis pulou para 51 milhões, o equivalente a 58% dos mexicanos. Desses, 20 milhões são considerados indigentes. No mesmo período, o preço da cesta básica de alimentos aumentou 560%; já o salário real subiu apenas 135%. Atualmente mais de 50% dos assalariados mexicanos recebem, em termos reais, menos da metade de há dez anos. O trabalho informal, precário, abarca hoje mais de 50% da População Economicamente Ativa, perto de 20 milhões de pessoas”, relatou Borges, em artigo intitulado “México e Canadá: a trágica experiência do Nafta”. No caso das mulheres, há denúncias de demissão por gravidez e assédio sexual. E Borges alerta: “No que a Alca for diferente, será para pior.


Panorama aos engenheiros
Os trabalhadores mais capacitados não levam vantagem em uma conjuntura de “livre comércio” das Américas. “Em um processo de desmonte de uma nação todos os setores sofrem e, se você parte da tendência que a Alca representa maior desemprego, inevitavelmente segmentos mais qualificados serão fortemente atingidos. Os engenheiros podem ter certeza que serão vítimas desse tratado de anexação”, avisa o jornalista. Murilo assevera: “Nossa garantia de qualidade tem de ser mantida e fortalecida em qualquer contexto de ação internacional. Não resta dúvida que a participação certeira do Sistema Confea/Creas nesse cenário é fundamental. É nosso conselho que deve defender tanto o profissional quanto a sociedade da desregulamentação.”

Para Borges, a atuação das entidades e a mobilização popular são fundamentais para impedir a aprovação da Alca, em detrimento dos trabalhadores. De acordo com ele, um momento importantíssimo para dizer não a esse acordo desigual será o plebiscito continental, que acontecerá no Brasil de 1º a 7 de setembro. O outro será a sucessão presidencial, nas eleições de 6 de outubro. “É preciso rejeitar a Alca na forma como está sendo tratada, a qual não é inevitável”, salienta.

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