ARGENTINA E MERCOSUL: O CURTO E O LONGO PRAZO

O Brasil inteiro assiste à lenta agonia do modelo cambial e ultraliberal que comandou a economia do País vizinho nos últimos anos. Nesta agonia, não faltam economistas ortodoxos na Argentina, a começar pelo titular de um sobrenome hípico, que culpam o Mercosul pelas dificuldades no País irmão. É incrível, mas diante da falta de dólares para sustentar o modelo cambial, pasmem os mais atentos, os ortodoxos de lá recomendam dificultar o comércio com o Brasil, sua única fonte de superávits comerciais, e abrir o mercado para importações de países que têm políticas agrícolas altamente subsidiadas e indústria infinitamente mais competitiva.

Será que os ortodoxos de lá acham que será mais fácil vender commodities agrícolas e produtos industriais aos EUA e Europa?

Como o dinheiro tem que sair de algum lugar, a proposta é cortar salários e serviços públicos. Esquecem os ortodoxos que o valor destes cortes em dólares depende da paridade cambial, a qual insiste em cair devido à expectativa negativa dos mercados.

No curto prazo, é difícil ter uma visão otimista. Não será a golpes de ortodoxia econômica que a Argentina sairá da crise.

As principais conseqüências da crise Argentina refletem-se por aqui em razão da nossa vulnerabilidade externa. O Brasil deveria reduzir juros e deixar o dólar cair até o seu ponto de equilíbrio. No médio prazo, o dólar caro desencoraja a importação e estimula a exportação e a substituição de importações. O governo deveria apenas preocupar-se em oferecer hedge aos importadores de bens de alto impacto inflacionário. Que paguem a conta os importadores de bens de baixo impacto inflacionário e quem se endividou apostando no dólar barato. Indague-se deles se cogitavam dividir os lucros com a sociedade. Não há porque prestar-lhes solidariedade com o dinheiro público.

Mas o curto prazo não é tudo. Gostem ou não os ortodoxos de lá, a Argentina continuará a ser vizinha do Brasil. Recursos complementares e similaridade cultural aproximam os dois países. Basta mencionar o imenso potencial de integração energética em petróleo, gás e hidroeletricidade, para enxergar as perspectivas de longo prazo. Até na agricultura, vista como potencial pomo da discórdia, há alguma complementariedade. O Brasil não tem trigo competitivo, mas a Argentina não tem açúcar nem café competitivos, por exemplo. Os mercados emergentes dos dois países representam, se somados, o equivalente a uma grande nação européia. Projetar fábricas e redes de distribuição considerando todo o Mercosul traz óbvias vantagens de escala operacionais, financeiras e de mercado.

Para a Engenharia brasileira, é vital combater a visão de curto prazo de economistas ortodoxos e apostar em investimentos nas áreas promissoras de integração: transportes, energia, comunicações. Ou em mercados comuns cada vez mais aproximados por regras, agentes e circunstâncias compartilhadas. Para a engenharia brasileira é vital explorar as maiores escalas de produção para viabilizar o desenvolvimento de produtos e serviços, processos e tecnologias no Brasil. Os ortodoxos esqueceram que investimento dá retorno.

Isto não quer dizer passividade face aos relinchos anti-Mercosul por vezes provenientes dos pampas. Quer dizer, ao contrário, defender com vigor os processos de integração como os melhores representantes dos interesses duradouros de Brasil e Argentina. Não se pode aceitar medidas unilaterais de restrição ao Brasil, nem propostas de abrir mais o mercado argentino para países de fora do Mercosul. É preciso bater duro no bolso, para lembrar ao parceiro que abandonar o Brasil gera mais custos do que benefícios.

Ao mesmo tempo, convém fazer ver aos setores interessados em negócios com o Brasil que o conflito não interessa à Argentina. O que interessa a ela e ao Brasil é um processo lento, firme e eqüitativo de progressiva integração física e de mercados. Um processo que envolve muita ênfase na engenharia e menos ênfase nos interesses financeiros de curto prazo, defendidos pelos economistas ortodoxos.

Eng. Paulo Tromboni de Souza Nascimento
Presidente

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