Cresce Brasil

Energia é destaque no PAC, porém sem estímulo forte à conservação

Soraya Misleh

 

Pensando em um crescimento anual do PIB de 5% em seu segundo mandato, o que exigirá a ampliação da oferta de energia, o Governo reservou ao segmento a maior fatia do bolo no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) – R$ 274,8 bilhões dos R$ 503,9 bilhões.

Estão, assim, contemplados projetos de PCHs (pequenas centrais hidroelétricas), termoelétricas e hidroelétricas – englobando, entre essas últimas, alguns empreendimentos considerados estratégicos pelos engenheiros, como as usinas de Jirau e Santo Antônio, no Rio Madeira, e Belo Monte, no Rio Xingu. “Foi muito importante sua inclusão, mesmo sabendo que só ficarão prontas depois de 2012”, salienta o consultor Carlos Monte.

Na geração, devem ser gastos R$ 65,9 bilhões de 2007 a 2010, para alcançar 12.386MW ao final desse período. E na transmissão, R$ 12,5 bilhões, para 13.826km de linhas. “Pelos nossos cálculos, a um crescimento de 6% da oferta de energia, precisariam ser adicionados novos 25.153MW, havendo, portanto, um déficit na produção de 12.767MW, que só poderá ser coberto por projetos e fontes privadas, se houverem”, afirma. As principais regiões a que se destinam os investimentos no setor elétrico são Norte e Nordeste – sendo cerca de R$ 29,7 bilhões à geração e transmissão na primeira e R$ 12,6 bi na segunda.

Além disso, para a expansão estimada, seria importante dar ênfase a medidas voltadas à conservação e eficiência energéticas, ao que o PAC deixou a desejar, na avaliação de Monte, também coordenador dos trabalhos técnicos do projeto “Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento”. No manifesto que reúne as proposições da categoria ao desenvolvimento do País com justiça social, lançado pela Federação Nacional dos Engenheiros em 2006, alerta-se para essa necessidade, frente a um crescimento interno significativo – no caso, de 6% ao ano – e a conseqüente ampliação da oferta de energia demandada (em torno de 8%): “A pressão ambiental gerada por essa meta representa um desafio severo que só poderá ser vencido com criatividade e determinação. Deverá ser contrabalançada pela introdução de estímulos poderosos às fontes energéticas sustentáveis e duradouras, assim como ao uso eficiente e à conservação.” Monte enfatiza: “A Empresa de Pesquisa Energética está considerando que haja leilão de eficiência, o que é um primeiro incentivo a essa idéia. E o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) lançou linha de crédito à conservação, mas não tem peso de política de governo.”

 

Renováveis e uso eficiente
Entre as medidas consideradas para tanto no Cresce Brasil estão o aumento da produção de energia proveniente da biomassa, incentivos à utilização crescente da co-geração e geração distribuída e a execução plena do Proinfa (Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica), em especial com o plano de PCHs, parques eólicos e co-geração.

Anunciado pelo Governo em 22 de janeiro, em discussão no Congresso Nacional e já recebendo emendas – no pacote constam sete medidas provisórias e cinco projetos de lei –, o PAC destina, contudo, apenas R$ 17,4 bilhões a soluções renováveis.

Monte lamenta também que tenha ficado de fora o programa de energia nuclear. “Não foi contemplada a conclusão de Angra 3.” No manifesto “Cresce Brasil”, sua continuidade é apontada como uma das premissas a um cenário de desenvolvimento nacional, a partir de 2010.

O documento dos engenheiros indica também o enorme potencial de crescimento do gás natural e a necessidade de destinar recursos aos gasodutos. Esses estão abrangidos pelo PAC, juntamente com o investimento em petróleo. Nos dois vetores, concentra-se a maior parcela para infra-estrutura energética: R$ 179 bilhões de 2007 a 2010, vindo principalmente do caixa da Petrobras.

Ainda nesse montante estão incluídos os programas de biodiesel e H-bio. Quanto ao etanol, quase não aparece no PAC, “pois os investimentos estão a cargo da iniciativa privada, devendo ser dada ênfase ao aumento de produção para atender o mercado externo. A nosso ver, a prioridade deveria ser ao interno, ocupando o álcool lugar crescente na matriz de transportes”.

Planejamento e destinação de recursos ao setor são fundamentais. As lições do passado são claras: em 2001, como conseqüência da falta de investimentos que se seguiu à onda de privatizações iniciada nos anos 90 – e que atingiu fortemente São Paulo –, os brasileiros amargaram um racionamento histórico.

Pelo menos até 2008, crise não deve ser revivida, avalia Monte. Após, a implementação dos projetos previstos no PAC deverá ser fator preponderante à garantia do suprimento de energia para a população.

 

Cteep, patrimônio público vendido em 2006

A lucrativa e rentável transmissora paulista – Cteep, criada em 1999, fruto da cisão da Cesp (Companhia Energética de São Paulo) – foi privatizada no final de junho de 2006. Ignorando o alerta dos técnicos e entidades do setor, incluindo o SEESP, de que se tratava de área estratégica no sistema nacional interligado, o Governo levou a cabo o malfadado leilão de venda.

Meses após a desestatização, em novembro último, foi lançado PDV (Plano de Demissão Voluntária) na transmissora paulista, a exemplo do que aconteceu nas demais privatizações do segmento. Assim, o quadro de pessoal da empresa foi reduzido significativamente. Dos cerca de 2.900 funcionários, 1.534 aderiram ao programa, entre os quais 213 engenheiros – de um total de 326. Com o PDV, a companhia abre mão de experiência acumulada durante anos no setor elétrico e pode pôr em risco o funcionamento do sistema.

 

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