Opinião

Reflexões sobre honra e virtude

Luiz Faro

 

“Saber o que é certo e não fazê-lo é a maior covardia.”
Confúcio

Schopenhauer (1788-1860) é, sob muitos aspectos, uma figura peculiar entre os filósofos. De ampla cultura, interessou-se, quase que igualmente, pela arte e pela moral. Escreveu um pequeno tratado sobre moral, além de muitos outros que o tornaram célebre.

Desde os pré-socráticos, muitos filósofos têm se preocupado com a honra, sem dúvida por ser o maior e mais precioso patrimônio que nos é legado por Deus.

Montesquieu, na sua obra-prima editada em 1748, “O espírito das leis”, discorreu sobre honra, comparando-a, nos governos monárquicos e republicanos, segundo os costumes, religiões, comércio e todas as demais manifestações que chamam a atenção dos verdadeiros estadistas. Essa sua valiosa contribuição à literatura revolucionou, por todos os aspectos, os então hodiernos literatos e sucessores a ponto dessa obra – viva até hoje – ter sido livro de cabeceira do presidente estadunidense Thomas Jefferson. Lê-se nessa peça literária como um estudo da separação de três poderes, principalmente no Ocidente. No estudo de Montesquieu sobre o homem, encara-se honra como uma virtude, diferenciando-a nas monarquias e nas repúblicas. Nas primeiras, a honra é a “mola propulsora” da aristocracia e nas repúblicas a “mola” é a virtude política dos seus eventuais representantes. Justificou os três poderes independentes como elementos de mútuo entrosamento positivo, a fim de evitar sobreposições nos direitos à cidadania e até, em certos casos lamentáveis, agressões à moral e corrupção que comprometem com contundentes prejuízos aos erários, patrimônios dos bens das comunidades.

Sócrates – que nada escreveu, mas muito ensinou – deixou, pelas palavras de seus discípulos, entre os quais se destaca Platão, referências à virtude. “Podemos dizer, de um modo geral, no homem tudo depende a alma da razão, condição indispensável para que ela seja boa e podemos concluir que a virtude é a razão, no todo ou em parte.”

Para os militares a honra implica penhor da própria vida, na defesa da Pátria, expressa na sua soberania. Ao que sabemos, é a única profissão que, assumida, implica esse sagrado compromisso. Aliás, Arthur Schopenhauer discorda do preço da vida atingir esse extremo, no que divergimos integralmente.

Não é preciso ser militar, da ativa ou da reserva, para medir a honra pelo risco da vida na conquista ou obtenção de um desiderato. Por acaso, não prova sua honra qualquer trabalhador, no trajeto casa-trabalho-casa, os tipos de riscos que enfrenta e pode ser vítima? Os médicos, no sagrado dever de prevenir ou curar, não se expõem a contaminações ou radiações, quando lidam com pacientes portadores de doenças transmissíveis ou psicopatas violentos ainda não diagnosticados? Os advogados, no trato, defesa ou julgamento de malfeitores, não ficam à mercê de reações que podem ser até fatais, inclusive para seus familiares? Os que manuseiam ou fabricam explosivos não podem, a qualquer instante, transformar-se em amorfos e horrendos pedaços do que era o seu corpo íntegro? Esses e incontável número de outros heróis anônimos enfrentam e dão exemplo de coragem, determinação e amor ao próximo nas suas dignificantes profissões.

O risco está à espreita em toda a parte. Como engenheiros de segurança do trabalho, reconhecemos que a prevenção vai até um certo ponto, a partir daí, valemos-nos do cálculo das probabilidades, o que não nos protege do acidente ou agressão. Todos se lembram do magistral piloto Ayrton Senna. Não foi ele vítima fatal pela falha de uma peça do seu carro, não obstante dispor de primorosa equipe de manutenção?

A coragem é a base da honra. É pela coragem que se mantém a honra que o Criador de todos os mundos e de todas as coisas nos dotou e nos confia ao nascer. Se a coragem periclita, a covardia impera e a honra se perde. Se não há honra, fenece a honestidade e desaparecem o bom e o bem. Alguns são tão impregnados de hipocrisia que simulam, escondendo de nós a sua maléfica psicopatia. Mentem, até para si próprios, e a ciência os chama de mitômanos, cleptomaníacos etc. Mas, nos seus momentos de lucidez e consciência, chama-os à ordem e lhes dá a merecida punição, fazendo-lhes ver o mentiroso e o ladrão.

Preservar a honra é vencer a si mesmo, é dominar suas próprias fraquezas. São os covardes que usam na defesa de suas deficiências morais a mentira, a calúnia, roubam, matam e cometem todas essas cadeias de elos repugnantes.

Charlie Chaplin, na sua alentada autobiografia, escreveu: “A vida não é nada. Mas pode ser coisa maravilhosa se tivermos um pouco de coragem. Mais valem as lágrimas por não ter vencido do que a covardia de não ter tentado.”

 

Luiz Faro
É engenheiro de Segurança do Trabalho

 

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