Opinião

Transporte continua perdendo recursos

Emiliano Stanislau Affonso

 

A Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) tem um potencial de arrecadação anual de mais de R$ 20 bilhões, parcela dos quais deve ser investida no transporte público. A regra está prevista no artigo 177 da Constituição Federal, que determina que os recursos arrecadados serão destinados ao pagamento de subsídios a preços ou transporte de álcool combustível, gás natural e seus derivados e derivados de petróleo; ao financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás; ao financiamento de programas de infra-estrutura de transportes.

Cabe ressaltar que contribuição do gênero foi o instrumento com o qual se resolveu o problema de transporte na Alemanha e está sendo utilizada com sucesso nos Estados Unidos e na Colômbia.

O mecanismo cria recursos permanentes que podem alavancar outros, oriundos dos governos estaduais e municipais e, em médio prazo, solucionar as questões de infra-estrutura básica de nossas metrópoles, cuja carência está acabando com sua competitividade e seus empregos. Pode propiciar a reestruturação e a racionalização do transporte coletivo, com a implantação de linhas estruturadoras (Metrô, Trens, VLTs, corredores de ônibus), diminuindo as deseconomias das cidades e aumentando sua eficiência. Será também um instrumento fundamental para recuperar nossas estradas e ferrovias e implantar a intermodalidade no sistema de transporte de carga e de passageiros, dando maior competitividade e eficiência ao nosso País.

No entanto e apesar de a Lei 10.636, que instituiu as diretrizes para a utilização da Cide, ter entrado em vigor em 2003, o veto aos artigos que deixavam claros os critérios de investimento dos recursos sinalizou que o Governo Lula pretendia continuar desviando sua aplicação. Tal fato fica evidente ao se confrontar as rubricas de arrecadação com as relativas à implantação e manutenção da infra-estrutura de transportes.

Em 2002, a arrecadação da Cide somou mais de R$ 8 bilhões, dos quais quase nada foi aplicado no setor. O Governo desviou recursos ou utilizou para gerar o superávit fiscal acertado com o FMI. Em 2003, a situação foi pior: só foram investidos R$ 216 milhões (aproximadamente 2% da arrecadação prevista), dos quais nada no transporte coletivo.

Em 2004, pela nova redação dada ao inciso II do artigo 159 da Constituição, 29% dos recursos da Cide passaram a ser repassados aos estados e ao Distrito Federal. Desses, 25% aos municípios, para que sejam aplicados na infra-estrutura de transporte. Apesar desse avanço, a situação se manteve inalterada, só foram empenhados R$ 28,3 milhões para serem investidos pelo Ministério das Cidades e, dos recursos encaminhados aos estados, apenas São Paulo aplicou em transporte coletivo, priorizando o Metrô e a CPTM.

A mobilização das entidades, entre elas o SEESP, continua. O desvio de recursos da Cide foi considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. O Tribunal de Contas da União, por sua vez, “aconselhou” que o governo federal não os contingenciasse.

 

Emiliano Stanislau Affonso
É diretor do SEESP

 

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