Opinião

Previdência e privatização da água

Cid Barbosa Lima Jr.

 

Mais uma empresa pública é, através do PED (Programa Estadual de Desestatização), alvo do Governo Alckmin. Desta vez, trata-se da maior companhia de águas da América, a Sabesp.

Com a venda de uma quantidade enorme de ações em 2004, por um valor irrisório, o Governo do Estado de São Paulo fez aumentar a participação do capital privado na companhia em cerca de 46% do total. Mas não param por aí as medidas para viabilizar esse projeto antipopular.

Para não fazer um enfrentamento direto com as forças que se opõem a essa privatização, usa-se a tática de “comer pelas bordas”. Os contratos de concessão com as prefeituras estão vencendo desde 2004, muitos se encerrarão nos próximos dois anos e a empresa não mostra qualquer empenho em renová-los. Assim, desobriga-se de sustentar municípios deficitários e liquida com o sistema de subsídios cruzados, beneficiando os acionistas e prejudicando a população do Interior do Estado com o fim do saneamento. A maioria das doenças de veiculação hídrica, que existiam até o início da década de 70, deve voltar, comprometendo a saúde pública.

Desde 2002, não há concurso público, exceto para casos pontuais. Em 2004, um edital de convocação chegou a ser publicado, mas foi cancelado abruptamente pelo secretário de Energia, Recursos Hídricos e Saneamento, Mauro Arce.

Como se não bastasse, foi contratada a empresa Watson Wyatt Brasil para dimensionar o quadro de pessoal da Sabesp, visando reduzir ainda mais o número de seus empregados. Reforçando essa situação, a diretoria da companhia lança mão de um processo intensivo de terceirização, incluindo até o controle sanitário de algumas cidades do Interior. Paralelamente, anuncia um projeto de PPP (Parceria Público-privada) para a estação de tratamento de água do Taiaçupeba e adutoras, com o compartilhamento (segundo a empresa) da gestão da operação.

 

O déficit que faltava
Após esse movimento de sucateamento da Sabesp, faltava eliminar um passivo trabalhista. Em setembro último, a empresa apresentou – e o Conselho Deliberativo da Sabesprev aprovou, a toque de caixa – a mudança do plano previdenciário, sob a justificativa de acabar com o déficit técnico atuarial.

A medida significará grande prejuízo aos técnicos mais antigos e experientes da Sabesp, pois o plano ainda em vigor prevê uma complementação de até 70% dos seus salários, enquanto o proposto é de contribuição definida, como qualquer um existente no mercado, sem determinação do benefício e do prazo de utilização.

Ao mesmo tempo em que não terá mais que arcar com qualquer passivo, a empresa força seus técnicos mais experientes a se aposentarem antes do tempo normal, eliminando o que é considerado o grupo de altos salários.

Feito isso, a empresa está pronta para a privatização. Conta com um corpo de empregados enxuto, barato e que só atende às regiões metropolitanas do Estado, em outras palavras, as mais lucrativas. É o lucro derrotando a saúde pública.

Não podemos e não devemos esquecer o trágico apagão, fruto da privatização do setor elétrico. Não podemos esquecer a privataria, como costuma dizer o articulista Elio Gaspari, do setor de telefonia. Sem telefone, sem eletricidade ainda há vida – sem água isso é impossível.

 

Cid Barbosa Lima Junior
É engenheiro da Sabesp e diretor do SEESP.

 

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