Energia

Na mira do Governo, CTEEP corre o risco de ser privatizada

Soraya Misleh

 

Criada em 1999, fruto da cisão da Cesp (Companhia Energética de São Paulo) – e posteriormente incorporando a EPTE (empresa de transmissão resultante de idêntico processo na Eletropaulo) –, a CTEEP (Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista) pode deixar de ser estatal. O caminho para tanto estará aberto caso seja aprovado o Projeto de Lei nº 2/05.

Encaminhado em 1º de fevereiro à Assembléia Legislativa pelo governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, para tramitar em regime de urgência, tal permite a alienação de ações do capital social da empresa. Altera, assim, a Lei nº 9.361, de 5 de julho de 1996, que criou o PED (Programa Estadual de Desestatização) e dispôs sobre a reestruturação societária e patrimonial do setor energético, deixando as transmissoras de fora desse processo. Portanto, sob o controle do Estado.

O Governo justifica sua tentativa de mudar isso em função da necessidade de fazer caixa para amortizar a imensa dívida da Cesp – em setembro de 2004, em torno de R$ 11,3 bilhões. Segundo o secretário de Energia, Recursos Hídricos e Saneamento de São Paulo, Mauro Guilherme Jardim Arce, para honrar compromissos no curto prazo, que exigem cerca de R$ 3 bilhões, está em negociação um acordo com o BNDES em que o Estado capitalizaria a empresa com ações da transmissora e a instituição financeira faria o mesmo, aportando recursos próprios em igual valor. Além disso, seriam lançadas pela Cesp no mercado debêntures conversíveis em ações num total de R$ 2 bilhões. “Esse é o modelo, não implica privatização”, enfatiza. Todavia, Arce admite que “se o BNDES não topar o acordo, não restará outra alternativa senão vender ativos da companhia”.

O desfecho trágico atingiria em cheio os trabalhadores e os consumidores. Apesar de o secretário negar tal efeito deletério, como observou o deputado estadual Nivaldo Santana (PCdoB-SP), “no setor elétrico, os resultados já são conhecidos pela população: racionamento de energia, tarifas abusivas, queda da qualidade dos serviços, demissões”. Não bastasse isso, na sua concepção, vender a CTEEP não resolve o problema da dívida da Cesp. Isso porque, conforme a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), os ativos da transmissora paulista estão estimados em
R$ 16 bilhões – mas a própria empresa avalia seu patrimônio por um montante bastante inferior: cerca de R$ 4 bilhões. E, pela experiência com as privatizações anteriores, técnicos acreditam que a CTEEP seria oferecida por menos da metade desse último valor.

Além disso, em artigo publicado em seu site, Santana lembra que “o projeto joga por terra dois compromissos assumidos pelos tucanos: o primeiro, de que o setor de transmissão de energia elétrica não seria privatizado, por ser de interesse estratégico para o Estado; o segundo, de que o PED seria extinto e substituído pelo Programa Estadual de Desenvolvimento de São Paulo”.

 

Engenharia em xeque – Doutorando em Energia pela USP, José Paulo Vieira concorda e vai adiante: “Graças aos esforços da transmissora, tem ficado clara a urgência de reforços no sistema de subtransmissão – basicamente linhas de 138kV – de São Paulo, cuja responsabilidade pela expansão e atendimento do aumento de carga é das distribuidoras de eletricidade. No entanto, o insuficiente desempenho dessas empresas, agora privadas, levou a Aneel a autorizar a CTEEP a realizar obras para garantir a confiabilidade dos sistemas elétricos no Estado. Como ficará essa situação caso a companhia seja privatizada?”, questiona, em artigo de sua autoria.

Apreensivos com essa possibilidade, técnicos ressaltam que há um déficit acumulado de obras na transmissão paulista de cinco anos em função da ausência das distribuidoras e o que precisa ser feito é resolver isso, bem como efetuar as grandes manutenções, as quais têm sido constantemente adiadas – informação essa que a assessoria de comunicação da CTEEP desmente. Fato é que a proposta, na concepção de Vieira, coloca em risco toda a engenharia operacional praticada pela companhia na manutenção, operação e supervisão de sua malha de extra-alta tensão.

 

Mobilização é o caminho – Para impedir mais esse desmonte no setor elétrico, na Assembléia Legislativa, os oposicionistas tentam obstruir a tramitação do projeto. Também apresentaram emendas que visam preservar o controle acionário pelo Estado e os direitos dos trabalhadores – porém, foram todas rejeitadas em comissões.

No contexto, Nivaldo Santana considera imprescindível a mobilização da sociedade, “especialmente dos trabalhadores do setor, no sentido de constranger a maioria governista a aprovar o projeto”. Na sua ótica, esse processo precisa adquirir caráter de campanha. As articulações nesse sentido já tiveram início. Além de procurar conscientizar os trabalhadores da CTEEP sobre o efeito nefasto que eventual privatização pode ter em suas vidas, as entidades do setor têm feito gestões junto aos parlamentares na tentativa de sensibilizá-los para a questão. A estratégia de atuação definida por diversas delas, entre as quais o SEESP, inclui ainda esclarecer a população.

 
 

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