Memória

Nos tempos da régua de cálculo

Rita Casaro

 

No início dos anos 70, chegaram ao Brasil as primeiras calculadoras. Modelos básicos custavam cerca de U$ 300 e eram objetos de desejo de quem dependia de matemática para seu ofício. “Eu fui a São Paulo especialmente para comprar essa máquina, que fazia as quatro operações, elevava ao quadrado, extraía a raiz e tirava a porcentagem. E era uma maravilha! Quando trouxe, faziam fila para vê-la”, conta o engenheiro Júlio César Ribeiro, professor das escolas de engenharia da Unesp e Unip, em Bauru, e da Unilins.

Nessa época, rememora ele, começava o declínio de um instrumento que havia sido essencial aos engenheiros por longo tempo: a régua de cálculo. “Até então, não havia outro jeito porque não existiam máquinas e a engenharia depende única e exclusivamente de cálculos. Sem a régua, seria extremamente dificultoso fazer conta.” A ferramenta, explica o professor, foi criada com base na definição de logaritmos. Segundo Ribeiro, o artefato era especialmente importante para os calculistas, que utilizaram os modelos mais sofisticados e precisos, que tinham até 30cm de comprimento. Para os alunos, uma de 10cm servia para aprender.

E essa não era tarefa simples, lembra o professor, que treinou estudantes no manejo da régua a partir de 1967, na então recém-criada Escola de Engenharia da Fundação Educacional de Bauru: “São muitas regras, para aprender levava uns dois anos. Era dose para o aluno dominar a régua de cálculo!” Por isso mesmo, era a disciplina ensinada no início do curso. “Nós dávamos os princípios básicos, as operações elementares, ensinávamos como multiplicar, dividir, elevar ao quadrado, ao cubo e como fazer a leitura das funções trigonométricas, seno, co-seno e tangente.” Havia também, conforme Ribeiro, inúmeros macetes para a leitura correta. “Tinha muita regrinha para guardar, os alunos só conseguiam exercitando, então passávamos tarefas que eram continhas de dividir, multiplicar etc. Como faziam isso em todas as aulas, acabavam aprendendo por exaustão.”

 

Sem saudosismo Embora tenha utilizado e ensinado a usar a régua de cálculo, Ribeiro comemora os modernos recursos à disposição de estudantes e profissionais. “Uma prova de mecânica durava cinco horas, para resolver dois, três exercícios. Hoje, o aluno faz isso em uma hora. A gente passava uma tarde quebrando a cabeça com equações diferenciais e a calculadora faz em um minuto. Os coeficientes de segurança ficaram a menos da metade do que se usava há 30 anos porque a precisão melhorou muito, assim houve economia. Atualmente, compra-se por R$ 30,00 uma máquina científica excelente, que faz tudo que se precisa na engenharia. Dá para fazer um projeto dentro do ônibus. A coisa mudou muito e para melhor, não dá para comparar”, defende.

O professor também não faz coro àqueles que afirmam a superioridade da formação dos engenheiros que precisavam manejar uma régua de cálculo. “Eu acho isso discutível. Os professores se queixam que os alunos não sabem tabuada, o que é verdade. Se perguntar quanto é 8 x 9, terão que pegar a calculadora. Mas até que ponto isso é importante? O aluno pode aprender coisa mais útil que fazer conta”, dispara.

 
A origem

Segundo o Museu Virtual da Informática (http://piano.dsi. uminho.pt/museuv), em 1614, John Napier descobriu os logaritmos que tornaram possível executar multiplicações e divisões por meio de adições e subtrações. Por exemplo, a x b = 10^(log(a) +log(b)); a/b= 10^(log (a)-log (b)).

William Oughtred criou, em 1622, a régua de cálculo, originalmente circular. Edmund Gunter desenhou segmentos de reta em que a posição dos números era proporcional aos seus logaritmos. Oughtred desenhou uma régua retangular com uma mais estreita que desliza entre as duas outras.

 

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