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Ambiente – A Rio+20 não é um fracasso

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Gilberto Maringoni


É no mínimo precipitada a avaliação entre ambientalistas e órgãos de imprensa de que a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável – a Rio+20 – “fracassou”. A base para essa sentença é o texto ratificado pelos representantes dos 193 países presentes ao evento.

Resoluções de fóruns tão diversificados em sua composição tendem a ser genéricas. Some-se a isso o fato de utilizarem o método de aprovação por consenso, o que retira diferenças e visões mais incisivas de qualquer instrumento aprovado.

No entanto, a Rio+20 é muito mais do que suas resoluções. São 6 mil eventos com a participação de quase 100 mil pessoas de várias partes do mundo em iniciativas das mais diversificadas. A conferência comporta fóruns governamentais, parlamentares, empresariais, de movimentos sociais e de entidades privadas.

Mesmo a última versão do documento, intitulado “O futuro que queremos”, aprovado pelos chefes de Estado em 22 de junho, não pode ser avaliada secamente como “avanço” ou “retrocesso”. Ele apresenta uma característica extremamente avançada: é totalizante no método. Ou seja, difere-se em muito de reivindicações estanques e fragmentadas que setores do movimento ambientalista apresentam (não todos, é bom frisar), de limitada serventia para a construção de políticas globais. O documento da Rio+20, ao contrário, busca relacionar e contextualizar a questão ambiental aos temas das desigualdades sociais e das diferenças econômicas entre países.

Os problemas do texto são de outra ordem. Ele é longo – 49 páginas – abrangente e genérico. Aponta diversos problemas estruturais no modelo de desenvolvimento predatório existente, mas sem definir responsáveis ou ações claras para suas soluções. Há poucas decisões ali e existem razões para isso. Os Estados Unidos e alguns países da União Europeia admitiram a menção de problemas, mas não quiseram se comprometer com ações concretas para sua superação. O Vaticano pressionou para que se retirasse uma defesa mais explícita aos direitos das mulheres sobre a sexualidade.


Pobreza e economia verde

As linhas iniciais do texto destacam que “erradicar a pobreza é o grande desafio global colocado para o mundo atual e um pressuposto indispensável para o desenvolvimento sustentável. Para isso, teremos de libertar a humanidade da pobreza e da fome com urgência”. “O futuro que queremos” advoga “a mudança de padrões insustentáveis de produção e consumo”. E aponta como alternativa a “promoção da gestão sustentável e integrada dos recursos naturais”, para que se criem maiores oportunidades para todos, reduzindo as desigualdades.

Adiante é reafirmada a importância da liberdade, da paz e da segurança, além do respeito aos direitos humanos e a um adequado padrão de vida. Além disso, relaciona a questão ambiental a tópicos como transportes, mortalidade infantil, erradicação de doenças endêmicas (Aids, tuberculose, malária e outras), trabalho precário, defesa de populações originárias etc.

O texto reconhece a necessidade de se “acelerar o progresso para que se reduza a distância entre os ritmos de desenvolvimento entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento”. Para isso, é necessário “aumentar a cooperação internacional” que logre combinar crescimento econômico, avanço social e preservação ambiental.

As indefinições do documento também estão presentes no conceito de economia verde, cujo significado não está explicado. Isso faz com que sua enfática defesa ao longo de 13 parágrafos dependa de detalhes mais explícitos sobre o que se pretende.

Até dentro do sistema ONU, o texto apresenta características positivas. Em uma das raras decisões arroladas está a de se criar “um fórum político intergovernamental” para a discussão do desenvolvimento sustentável. É muito menos do que a pretendida elevação do Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) à condição de agência permanente, mas o texto deixa clara a existência de uma forte tensão nesse sentido entre os países signatários.

Ao mesmo tempo, apesar de mencionar “a necessidade” de se criarem fundos, agências e outras entidades no sistema ONU voltadas para o meio ambiente, o documento joga para a frente deliberações nesse sentido. Há poucas metas concretas para que se alcance o desenvolvimento sustentável. Muitas dessas decisões foram proteladas para depois de 2015.


Qualidade da crítica

As críticas ao documento parecem não levar em conta a hierarquia entre países existente no mundo. Apesar da emergência de novos polos de luta política e social nos últimos 15 anos – em especial na América Latina –, a hegemonia estadunidense segue determinante no jogo pesado das relações internacionais.

Não se trata apenas da vontade política deste ou daquele governante, mas de se ter condições de enfrentamento com uma potência imperial e com o poder militar-financeiro e midiático das grandes corporações globais. “O futuro que queremos” não pode ser julgado apenas pela métrica dos desejos de quem quer estabelecer limites à devastação ambiental que se combinem com o desenvolvimento dos países. Deve-se levar em conta a realidade objetiva da cena mundial.


Gilberto Maringoni é historiador e editor da revista Desafios do
Desenvolvimento, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada)

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