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Engenharia - Seis meses depois, acordo para recuperar Mariana gera receios

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Soraya Misleh

Assinado em 2 de março e homologado pelo Tribunal Regional Federal (TRF) – 1ª Região em 5 de maio, o acordo extrajudicial entre as empresas Samarco/BHP e Vale e os governos federal e estaduais de Minas Gerais e Espírito Santo para recuperação dos danos causados pelo desastre em Mariana está longe de ser consenso. Recém-empossado para o governo interino de Michel Temer, o próprio ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho (PV-MA), afirmou, como divulgado pela mídia, que o acordo pode ser revisto.
A declaração foi dada após sua visita ao local da tragédia em 16 de maio. Ao constatar que a lama continua a se alastrar pela Bacia do Rio Doce, ele se recusou a assinar termo de conformidade para que a empresa volte a operar suas atividades, logo que obtiver as licenças necessárias. Passados seis meses do rompimento da barragem do Fundão, da Samarco, em novembro último, os impactos não foram contidos, e as vítimas continuam a aguardar uma solução justa.
De acordo com nota assinada pela Advocacia-Geral da União (AGU), Advocacia-Geral do Estado de Minas Gerais e Procuradoria-Geral do Estado do Espírito Santo, o acordo deve dar celeridade a isso. A alegação é de que “garante a execução privada das medidas previstas, sem a necessidade de que os recursos destinados aos atingidos transitem por fundos judiciais ou cofres públicos, o que demandaria o processamento por alvarás ou processos licitatórios, atrasando ainda mais o processo de recuperação ambiental e social”. Prevê, nessa direção, a constituição de uma fundação, “com gestão inteiramente privada, independente e transparente”.
Nele estão definidos aportes financeiros anuais, nos três primeiros anos de R$ 4,9 bilhões, sendo R$ 2 bilhões ainda em 2016 – a previsão inicial de R$ 20 bilhões a serem gastos foi retirada.
Conforme justificam esses órgãos, o acordo não está assentado em valores, mas na obrigatoriedade das empresas de recuperação integral dos danos causados. Assim, devem executar 22 programas socioeconômicos e 17 socioambientais. Entre eles, levantamento e cadastro dos impactados; ressarcimento e indenização desses; reconstrução de Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo e Gesteira (municípios destruí­dos com o desastre); recuperação das demais comunidades e infraestruturas impactadas; retomada de atividades econômicas; proteção social; apoio à pesquisa para desenvolvimento e utilização de tecnologias socioeconômicas aplicadas à remediação dos impactos; recuperação de nascentes, áreas de preservação permanente, manejo de rejeitos, coleta e tratamento de esgotos e gestão de riscos ambientais.

Falhas e limitações
Para o engenheiro Bruno Milanez, professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), do ponto de vista estrutural, o maior problema é a ausência do Estado na execução ou da sociedade civil no acompanhamento das ações de compensação e indenização. De acordo com o especialista, cabe à empresa escolher e contratar quem vai monitorar suas ações. “Existe um grande conflito de interesses nesse modelo. Ele está atualmente em voga no licenciamento ambiental e no monitoramento das barragens em Minas Gerais, e foram exatamente suas falhas que permitiram que o desastre acontecesse. Deveríamos aprender com essa tragédia e não repetir os mesmos erros.” Na visão de Milanez, atividades de risco, como gestão de barragens, deveriam ser monitoradas por agentes sem influência das empresas alcançadas.
O professor questiona ainda o excesso de poder dado à fundação criada pelo acordo, a quem caberá “definir a elegibilidade e os parâmetros de indenização aos atingidos”. Corroborando as críticas feitas por Milanez, o Grupo de Estudos e Pesquisas Socioambientais (Gepsa), criado na Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) após o desastre, assinou nota que reúne dezenas de entidades contra o acordo. “A falta de participação dos atingidos pelo desastre, do Ministério Público e da sociedade civil revela a falta de transparência a respeito da concepção de seus termos, conferindo amplos poderes de decisão às empresas autoras do desastre-crime”, reitera.
Para o Gepsa, que conta entre seus membros com profissionais da categoria, a melhor forma de garantir a reparação é ouvir os impactados. Os engenheiros, considera, têm contribuição fundamental, não só “à recuperação dos danos causados ao longo da Bacia do Rio Doce, mas principalmente na compreensão das causas desse desastre e reformulação do modelo de exploração minerária e gestão dos riscos decorrentes dela”. Milanez defende que os conselhos e sindicatos criem uma força-tarefa para verificar a real situação das barragens existentes, de modo a minimizar seus riscos. Murilo Celso de Campos Pinheiro, presidente do SEESP, observa que é preciso mais engenharia nesses processos, inclusive na formulação de políticas públicas para evitar que desastres como o de Mariana se repitam.

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