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19/07/2013

Análise – Os três elementos da conjuntura

A disputa
Há, claramente, um conflito distributivo. A recuperação, pelo governo, dos instrumentos de decisão do Estado para fazer política de interesse nacional e fazer política econômica, assusta e apavora os neoliberais.

A capacidade de influenciar a formação dos preços, por exemplo, ajuda na redução de custos, facilita a formalização da economia e do trabalho, amplia a oferta de bens e serviços, garante emprego e renda, e cria condições para o investimento produtivo.

A mídia, o mercado financeiro e a oposição discordam desse modelo, que foi iniciado no governo Lula e aprofundado no governo Dilma.

Por isso reagiram com hostilidade à intervenção do Estado na regulação da taxa de retorno de alguns setores da economia, inclusive naquelas áreas/setores objeto de concessão de serviços ou bens públicos, como foi o caso do marco regulatório da energia elétrica.

Desde o governo FHC, passando por Lula e Dilma a geração de emprego e a distribuição de renda variaram, para baixo ou para cima, na exata proporção do alinhamento dos governos com o mercado financeiro ou com o setor produtivo.

Quando a convergência de preferência da equipe econômica (Fazenda e Banco Central) foi com o mercado financeiro, a renda e os empregos encolheram. Quando foi com o setor produtivo, cresceram.

Nesse período, passamos por três fases bem claras.

A primeira fase, de total sintonia entre equipe econômica e mercado financeiro, corresponde aos oito anos do governo FHC e os primeiros anos do governo Lula (janeiro de 2003 a março de 2006), exatamente o período em que a Fazenda esteve sob a chefia de Antonio Palocci e o Banco Central sob a presidência de Henrique Meirelles.

Na segunda fase, compreendida entre o restante do primeiro e todo o segundo mandato de Lula, houve mudança nessa convergência: o novo ministro da Fazenda, Guido Mantega, alinhou-se com o setor produtivo e o presidente do BC, com o mercado financeiro.

Foi nessa fase que começou a virada, quando o mercado financeiro perdeu um dos dois (até então) aliados da equipe econômica. Nela acontece a transição da agenda dos credores para a agenda do governo, que saiu da condição de devedor para a condição de credor líquido.

Na terceira fase – relativa ao governo Dilma, na qual a equipe econômica (Fazenda e BC) se alia ao setor produtivo –, é que efetivamente são criadas as condições para redução da taxa de juros e dos spreads bancários, com o conseqüente deslocamento do fluxo de recursos para o crédito, o consumo e a produção em detrimento da especulação financeira.

Isso, para o mercado financeiro e até parcela do setor produtivo, é inaceitável, daí a campanha raivosa da mídia contra o governo Dilma.

A sucessão
A precipitação do debate sucessório agitou a oposição, a mídia e o mercado no sentido de desgastar e desqualificar o governo da presidente Dilma, antes festejada por esses mesmos segmentos.

Com o sucesso da ação governamental, que passou a ter controle sobre a agenda econômica, a mídia, a serviço do mercado e da oposição, intensificou a campanha de desqualificação do governo e das instituições.

Inicialmente, utilizou o denuncismo e a judicialização da política como arma política para atingir o PT e suas lideranças e, por tabela, enfraquecer o governo em geral, e a presidente Dilma, em particular.

Com as denúncias, esperavam satanizar o governo do PT e seus aliados e em conseqüência, vencer as eleições.

Com a judicialização da política, pretendiam escolher com quem disputar as eleições, afastando da vida pública, mediante condenação judicial, nomes carismáticos e com apoio popular, como Lula e seus aliados, que seriam impedidos de participar das disputas eleitorais.

Apesar do julgamento do chamado mensalão e da abertura de investigação pelo Ministério Público contra Lula, isso não funcionou.

Ao perceberem que o denuncismo e a judicialização da política não teriam o condão de, sozinhos, retirar do PT e de Dilma as eleições de 2014, partiram para o terrorismo inflacionário e para denuncias sobre a má qualidade dos serviços públicos.

O terrorismo inflacionário (simbolizado pelo preço do tomate), as denúncias sobre a má qualidade dos serviços públicos (imagens com hospitais lotados e sem médicos) e a acusação de suposta negligência no combate à corrupção (ilustrada pelo retorno de partidos afastados por corrupção para cargos no governo), sem qualquer contraponto da comunicação oficial do governo, despertaram a insatisfação/indignação da juventude e da classe média com a oferta de serviços públicos de má qualidade.

A nova tática era, em nome do combate à inflação, forçar o aumento da taxa de juros e dos spreads bancários, além de conter os ganhos salariais.

Como as principais conquistas do governo Dilma dependem dos juros baixos e da inflação sob controle, a percepção de ameaça de perda de qualidade de vida provocariam uma reação popular.

Com isso atingiriam os pilares da popularidade da presidente Dilma: a taxa de juros baixa, os programas sociais e a geração de emprego e renda.

O objetivo era anular, do ponto de vista político e eleitoral, os ganhos da população decorrente da redução da conta de luz, da zeragem dos tributos federais da cesta básica e do adiamento de reajuste de combustíveis, entre outras medidas que resultaram melhoria da qualidade de vida.

Essa linha de atuação funcionou e criou constrangimento e colocou o governo na defensiva, a ponto de liberar o banco central para aumentar a taxa de juros para controlar a inflação.

O Banco Central para controlar a inflação, de um lado, e demonstrar que possui autonomia funcional, de outro, retomou o aumento na taxa Selic, a primeira vitória dos rentistas.

Os protestos
O clima de desconforto entre aliados com a postura e o estilo da presidente da República, que pouco dialogava com o Congresso e, principalmente, com os movimentos sociais, em particular com o sindical, se alastrou nas redes sociais alimentado pela campanha da mídia.

Esse isolamento da presidente, combinado com a ausência de comunicação oficial para combater a campanha da mídia, criou as condições para a insatisfação quase que generalizado:

1) na sociedade, que se manifesta e protesta;

2) no Parlamento, que ameaça o governo com o orçamento impositivo; e

3) no mercado, que se recusa a investir e hostiliza a regulação com reflexos sobre as margens de lucro da iniciativa privada.

Como bem pontuou o governador Eduardo Campos, podemos identificar três crises em curso:

- Uma crise de representatividade (as pessoas não se sentem representadas pelas instituições);

- Uma crise de valores (o sentimento é de que os recursos públicos não são bem aplicados); e

- Uma crise na qualidade dos serviços públicos.

A percepção de ameaça de piora nos indicadores econômicos (inflação, juros, câmbio e emprego), a sensação de impunidade, a má qualidade dos serviços públicos (saúde, educação, segurança e transporte), os gastos exagerados com os eventos da Fifa (Copas das Confederações e do Mundo), a ausência de comunicação eficiente do governo federal, combinados com a falta de carisma e o estilo centralizador e arredio da presidente Dilma, compôs o quadro ou o pano de fundo das manifestações.

Do limão uma limonada
Aparentemente, o povo nas ruas reclamando por melhoria na prestação de serviços e na qualidade no gasto público é o suporte que qualquer governo popular gostaria de ter para levar à frente uma agenda de reformas.

Temo que no Brasil atual não seja esse o caso.

Em primeiro lugar, porque as manifestações e protestos não passaram pela sociedade civil organizada nem tiveram lideranças claras para conduzir o debate com os poderes constituídos com vistas ao atendimento das demandas.

Em segundo, ficou patente a falta ou ausência de protagonismo da sociedade civil organizada nas manifestações de rua.

Em terceiro, porque o despertar para as manifestações e protestos não nasceu nos setores organizados, mas nas redes sociais e na imprensa, que transmitiram um quadro de suposta ameaça às conquista dos últimos anos, como a estabilidade econômica, a inflação sob controle, os juros baixos e geração de emprego e renda.

Esse processo deve servir de lição aos movimentos sociais e levar a algumas reflexões sobre a necessidade de sua oxigenação.

- A primeira reflexão é sobre o déficit na formação e preparação de militantes e lideranças para os movimentos sociais, que só será preenchido com uma programação de educação política.

- A segunda reflexão é que o apoio acrítico ao governo se revelou uma estratégica equivocada, ainda mais o governo Dilma que não dialoga nem consulta sua base social sobre as políticas e diretrizes de governo.

- A terceira reflexão é que a principal função dos movimentos sociais deve ser sempre de disputar na sociedade e no governo uma agenda capaz de atender aos pleitos e reivindicações gerais da população, particularmente por mais liberdade, transparência, participação na formulação das políticas públicas e a justiça social.

O mais grave é que o governo Dilma, que deixou a política em segundo plano, pode ter colocado em risco grandes conquistas dos últimos dez anos, tanto em termos materiais quanto político.

A presidente, no conforto da popularidade, ignorou a investida da direita, da oposição, do mercado financeiro e da grande imprensa.

A campanha da mídia, a serviço da oposição e do pode econômico, que critica e desqualifica o governo em temas sensíveis à população, não está preocupada em melhorar a qualidade de vida do povo, mas simplesmente evitar que o governo continuasse avançando na distribuição de renda.

Nessa perspectiva o governo tinha adotado uma série de medidas que tiveram reflexo positivo sobre os assalariados – como a Selic baixa, a redução do custo de energia e da cesta básica – mas infelizmente foram ações conjunturais, que perdem significado político e eleitoral se a inflação voltar a subir ou, se para contê-la, o BC tiver que aumentar a taxa de juros, como vem fazendo.

Reação da presidente
A presidente, após os protestos, veio a publico num pronunciamento à nação reconhecendo a importância das manifestações e prometendo diálogo e respostas às suas demandas.

Propôs cinco pactos: 1) pacto pela responsabilidade fiscal; 2) pacto pela construção de uma ampla e profunda reforma política; 3) pacto pela saúde; 4) pacto por melhorias no transporte público; e 5) pacto por melhorias na educação pública.

A julgar pela idéia de pacto pela responsabilidade fiscal, virá um forte ajuste nas contas públicas, sinalizando um arrocho sobre os servidores no plano federal.

Porém, ao mesmo tempo em que o governo deseja um maior controle do gasto público, os servidores e trabalhadores têm argumentos e poder de pressão para cobrar da presidente o mesmo tratamento dado ao setor empresarial, que se beneficiou com grandes renuncias e incentivos fiscais.

O governo claramente está debilitado e dependerá muito de sua base social, leiam-se os movimentos sociais e partidos do núcleo estratégico do governo, como PT, PSB, PDT e PCdoB.

Isso abre perspectiva em duas frentes para os trabalhadores da iniciativa privada e servidores públicos.

Da agenda dos servidores, é possível aproveitar esse momento para exigir a aprovação no Congresso da PEC dos inativos, a amenização dos efeitos do fator previdenciário e a regulamentação da convenção 151 da OIT.

No caso dos trabalhadores do setor privado, a pressão deve se concentrar na amenização dos efeitos perversos do fator previdenciário e na garantia de estabilidade ao dirigente e representante sindical, com boas chances de prosperar; na regulamentação da terceirização em favor dos trabalhadores, com a rejeição do PL 4.330/04; e na redução da jornada.

Por último, registre-se que estas reflexões foram feitas na reunião do conselho de representantes da Federação Nacional dos Servidores do Poder Judiciário Estadual (Fenajud), entidade filiada ao Diap, realizada em 4 de julho na cidade de São Luis, no Maranhão.

* Antônio Augusto Queiroz é jornalista, analista político e diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). Artigo originalmente publicado no site do Diap.




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