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21/02/2022

Engenharia hídrica atua na compreensão social, econômica e biológica da água

O primeiro curso da modalidade foi criado, no País, há 25 anos.

 

Rosângela Ribeiro Gil
Oportunidades na Engenharia

 

Segundo dados do Governo Federal, o Brasil detém 12% das reservas de água doce do Planeta, perfazendo 53% dos recursos hídricos da América do Sul. Grande parte das fronteiras do País é definida por corpos d'água – são 83 rios fronteiriços e transfronteiriços, além de bacias hidrográficas e de aquíferos. As bacias de rios transfronteiriços ocupam 60% do território brasileiro. No cenário internacional, os recursos hídricos ganham relevância fundamental, assim como o manejo sustentável da água para o bem-estar das populações e para o desenvolvimento dos países, e o profissional de Engenharia Hídrica.

 

Felipe Lobo UFPel 400Felipe Lobo, professor e coordenador do curso de graduação de Engenharia Hídrica, da UFPel. Crédito: Acervo pessoal.O professor e coordenador do curso de graduação dessa modalidade, na Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Felipe Lobo, observa que a Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei 9433/1997) – que regulamentou e aperfeiçoou a gestão dos recursos hídricos, no País – também contribuiu para que a Engenharia Hídrica ganhasse importância “para formar profissionais com a capacidade de atuar, não somente nos aspectos técnicos de hidráulica e hidrologia, mas, sobretudo, na compreensão social, econômica e biológica que integram os fatores determinantes na distribuição da quantidade e qualidade da água”. O agravamento da crise hídrica no Brasil e no mundo desperta o aumento de interesse pelos temas relacionados à água no Brasil, analisa o docente.

 

O primeiro curso da modalidade foi criado pela Universidade Federal de Itajubá (Unifei), em Minas Gerais, em 1997, mesmo ano da promulgação da PNRH. Na sequência, em 2009, a graduação é criada na UFPel, e, em 2012, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

 

Lobo faz questão de ensinar uma distinção importante: “A palavra hídrica significa “aquilo que se relaciona à água”; já hidráulica se refere aos caminhos por onde a água passa. Daí a escolha do nome: engenharia da água ou engenharia hídrica.

 

A engenharia no tempo
Coordenador da mesma modalidade na UFRGS, até o dia 14 de fevereiro último, período desta entrevista, o docente Walter Collischonn faz uma abordagem histórica para mostrar a evolução da engenharia até os nossos dias e como surge a necessidade de novas modalidades. “Se no século XIX, basicamente existiam apenas as engenharias civil e militar; a crescente industrialização das economias criaram outras modalidades, como a mecânica e elétrica. Já a necessidade da especialização de certos aspectos da indústria metalmecânica estimulou a criação da engenharia metalúrgica. Nas últimas décadas, foram criados os cursos de engenharia de alimentos e ambiental”, relaciona.

 

Por isso, acrescenta o professor da UFRGS, num cenário em que crescem as demandas pela água e surgem cada vez mais conflitos relacionados aos usos desse insumo, “é natural que sejam criados cursos específicos, como a hídrica”. A profissão é importante, exemplifica ele, para saber se a extração de água subterrânea em uma região é sustentável, ou se vai faltar água daqui a 30 anos nessa região, para “evitar um conflito entre a geração atual e a futura”. 

 

As duas universidades, coincidentemente, são sul-rio-grandenses, estado que possui uma importância muito grande na agropecuária, principalmente de plantações irrigadas como o arroz, que dependem muito da disponibilidade hídrica. Setores, como diz Lobo, que vêm sofrendo com as alterações climáticas e eventos extremos de secas e inundações. “Além disso, se encontra no estado duas das maiores lagoas do Brasil, dos Patos e Mirim. A primeira, conecta a capital [Porto Alegre] com o sul do estado e o porto de Rio Grande e é destino de grande atividade turística e atividade pesqueira no estado. A segunda, a Mirim, faz fronteira com o Uruguai e também tem uma grande importância regional, na pesca, abastecimento público (cidades de Rio Grande e Pelotas) e, atualmente, uma hidrovia binacional entre Brasil e Uruguai está sendo planejada”, explica o professor da UFPel.

 

O que faz e campos de atuação
O profissional da área trabalha na elaboração de projetos, na supervisão e na operação de obras hidráulicas, em seus aspectos técnicos, sociais e ambientais, dentro dos padrões de qualidade estabelecidos pela legislação pertinente. O professor da UFRGS relaciona como tais atividades podem ser desenvolvidas: “Numa empresa de saneamento ambiental, ou num projeto de irrigação [na área rural]. Em empresas de geração de eletricidade, atuando no setor da operação dos aproveitamentos hidrelétricos.”

 

Collischonn observa, ainda, que é uma profissão que pode estar em órgãos do governo voltados à gestão dos recursos hídricos, analisando outorgas ou licenças para o uso da água, no monitoramento das variáveis relevantes no setor, como vazão dos rios e chuva, que não são tão fáceis de medir de forma apropriada. “Outra área de trabalho que se torna relevante com as notícias veiculadas agora mesmo na imprensa é o controle de enchentes e inundações, e a gestão da drenagem em áreas urbanas”, observa.

 

Lobo reforça os campos de atuação em sistemas hídricos, notadamente nas questões de quantidade e qualidade da água, caracterização da demanda, intervenções naturais e interação entre sistemas hídricos, sejam eles naturais ou artificiais. “Vamos perceber a importância da profissão em circuitos de sistemas hidráulicos urbanos, rurais, de energia, de transporte e de lazer, com vistas à interação entre estruturas civis e máquinas e equipamentos hidromecânicos”, complementa.

 

Ambientes de atuação
Em órgãos públicos ou empresas responsáveis por obras de infraestrutura hidráulica, de saneamento ou ambientais; empresas de projeto e construção de máquinas e equipamentos hidráulicos; em empresas e unidades produtoras de hidroenergia; empresas de monitoramento, uso, planejamento e gestão de recursos hídricos artificiais e naturais; em empresas e laboratórios de pesquisa científica e tecnológica.

 

Habilidades técnicas e comportamentais
Walter Collischonn Walter Collischonn, professor e ex-coordenador do curso da UFRGS. Crédito: Acervo pessoal.As habilidades do campo comportamental são abordadas diretamente, segundo Collischonn, já no primeiro semestre do curso, “temos uma disciplina de Antropologia, onde se discute cultura, diversidade, alteridade, etnocentrismo, relativismo cultural”. Em diversas outras disciplinas, completa o docente da UFRGS, os alunos têm oportunidade “de treinar habilidades de comunicação oral e escrita e de trabalho em equipe, recebendo feedback por parte de colegas e professores, através da realização de atividades de grupo, como trabalhos técnicos e saídas de campo”.

 

Na UFPel, diz Lobo, o curso prima também em desenvolver habilidades de comunicação nos futuros profissionais, nas formas escrita e oral, “pois sabemos que elas são fundamentais para qualquer profissional hoje em dia”. Em sua percepção, como coordenador do curso, essas competências comportamentais precisam ser melhores trabalhadas, por isso, informa, “trabalhamos e incentivamos bastante a apresentação de trabalhos de forma oral em público”.

 

A profissão e as tecnologias
Conforme esclarece Collischonn, um dos aspectos fundamentais da Engenharia Hídrica é que, muitas vezes, “ela lida com sistemas naturais [rios, estuários, lagos, bacias hidrográficas] sobre os quais não temos um controle total no tempo e no espaço”. O docente da instituição federal observa que a tecnologia da informação, nesses momentos, facilita muito o monitoramento dos sistemas naturais, por meio de diversas formas, atesta. Ele expõe: “Em primeiro lugar, os instrumentos de medição estão se tornando mais baratos, ou mais potentes, e mais capazes de comunicar rapidamente suas informações.”

 

O exemplo mais importante, avalia Collischonn, é o monitoramento por sensoriamento remoto [por satélite]. “Estamos vivendo uma revolução com a perspectiva bastante concreta de que seja possível medir variáveis como o nível da água de um rio, ou o volume de água armazenado em um reservatório, em um local completamente desabitado, sem sensores ou medidores locais”, diz. Outro aspecto importante destacado pelo docente para mostrar a conexão entre a profissão e as inovações tecnológicas é a grande quantidade de dados geográficos, como mapas de relevo. “A tecnologia da informação tem revolucionado a forma como se trabalha com essas grandes massas de dados e como se comunica os resultados de estudos e projetos para a população”, arremata.

 

Lobo endossa essa interface, falando da utilização das geotecnologias – imagens de satélites, drones etc. – para a gestão territorial e hídrica. “Além disso, temos o aperfeiçoamento da modelagem hidrológica com métodos computacionais avançados para aprimorar as estimativas de seca e enchentes nas bacias hidrográficas”, completa o professor da UFPel.

 

Raio-X da Engenharia hídrica

Objetivos - O Curso de Engenharia Hídrica deverá preparar profissionais de formação técnica, científica e humanística, compatível com a realidade global em seus aspectos econômicos, sociais e culturais, com capacidade para, em contínuo desenvolvimento profissional, tomar decisões, empreender com competência e atuar interdisciplinarmente no uso, monitoramento, diagnóstico e gestão do recurso água.

Perfil do egresso - Profissional apto a atuar em todos os aspectos referentes ao uso e gestão do recurso “água”, incluindo seus aspectos técnicos, sociais e ambientais. É um profissional qualificado para avaliar, quantificar, projetar, montar, construir, fiscalizar e gerenciar serviços nas seguintes áreas: Recursos hídricos: obras portuárias, processos litorâneos, hidrologia, hidrogeologia, prospecção e exploração de águas subterrâneas, saneamento (tratamento de água e esgoto), irrigação, drenagem, hidrovias, hidráulica fluvial e sistemas associados, operação de reservatórios; Sistemas e circuitos hidráulicos: estudos, projeto, instalação, operação e fiscalização de circuitos de sistemas hidráulicos industriais, urbanos, rurais, de energia, de transporte e de lazer; Sistemas de informações hidrológicas: hidrometria, topo-batimetria, sistemas de informações geográficas, geoprocessamento, coleta de dados geográficos, instrumentação, hidrometeorologia; Gestão de recursos hídricos: planejamento e regulação de recursos hídricos, balanço hídrico, a valoração das águas e dos recursos naturais, operação de reservatórios, gerenciamento de bacias hidrográficas, monitoramento de qualidade da água e do meio ambiente (controle de contaminação de rios, lagos e reservatórios).

Carga mínima do curso – 3.600 horas

Estágio – Obrigatório (Lei 11.788/2008)

Competências e habilidades - Na formação deverá ser considerado como fundamentais a criação e o desenvolvimento das seguintes habilidades e competências gerais, essenciais para assegurar ao egresso, autonomia intelectual, capacidade de aprendizagem continuada, atuação ética e sintonia com as necessidades do País: Conduta pautada pela ética e preocupação com as questões sociais e ambientais; Capacidade de atuar de forma crítica, autônoma e criativa; Atuação propositiva na busca de soluções para as questões apresentadas pela sociedade; Capacidade de comunicação e expressão; Capacidade de diagnosticar, analisar e contextualizar problemas; Busca de constante aprimoramento científico e técnico a partir da capacidade de articular elementos empíricos e conceituais inerentes ao conhecimento; Domínio de técnicas essenciais à produção e aplicação do conhecimento; Flexibilidade na busca de soluções e na condução de atividades; Trabalho integrado e contributivo em equipes transdisciplinares.

Grade curricular – Cálculo 1; Química Geral; Álgebra Linear e Geometria Analítica; Geologia Geral Aplicada a EH; Geometria Descritiva; Fundamentos de Biologia; Tutoria Acadêmica I; Física Básica I; Cálculo 2; Desenho Técnico; Ciência do Solo I; Ecologia e Impacto ambiental; Ciência, Tecnologia e Sociedade; Química Analítica Tutoria Acadêmica II; Cálculo 3; Física Básica II; Ciência do Solo II; Mecânica Aplicada I; Cidadania, Ética e Responsabilidade Social; Climatologia; Física Básica III; Hidrologia; Mecânica dos Fluidos; Estatística Básica; Resistência dos Materiais; Leitura e Produção Textual; Gráfica Computacional; Materiais de Construção; Mecânica dos Solos; Hidráulica de Superfície Livre; Termodinâmica I; Hidroquímica; Elementos de Engenharia Cartográfica; Métodos Estatísticos Aplicados a Recursos Hídricos; Eletrotécnica; Hidrogeologia; Hidráulica de Condutos Forçados; Limnologia; Direito Ambiental e dos Recursos Hídricos; Ergonomia e Segurança do Trabalho; Geotecnologias Aplicadas a Recursos Hídricos; Instrumentação e Processamento de Sinais; Irrigação e Drenagem; Sistemas de Abastecimento e Tratamento de Água; Oceanografia Física, Costeira e Estuarina; Hidrometria; Hidrologia Aplicada; Drenagem Urbana; Manejo de Bacias Hidrográficas; Obras Hidráulicas; Hidrossedimentologia; Sistema de Tratamento de Efluentes; Administração e Empreendedorismo; Tutoria Acadêmico-Profissional; Trabalho Final de Graduação I; Economia dos Recursos Hídricos e Tomada de Decisão; Portos e Hidrovias; Gestão de Sistemas Hídricos; Aproveitamentos Hidroenergéticos.

Fonte: UFPel

 

 

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