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01/07/2021

Relações do trabalho, digitalização e automação: impactos e desafios

 

Soraya Misleh/Comunicação SEESP

 

Nesta quarta-feira (30/6) o SEESP realizou o webinar “Relações de trabalho: automação, digitalização e seus impactos nos arranjos produtivos”. Sob a coordenação de Renato Becker, diretor do sindicato, o tema foi abordado por especialistas na área. Uma das conclusões apontadas por eles é que o País precisa de uma política nacional de desenvolvimento tecnológico.

 

Ao encontro disso, à abertura, Murilo Pinheiro, presidente do SEESP, enfatizou que a entidade tem realizado eventos como esse de modo a contribuir com questões de interesse da sociedade e interferir positivamente. Sergio Amadeu, professor da Universidade Federal do ABC (UFABC), inaugurou sua preleção ressaltando “o peso decisivo do sindicato na formulação de políticas públicas”, sobretudo no momento atual.

 

Segundo ele, embora não haja dúvidas de que “a confluência de tecnologias – da impressão 3D com a internet das coisas (IoT), da robótica com a neurociência, da inteligência artificial (IA) com a biologia sintética – poderá trazer serviços superiores aos que temos hoje, não há indícios que essa chamada quarta revolução industrial altere a tendência de concentração econômica e precarização do trabalho”.

 

Defensor e divulgador do software livre e da inclusão digital no Brasil, Amadeu, que foi presidente do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação, leu trecho de documento do Banco Mundial do ano de 2018 conforme o qual a “economia digital se tornou mais intensiva e até mesmo os setores tradicionais, como petróleo ou gás ou serviços financeiros, estão se tornando orientados por dados”.

 

Em 2017, ainda de acordo com o especialista, relatório Visual Networking Index, da Cisco, estimava que o volume gigantesco do tráfego global da internet: em 2020 alcançaria cerca de 200 exabytes por mês – 127 vezes o volume registrado em 2005 –, “com grande parte do crescimento vindo de vídeo e smartphones”.

 

Webinar aponta necessidade de o País ter uma política nacional de desenvolvimento tecnológico. Reprodução Youtube

 

Ele complementou: “O McKinsey Global Institute estima que os fluxos de dados fronteiriços, em 2014, valiam cerca de US 2,8 trilhões, um aumento de 45 vezes desde 2005”, apontou. E ressaltou que a partir da segunda década do século XXI, iniciou-se "uma conversão para um capitalismo digital baseado ou dirigido por dados”. 

 

Ao encontro dessa afirmação, o professor da UFABC trouxe ainda trecho do documento do Banco Mundial que mostra que “as empresas estão dispostas a pagar quantias cada vez maiores por nossa atenção em sites de mídia social e para explorar os dados que produzimos”. Outro grave problema, como informou, é que “o governo federal brasileiro tem transferido dados de servidores públicos para a IBM dos Estados Unidos”.

 

Para Amadeu, esse modelo de negócios, combinado com o ordenamento neoliberal e baseado na coleta, armazenamento e tratamento de dados em larga escala, não é sustentável. Na sua ótica, é preciso romper com o que chamou de “dataísmo e alienação técnica”. Além disso, entre outros pontos, propugnou por se “regular a atividade econômica e algorítmica das plataformas, utilizar o poder de compra do Estado para criar soluções de IA que fortaleçam nossa inteligência coletiva, proteger os dados pessoais e restringir o fluxo internacional”. Ao que, sublinhou, é necessário esforço social mais amplo.

 

 

Democratização tecnológica

 

Professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli/USP) e coordenador do grupo Meios Eletrônicos Interativos (MEI) do Laboratório de Sistemas Integráveis (LSI) da instituição, Marcelo Knorich Zuffo relatou: “São quase 1 trilhão de máquinas no mundo hoje. Li uma vez um livro de ficção científica sobre um grande cataclisma global, que poderia ser por exemplo a pandemia, em que algumas corporações passam a ser maiores do que países e competir com as nações pelos recursos do planeta. Isso está acontecendo hoje. Algumas corporações rivalizam com países em termos de PIB, poder econômico e informacional. Quem tem tecnologia detém o poder.” Não obstante, na sua ótica, crescimentos exponenciais como o que se vivencia atualmente historicamente têm rupturas. “É tudo muito efêmero e frágil.”

 

Acreditando na democratização tecnológica e afirmando que sua “militância vai nessa direção”, fez um chamado aos engenheiros: “arregaçar as mangas para reverter esse quadro e fazer tecnologia no Brasil”. E trouxe uma solução para a enorme concentração digital: “Plataformas abertas e livres." Para tanto, foi categórico: "Precisamos da ajuda da sociedade para isso, ao que temos que traduzir para as pessoas comuns essas tecnologias. Temos que deixar claro o potencial disso. Necessitamos de fóruns como esse para ampliar a discussão.”

 

Como exemplo do que ocorre e precisa ser transformado, citou o desenvolvimento de vacinas contra a Covid-19, através de tecnologias fechadas. “É falta de ética quando interesses combinados se sobrepõem ao público.”

 

Nessa direção, Zuffo revelou: “Não estamos fazendo IA na USP para reconhecimento facial. Não precisamos invadir a privacidade individual para combater a criminalidade ou fazer mobilidade urbana. Estamos buscando outras formas de inteligência artificial.” E concluiu: “A questão é como nós, engenheiros, direcionamos isso para o bem-estar e uma humanidade melhor.”

 

 

Desindustrialização e trabalho

 

Já Nunziante Graziano, sócio-diretor da Gimi Pogliano Blindosbarra Barramentos Blindados, focou dois pontos: como a digitalização interfere no mercado de trabalho e no processo de desindustrialização.

 

Na sua concepção, essa “quarta revolução industrial” – Indústria 4.0 –, que traz mudança disruptiva, com total conectividade, tem aspectos positivos, mas também traz desafios. No primeiro caso, enxerga que nas instalações elétricas industriais os servidores de redes foram muito simplificados, com sensores detectando a necessidade de manutenção ponto a ponto. Desse modo, o trabalhador acompanha tudo em tempo real, a distância, de um computador, através de um software: “corrente, tensão, temperatura, frequência, vida útil, qualidade, distribuição da energia e tudo o mais”. Assim, a engenharia implementada no sistema garante mais segurança na execução da atividade. “Não é preciso se expor ao risco e é possível corrigir um problema preventivamente.”

 

Por outro lado, observou: “A evolução tecnológica é muito mais veloz do que a das relações do trabalho.” Nesse sentido, trouxe uma série de questões a serem respondidas, como quanto à existência de legislação trabalhista adequada e perda ou migração de postos por exemplo com adoção de IA.

 

Também alertou para o enorme processo de desindustrialização nacional. “Não estamos produzindo tecnologia porque não damos educação ao povo.” Amadeu acredita que, nesse sentido, é preciso ir além. Romper com o modelo neoliberal de Estado mínimo, rumo a uma política nacional de desenvolvimento tecnológico

 

Zuffo finalizou: “É o momento de fazer a opção aqui. No plano nacional de transformação digital de 2018, a grande ausência são nossos institutos de pesquisa e universidades. Se investirmos em projetos específicos, em menos de cinco anos teremos política pública de ponta em várias questões. O programa de busca avançada do Google foi desenvolvido por uma empresa incubada na UFMG [Universidade Federal de Minas Gerais]. Estamos, contudo, perdendo cérebros porque falta política de desenvolvimento tecnológico. O sindicato tem papel fundamental para que esta política exista.”

 

Confira a apresentação: 

"Dados como ativo econômico e a plataformização" - Professor Sergio Amadeu

 

Assista o webinar na íntegra:

 

 

 

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