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12/03/2021

O ensino da engenharia e as mulheres na profissão

 

Soraya Misleh/Comunicação SEESP

 

Como parte das atividades da semana em comemoração ao Dia Internacional da Mulher, o SEESP promoveu nesta quinta-feira (11/3) ­ o webinar “O ensino da engenharia e as mulheres na profissão”, uma discussão sobre como ampliar a participação feminina nos cursos das diversas modalidades e no mercado de trabalho de forma qualitativa. A atividade foi coordenada por Silvana Guarnieri, diretora da Delegacia Sindical do SEESP no Grande ABC.

 

Murilo Pinheiro, presidente da entidade, saudou a iniciativa, destacando a importância de o sindicato realizar esse evento. Ele frisou: “Este webinar é das mulheres da nossa profissão. Parabéns pelo trabalho que realizam.”

 

 

Inaugurando o debate, Roseli de Deus Lopes, diretora da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e professora associada da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), enfatizou o avanço significativo na participação das mulheres na profissão, não obstante o ainda longo caminho a percorrer, marcado pelo machismo, violência de gênero e contra minorias.

 

Na própria Poli-USP, afirmou, houve uma conquista muito importante. Segundo contou, quando entrou na universidade, na sua turma de engenharia eletrônica, eram apenas cinco jovens ante 90 homens. “A primeira vez que entrei no sanitário feminino vi um mictório. Haviam dividido um banheiro masculino e pensaram que aquilo não nos incomodaria ou que ficaríamos pouco tempo na escola.”

 

Hoje a situação mudou: “Em 128 anos é a primeira vez que uma mulher [Liedi Bernucci] está na direção, isso abriu um canal de comunicação com as meninas. E o grêmio tem uma presidente, além de participação feminina expressiva.”

 

 

Mais diversidade

 

A despeito disso, como informou, as mulheres são ainda apenas 20% dos alunos ingressantes na graduação. “É um número muito pequeno. Em alguns anos e modalidades da engenharia não se tem nenhuma. ”

 

Para dar o salto necessário, Lopes acredita que “precisamos de um processo civilizatório e conseguir, cada vez mais, com evidências científicas, mostrar como a diversidade é um valor. O reconhecimento dessa necessidade está nos processos seletivos”.

 

Idealizadora da Feira Brasileira de Ciências e Engenharia (Febrace), ela considera fundamental, nessa direção, investir fortemente na educação básica, na formação de professores e também na conscientização das famílias. Isso porque, como observou, o sistema de ensino desde cedo incute a ideia de que há profissões que são para homens e outras para mulheres. E em casa isso também se dá, “quando se escolhe brinquedo para menino ou menina”.

 

mulheres editada capaDa esq. para a dir., Maria Rosa Lombardi e Silvana Guarnieri (acima); Roseli Lopes e Nilene Seixas (abaixo). / Reprodução Youtube

 

Na ótica da professora e pesquisadora sênior do Departamento de Pesquisas Educacionais da Fundação Carlos Chagas, Maria Rosa Lombardi, é preciso questionar o porquê de “ainda nos sentirmos incapazes de enfrentar um curso tão difícil como a engenharia”. Ela sinalizou: “Muitas famílias não acreditam na capacidade de suas meninas chegarem lá, apesar de as coisas terem mudado muito. Há décadas fazemos um trabalho de formiga junto ao ensino médio e fundamental. para mostrar o contrário. Esse sentimento de incapacidade é o que muitas vezes impede a menina de dar um salto rumo ao seu sonho.”

 

A própria cidade, acrescentou Lopes, é construída dentro dessa visão de que “mulher é para ficar em casa cuidando de crianças e idosos e homem é para trabalhar”, quando a responsabilidade deve ser compartilhada. “Ter filhos e investir na carreira não são incompatíveis se houver distribuição igualitária [de tarefas]”, continuou.

 

 

Marcadores de gênero

 

Nilene Seixas, coordenadora dos cursos de Engenharia Civil e de Engenharia Básica da Universidade Santa Cecília (Unisanta), frisou a paixão pela profissão que abraçou e trouxe um dado positivo: “Trabalho também na Etec [Escola Técnica Estadual] há 23 anos, em edificações. Na sala de aula hoje a presença feminina é de 50%. Na nossa região [da Baixada Santista] temos mulheres tomando conta de algumas obras, isso não existia em 1996. Acredito que estamos alcançando posições de destaque e que as mulheres são mais ousadas.”

 

Ao encontro disso, Seixas tornou-se a primeira ocupar os cargos de coordenação na Unisanta, há 14 anos. Embora sua visão seja otimista, ela – que é mãe de gêmeos nascidos em 2008 – reconhece: “É difícil ser mulher neste país, vivemos o machismo. A família continua achando que você é a dona da casa, essa questão da divisão [de tarefas] é muito importante.” E a pandemia, como aponta Lombardi, intensificou o problema das múltiplas jornadas diárias para as mulheres.

 

A pesquisadora da Fundação Carlos Chagas lembrou que a maternidade, “nesse combo de discriminação, é um dos marcadores de gênero”: “Quando a mulher fica grávida, e isso vale para todas as carreiras, embora nas engenharias seja mais marcado, tem-se preconceito com a possibilidade futura de ela deixar a obra. Nos canteiros, as meninas consequentemente tentam voltar o mais rápido possível, nem tiram licença-maternidade. Têm que provar sempre que são capazes e vão ficar sem usufruir de um direito, porque o enxergam como um empecilho. Isso está introjetado.”

 

Conforme Lombardi, há barreiras reais que “muitas vezes têm impactado a própria decisão de uma mulher permanecer na área”. A pesquisadora detalhou: “Muitas empresas preferem homens, dependendo da modalidade da engenharia isso é muito comum. E o salário é sempre menor para elas, assim como as chances de ascensão. Isso faz com que não haja número maior de mulheres.”

 

Lombardi trouxe dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Pnad/IBGE) relativa ao primeiro trimestre de 2020 que demonstram: são apenas 19% do conjunto do emprego formal e informal no País.

 

“Parece que sempre que são contratadas isso acontece com ressalvas. É questão de gênero, discriminação cultural. Esse é o grande nó”, vaticinou. As palestrantes ressaltaram a importância da conscientização para transformar essa realidade. Lopes foi categórica: “Lugar de menina é onde ela quiser, inclusive na engenharia.”

 

Por fim, a professora da Poli-USP sublinhou: “Queremos posição de destaque não porque somos mulheres, mas porque somos competentes. Assim, também não queremos ser rebaixadas porque somos mulheres”, lembrando ainda que as negras enfrentam dificuldades ainda muito mais severas.

 

“Para mudar isso, o primeiro passo é entender que temos um problema de modo a implementar algumas soluções transitórias rumo à equilíbrio maior e caminhar para a igualdade”, concluiu. Guarnieri concordou e revelou a esperança nas novas gerações “para que continuem essa luta”.

 

 

Leia aqui o relatório técnico “Engenharia, trabalho e relações de gênero na construção de habitações”, publicado em 2019, coordenado por Maria Rosa Lombardi.

 

 

Confira o webinar na íntegra:

 

 

 

 

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