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01/07/2011

Dos oceanos à Rio+20: a hora é agora!

 

O grito dos cientistas pelos oceanos é mais um (cada vez mais dramático e mais urgente) dos alertas que a ciência vem fazendo nos últimos anos sobre a concentração de gases-estufa na atmosfera.

        Na semana passada, um grupo internacional de cientistas marinhos soltou um estudo com uma notícia-bomba: os oceanos correm alto risco de entrar em uma fase de extinção de espécies sem precedentes na história da humanidade. A velocidade e a taxa das perdas são muito mais rápidas do que qualquer previsão e muitos dos impactos negativos já identificados, maiores do que qualquer estimativa feita antes.

        Os especialistas analisaram o que chamam de "efeitos perturbadores do carbono" sobre os mares. Estudaram o impacto cumulativo do que pressiona a vida nos oceanos - poluição, pesca predatória, acidificação, aquecimento global e falta de oxigênio na água (provocada pela ação de bactérias que decompõem material orgânico). Os três últimos têm carbono como base, o "trio mortal" na definição dos peritos do IPSO, um consórcio de cientistas que também reúne advogados, pessoas de comunicação e da arena política. Alex Rogers, diretor científico do IPSO, disse que "as descobertas são chocantes". O efeito do que a humanidade está fazendo nos oceanos, somando todos esses fatores de estresse, tem um impacto assustador. "Essa é uma situação muito grave que exige uma ação inequívoca em todos os níveis", pediu Rogers. Cortes radicais nas emissões de gases-estufa são urgentes. "Temos uma janela de oportunidade estreita para prevenir o declínio e o colapso do sistema oceânico da Terra."

        O grito dos cientistas pelos oceanos é mais um (cada vez mais dramático e mais urgente) dos alertas que a ciência vem fazendo nos últimos anos sobre a concentração de gases-estufa na atmosfera. Mas parece que não adianta os cientistas gritarem em megafones que algo tem que ser feito, e rápido. As negociações pelo acordo climático internacional estão travadas. Na última reunião em Bonn, este mês, a agenda ficou dias bloqueada pela Arábia Saudita, que quer ser compensada pelas perdas que terá, no futuro, com a venda de petróleo. Na conferência do clima em Cancún, em dezembro, esse tipo de compensação foi finalmente separado do tópico de adaptação. Ou seja, quem precisa de recursos e tecnologia para defender-se de encostas que deslizam, enchentes e secas, geralmente gente que vive nos lugares mais pobres da Terra, não pode ficar na mesma rubrica dos que perderão porque o petróleo vai ficar, talvez, proibitivo. A Arábia Saudita não gostou e travou o processo para Durban, na África do Sul, onde acontecerá a reunião do clima deste ano. Soa como puro non sense - ou alguém acredita que algum país do mundo irá pagar um centavo que seja para compensar as perdas dos produtores de petróleo diante das mudanças econômicas necessárias para enfrentar o aquecimento da Terra? Mas é assim, basta um país se sentir prejudicado nos debates das Nações Unidas, para que a coisa toda desande.

        Essa maluquice (e outras) pode se repetir em Durban. Há, por exemplo, uma selva de siglas para designar padrões para as emissões de gases-estufa e a eficácia das medidas para reduzi-las - uma delas é para os países ricos que estão sob o regime do Protocolo de Kyoto, a outra quer englobar emergentes como China, Brasil e Índia, há uma específica para incluir os Estados Unidos nesse baile. Reunidos em Bonn, os países se digladiaram novamente sobre esse ponto, mas trata-se de uma discussão lateral. O que adianta discutir como medir cortes de emissões se não há acordo sobre o tamanho dessas reduções, quanto significam, e quem corta o quê? As grandes travas das negociações do clima são as de sempre: o agonizante protocolo de Kyoto de um lado, o dinheiro que nunca vem do outro, as eleições americanas de 2012. O mundo todo espera, agora, de novo, para ver o que acontece com a agenda climática nos Estados Unidos, se ela subirá ou não na pauta das prioridades do país que disputa com a China o posto dos maiores emissores de gases-estufa do mundo. É um déjà vu dos grandes.

        Em Bonn, a delegação brasileira chefiada pelo embaixador Andre Corrêa do Lago deixou claro que as negociações não avançarão se a União Europeia não concordar com um segundo período de cumprimento do Protocolo de Kyoto, para depois de 2012. Ou seja: com novas metas de cortes a partir de 2013. Mesmo se Kyoto tem resultado pífio para o tamanho do problema, é a única arquitetura climática que o mundo tem hoje. "Se a União Europeia concordar com um segundo período de compromissos, isso pode permitir que nações em desenvolvimento façam planos mais ambiciosos também", avalia Mark Luttes, coordenador das políticas de clima do WWF. "Isso pode destravar o processo."

        Nessa arena complexa, o Brasil continua como negociador top, mesmo se os sinais que o país esteja lançando ao mundo sejam os mais ambíguos possíveis. O Brasil é o país do etanol, do protagonismo em metas para reduzir gases-estufa, do esforço em conter o desmatamento, mas também é o país que aprova uma versão do Código Florestal na Câmara que permitirá que se jogue mais floresta e cerrado ao chão, mesmo se entidades do agronegócio tentem convencer alguém do contrário. O forte aumento do desmatamento nos últimos meses está na conta das usinas de Santo Antônio, Jirau e Belo Monte e do preço da soja no mercado mundial, mas muito em função da discussão do Código Florestal. Foi um primeiro semestre ruim em termos de avanços brasileiros na questão climática. Até na esfera institucional a coisa andou mal. A Comissão Interministerial sobre Mudanças Climáticas, coordenada pela Casa Civil, sofreu com a queda do ex-ministro Antonio Palocci. A paralisia do governo deixou tudo parado até o fim de abril.

        Richard Black, um dos jornalistas ambientais mais famosos do mundo, da BBC, deu em primeira mão a triste notícia sobre o estudo do IPSO e a vida nos mares. Ele também escreveu sobre a Rio+20 e diz que a conferência da ONU que vai acontecer no Rio, em 2012, "poderia ser a cúpula mais importante" de todos os tempos. Black argumenta que em todas as áreas, do derretimento de geleiras à seca na Amazônia, da extinção de anfíbios à polinização, há uma forte chance de que pontos de não retorno na degradação sejam ultrapassados por volta de 2030. Sobre a Rio+20, ele conclui: "Se há vontade genuína de parar com tudo isso e colocar a sociedade verdadeiramente em uma rota de sustentabilidade, esta é a hora."

 

(Daniela Chiaretti, Valor Econômico)
www.fne.org.br

 

 

 

 

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