DISCIPLINAR O USO DO SUBSOLO É 
META EM MUNÍCIPIOS PAULISTAS

A implantação de sistemas de transmissão de dados e sinais por empresas privadas que utilizam, para tanto, o espaço público vem sendo objeto de debate em todo o País. "É um negócio bilionário envolvendo as companhias de TV a cabo, Internet, telecomunicações, eletricidade, fibra óptica e cabos coaxiais, que usam o solo ou subsolo em áreas pertencentes à União, aos estados e municípios. O Governo não pode deixar que grupos privados explorem esses serviços tendo lucros fantásticos sem pagar por isso", considerou o deputado estadual Nivaldo Santana (PCdoB). Especificamente em Campinas, a discussão sobre disciplinar essa questão está bastante presente. Alguns argumentam que seria necessário haver licitação para a utilização do subsolo. A advogada da Secretaria de Obras do município, Andréa Cristina de Oliveira Struchel, não concorda. Na sua concepção, isso resultaria em monopólio à empresa permissionária. "Não pode existir privilégios, tem que haver critérios técnicos, mas não negar o uso a quem se adequar às exigências."

Quanto à necessidade de regras claras, ninguém se opõe. Na capital paulista, alguns candidatos à Prefeitura já sinalizaram a inserção desse item em seu programa de governo, contudo, nenhum deles forneceu à reportagem do Jornal do Engenheiro informações sobre suas propostas acerca do tema. Para Nivaldo Santana, no Estado de São Paulo há um vazio legal nesse sentido. Visando dar sua contribuição, ele apresentou o projeto de lei nº 342/96. "O objetivo era garantir que as empresas públicas de energia elétrica tivessem uma receita adicional para a exploração desse tipo de serviço, via participação acionária. Com a privatização, infelizmente, o papel do Estado no setor ficou reduzido, uma vez que não constou no edital de licitação e nos contratos de concessão. Portanto, é preciso atualizar o projeto." No âmbito municipal, algumas cidades estão procurando regulamentar a questão. Em Campinas, foi elaborado pelos vereadores Antonio Rafful e Sérgio Benassi o projeto de lei nº 160/2000, em vias de ser sancionado. Nele está prevista a cobrança do uso do solo, subsolo e espaço aéreo por entidades de direito público e privado, através de fórmula básica elaborada por técnicos da Secretaria de Obras e baseada no Plano Diretor do município, no Código de Valores Mobiliários local. "Uma empresa de fibra óptica que passa pela Rua Francisco Glicério, a Avenida Paulista de Campinas, não pode ser onerada igual a uma que passa pela periferia", acredita Andréa.


Empresas contestam

Na capital paulista, o uso do subsolo vem sendo taxado desde o segundo semestre do ano passado, conforme determina o decreto nº 38.139, de 1º de julho de 1999. E segundo a Secretaria Municipal de Finanças, já arrecadou aos cofres municipais um montante de R$ 271.315,20 no ano passado, desde a sua implantação, e de R$ 849.375,81 até 31 de maio último. Aqui, também há diferenciação nos preços cobrados de acordo com a localização e essa tem sido objeto de reclamação por parte de algumas empresas, como a Eletropaulo. "A metodologia é muito complicada, tem que pegar o Mapa Oficial da Cidade em que o preço do metro quadrado varia às vezes de uma quadra a outra", observou o supervisor de Planejamento do Sistema Elétrico da companhia, Carlos Eduardo de Campos. Embora concorde com a necessidade de regular o uso do solo, na sua concepção, não precisaria torná-lo oneroso para tanto. "Disciplinar é colocar cada serviço em um patamar, em determinada faixa de profundidade", complementou. A assessoria de imprensa do Convias (Departamento de Controle de Uso de Vias Públicas), órgão municipal ligado à Secretaria de Vias Públicas, informou já haver essa separação: "Em uma área, o espaço é reservado à Sabesp e à Eletropaulo em ordem lógica. O uso tem de ser organizado prioritariamente para dar vazão à necessidade básica da população – água, eletricidade e depois outras facções." A Eletropaulo está contestando na justiça a cobrança, alegando que não estava prevista no contrato de concessão, o qual permite, nesses casos, o repasse ao usuário do serviço. "Mais uma vez, o consumidor pagará a conta", reconheceu Sérgio Ezequiel Teixeira, representante da CEC (Comissão de Entendimento entre as Concessionárias de Energia Elétrica). O gerente de Engenharia e Planejamento da Comgás, Donizetti Schultz, por sua vez, assegurou que tal companhia está efetuando o pagamento, porém admite que esse custo acaba sendo transferido à população. A Telefônica não quis se pronunciar sobre o assunto e o Metrô está isento da contribuição pecuniária, tendo em vista o coeficiente de localização estabelecido no decreto.

A principal queixa das empresas, contudo, não é o fato de a exploração do subsolo agora ter um preço. "Prejudicou-nos muito a questão do período estipulado no decreto para análise pela Prefeitura dos projetos apresentados, antes bem mais ágil. Hoje, estamos levando em média 50 a 60 dias só para a aprovação", lamentou Schultz. "O prazo está impactando bastante no desenvolvimento do nosso trabalho", confirmou Teixeira. Campos acrescentou: "Às vezes, o projeto elaborado tem que ser alterado, em função das interferências existentes. É preciso pedir nova autorização para determinado trecho e corre-se o risco de sua aprovação demorar mais 60 dias." Na sua visão, o atraso ocasionado pode comprometer a data de execução de obra necessária ao atendimento da população. Segundo a assessoria de imprensa do Convias, isso só ocorre se houver algum problema, como a empresa não apresentar a documentação exigida.


"Pagando o pato"
Mudam-se as regras, mas a história se repete. Novamente, o consumidor "paga o pato". Além de ter de esperar pela instalação de serviço essencial e ver sua conta mais cara, enquanto as empresas continuam obtendo, conforme lembrou o deputado Nivaldo Santana, "um lucro potencialmente alto", eventualmente os cidadãos são obrigados a conviver com problemas que afetam o seu dia-a-dia. "Vamos supor que a Sabesp vá trocar uma adutora, ela consulta a Telesp, a Eletropaulo Metropolitana e essas fornecem um cadastro das suas linhas e cabos e se necessário, encaminham um técnico ao local para apontar a existência das chamadas interferências. Todavia, essas companhias terceirizam o serviço, e não há garantia de que as empreiteiras tenham tal conhecimento. Corre-se o risco de uma retroescavadeira cortar um cabo e deixar parte da população sem telefone ou água", salientou Robson Silva Thomaz, diretor financeiro adjunto do Sindicato dos Eletricitários de São Paulo e secretário geral adjunto da CGT (Central Geral dos Trabalhadores). No seu modo de ver, a situação se agravou com a privatização. "Basta ler os jornais para comprovar isso. Tem apagões aqui, tampa de bueiro voando no Rio de Janeiro... Nada contra o capital ganhar dinheiro, mas não podemos abrir mão do compromisso social."

Para Thomaz, socializar as informações sobre as interferências existentes é fundamental, centralizando-as para consulta geral na Secretaria de Vias Públicas. Embora esteja contemplado na Portaria nº 007 de 8 de fevereiro de 2000 o fornecimento pelas empresas ao Convias de plantas, perfis, detalhes e tabelas dos equipamentos que as permissionárias têm instalado, até o momento não há um banco de dados unificado. Cada empresa tem o mapa das suas linhas, cabos ou tubulações, e o cede às outras companhias somente mediante pedido. Dessa forma, a consulta não se torna obrigatória. E algumas procuram restringir a pesquisa, como as concessionárias de energia elétrica. Elas têm um cadastro único e atualmente o custo por planta requisitada é de R$ 10,00. "Antes, era gratuito, mas quando teve esse cabeamento de fibra óptica pela cidade, houve uma demanda muito grande. Começamos a perceber um certo abuso e para impor uma disciplina e cobrir custos internos como mão-de-obra e xerox, passamos a cobrar. Não visamos com isso lucro, nem dificultar nada", esclareceu Campos. Face à nova realidade, em Campinas, a implantação de um banco de dados é considerada pela advogada Andréa, da Secretaria de Obras da cidade, imprescindível. "A Prefeitura é muito carente de cadastros de equipamentos dispostos no município. E o projeto de lei que trata do assunto obriga as empresas a apresentarem o mapa das suas interferências. Essa é uma das preocupações, porque está havendo lotação do subsolo e tem que haver regras", ressaltou. Congestionamento não está previsto na cidade de São Paulo, pelo menos na opinião de Thomaz. Ao contrário, a CGT e o Sindicato dos Eletricitários defendem a transformação de toda a fiação aérea em subterrânea. "Há um projeto de lei do vereador Wadih Mutran (PPB) que determina um prazo de dez anos para que seja feita essa troca. É um custo elevado, mas tem uma série de vantagens, como a diminuição do risco de acidentes e o aumento da eficiência do sistema."

Para evitar contratempos ao se utilizar o subsolo, além de ter o mapeamento das interferências, que por vezes precisam ser remanejadas – isso acontece quando uma tubulação ou linha de transmissão está, por exemplo, no local onde será construída estação do metrô ao acesso à população –, é imprescindível realizar sondagens. "Esse trabalho é importante porque São Paulo é uma cidade antiga, e como essa organização do subsolo nem sempre foi adequada ou perfeita, há situações em que são encontradas algumas ligações elétricas, cabos, tubos ou canalização de água pluvial não-cadastrados nas concessionárias. Além disso, nem sempre o desenho apresentado representa exatamente o que está em campo", ensinou Sergio Eduardo Favero Salvadori, gerente de Projeto Civil do Metrô.

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