TERMOELÉTRICAS SÃO “RECONHECIMENTO DE ERRO 
COMETIDO COM A PRIVATIZAÇÃO DAS ENERGÉTICAS”

O Programa Prioritário de Termelétricas, lançado por Fernando Henrique Cardoso em 25 de fevereiro último, foi anunciado pelo Governo como a solução para se evitar uma crise energética a curto prazo. Pelos planos do Ministério de Minas e Energia, 49 usinas, na maioria a gás natural, serão construídas e em 2003 poderão gerar juntas 15 mil MW/h. Embora considerado "um passo decisivo para a total reformulação do setor elétrico brasileiro" pelo ministro Rodolpho Tourinho, o programa vem sendo criticado exatamente por contradizer a lógica de tirar do Estado o ônus dos investimentos. Isso porque há uma série de incentivos para os investidores, na maioria estrangeiros. O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) financiará 30% dos US$ 12 bilhões estimados, a Petrobrás garantirá o suprimento de gás natural por até 20 anos ao preço médio de US$ 2,26/milhão de BTU (unidade térmica) e estará assegurada a aplicação do valor normativo à distribuidora de energia elétrica.

Entre os que vêem sérios problemas na iniciativa está Luiz Pinguelli Rosa, co-autor do livro "A reforma do setor elétrico no Brasil e no mundo – uma visão crítica" e vice-diretor da Coppe (Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da UFRJ). "Isso mostra que o mercado não funcionou. Portanto, volta o Estado a assumir um papel indispensável, sem o qual não haverá energia." Contudo, apesar da urgência, Pinguelli não aprova a estratégia: "Basicamente, o Governo se comprometeu a financiar os investimentos, comprar a energia excedente e aumentar a tarifa. Pelo preço estabelecido para o gás, a energia gerada pela termelétrica custará R$ 75,00 por MW/h, acima do valor de referência da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), que é R$ 57,00, e muito mais caro que o cobrado por Furnas, que é de R$ 34,00, incluindo a transmissão."

Na sua opinião, "essa política não passa de um paliativo para encobrir o erro do abandono da hidreletricidade". Ele lembrou que Furnas, Chesf, Eletronorte, Itaipu e mais da metade da Cesp não foram privatizadas. "Nós temos que usá-las para salvar o Brasil do buraco em que esse processo equivocado nos colocou. Essa privatização é o maior fracasso da história no mundo: o Estado é obrigado a investir, a tarifa subiu e falta energia."


Empurrãozinho

Mesmo não criticando o programa do Governo, o engenheiro especialista da Cesp e doutorando pela Poli/USP em Engenharia Térmica, Jean Cesari Negri, confirmou alguns dos pontos levantados pelos adversários. Ele representa a companhia paulista no projeto da TPP — Termelétrica do Planalto Paulista (veja quadro) e vê a iniciativa como um incentivo. "Hoje, a expansão está na mão da iniciativa privada e o mercado ainda está se adaptando."

Na sua avaliação, fator fundamental para a opção pela termeletricidade foi a construção do Gasoduto Brasil-Bolívia e o contrato de compra do gás. Contudo, se por um lado o Governo precisava encontrar um destino para o produto boliviano, por outro, se todas as usinas funcionarem plenamente, será preciso aumentar o fornecimento. Isso porque, para os 15 mil MW, serão necessários 60 milhões de m3 por dia, o dobro da capacidade do gasoduto. "Mas nem todas elas vão depender do gás da Bolívia. E, em três anos, faz-se um belo gasoduto não muito comprido", ponderou.

Negri não descarta, todavia, a continuidade do investimento em hidreletricidade. "É preciso avaliar se vamos abrir mão desse potencial, principalmente na Amazônia, onde o aproveitamento viável é o dobro da capacidade instalada, hoje de 60 GW. E ainda temos um potencial muito grande nas regiões Sul e Sudeste, além das pequenas centrais hidrelétricas." Outra vantagem dessa opção é a menor dependência de know-how e equipamentos importados, o que reduz o custo, se não houver dívida em dólar. "O grande volume de uma hidrelétrica é a montagem eletromecânica e a obra civil e de barragem, quase tudo feito internamente."

Outra crítica às termelétricas diz respeito ao impacto ambiental, já que as usinas lançam ao ar CO2, NOX e CO, além de consumirem água da bacia local. Negri avalia que essa questão seja equacionável, lembrando que a hidrelétrica também tem efeitos nocivos, caracterizados pelas inundações de grandes áreas próximas aos rios. "Como a sua lógica é ficar perto do consumidor, economizando na transmissão, a térmica atinge regiões próximas aos centros urbanos, onde já há comprometimento do ar e da água. A solução é o regulador dizer se em determinado local pode ser instalada uma usina ou não."


Termelétrica de Paulínia

A TPP (Termelétrica do Planalto Paulista), empreendimento do consórcio formado pela Cesp, Petrobrás, Odebrecht Petroquímica e Grupo Ultra, ficará na cidade de Paulínia, terá potência de 700 MW/h (suficiente para abastecer uma cidade como Campinas) e integra o programa do Ministério de Minas e Energia parcialmente, com 240 MW. O projeto teve início em setembro de 1997. Até agora foi feita uma tomada de preços dos equipamentos e iniciado o processo de licenciamento junto à Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) e Secretaria do Meio Ambiente. O obra deve começar em julho de 2001, com término previsto para dezembro de 2003. Além das autorizações, até o ano que vem, é preciso fechar os contratos de fornecimento de equipamento, operação e manutenção, venda de energia e suprimento de gás. "Com isso, obtém-se os recursos no mercado financeiro através do chamado project finance", informou o engenheiro Jean Cesari Negri, que representa a Cesp no projeto.

Nesse caso, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) deve entrar com os 30% referentes à parte nacional dos equipamentos e os 70% relativos ao que será comprado da americana General Electric estão sendo levantados com o ExIm Bank. A usina deve custar US$ 400 milhões.

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