PROFISSIONAIS DO SETOR TECNOLÓGICO BUSCAM 

 ALTERNATIVAS PARA SE RECICLAR

Atualização, requalificação, aperfeiço­amento ou educação continuada. Se, há algum tempo, esses pareciam termos abstratos, nesse final de década, tradu­zem a luta por um lugar no mercado de trabalho, imensamente mais seletivo devido ao desemprego. Além disso, um sintoma patente da globalização são os avanços inexoráveis da tecnologia, que impõem seu ritmo e derrubam pelo caminho quem não os acompanha. Para o engenheiro e demais profissionais do setor tecnológico, o pro­blema é ainda mais crí­tico. Segundo o coorde­nador da área de Educa­ção à Distância da Fun­dação Carlos Alberto Vanzolini, Allen Habert, isso torna fundamental que se coloque essa mão-de-obra na rota da mo­dernidade. “Em São Paulo, são 150 mil enge­nheiros, no Brasil mais de 700 mil profissionais da área tecnológica. Somos um país com uma coluna vertebral tecnoló­gica muito importante, mas grasssa o analfabetis­mo tecnológico.” Basica­mente, os empecilhos são a falta de acesso à educação continuada após a univer­sidade ou aos cursos de aperfeiçoamento ou requalificação. Isso se dá devido à pequena oferta  para a grande demanda, mas também e principalmente pelos custos envolvidos, com os quais boa parte não pode arcar.

Exatamente nesse ponto  esbarraram as alternativas propostas pelo Conselho Tecnológico do SEESP. Segundo o vice-presidente da entidade e supervisor do grupo de coordenação do CT, Sérgio Gazire, o Sindicato fez uma pesquisa entre os associados e aferiu que a maior demanda se localizava nas áreas de telecomunicações e informática. “Nós fizemos convênios para atender a essa necessidade, mas ficou claro que a categoria não tem condições de arcar com os preços, que são altos, até porque a requalificação para engenheiros tem um nível mais sofisticado, de nada serve oferecer curso de Windows para essa clientela”, afirmou.

 

Consenso positivo

Se o atual quadro não é animador, há aspectos positivos que podem contribuir para resolver a questão. Na avaliação de Habert, o principal é que o tema é consenso entre todos os agentes do sistema produtivo. “Essa batalha ajuda a unificar os diversos segmentos interessados no avanço da modernização.”  Para aproveitar essa situação de maneira adequada, Habert acredita que se deve “dar o direito ao acesso ao saber para toda a comunidade de engenheiros e profissionais da área tecnológica”. Nessa linha, é preciso, por exemplo, que todos tenham um endereço eletrônico, um microcomputador, Internet, sem grandes desembolsos. “Tudo isso é possível; a tendência natural é que esses serviços e equipamentos tornem-se cada vez menos custosos ou até gratuitos e nós devemos lutar para que o direito ao acesso ao saber seja universal”, ressaltou.

O segundo aspecto positivo na luta pela qualificação desse exército de profissionais é a metodologia disponível, a EAD (Educação à Distância), que se utiliza das diversas mídias eletrônicas, como Internet ou TV a Cabo. Habert acredita que dessa forma seja possível treinar, com qualidade,  1 milhão de engenheiros no País, ocupando espaço nas suas residências ou locais de trabalho. “Cada instituição pode disponibilizar nesses instrumentos o seu produto educacional.” Uma das experiências nessa área é da própria Fundação Vanzolini (www.vanzolini.org.br), que criou o programa Engenheiro 2001, que   discute o ensino da engenharia, o Projeto E (www.projetoe.org.br), voltado para o emprego e o empreende­dorismo, e fez parceria com o TDL (Training Distance Learning), para um curso de Inglês por  Internet (www.tdl.com.br). “Nós atingimos centenas de milhares de profissionais, porque temos programas semanais e os sites são muito visitados, mas há uma demanda enorme não atendida”, atestou Habert.

 

Caminho

Para atender a essa demanda, num país que ainda não conseguiu garantir sequer a educação elementar, será necessário aplicar todos os recursos e esforços disponíveis. Aqui devem atuar entidades como o Crea-SP (Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia). “Pensamos em transformar o Conselho numa grande agência de fomento e de captação de recursos para suprir essa deficiência”, afirmou Esdras Magalhães dos Santos Filho, candidato à presidência da instituição nas eleições de novembro próximo. Na sua avaliação, existem verbas para esse fim no FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), no Bird (Banco Interamericano de Desenvolvimento), no Banco Mundial e até no Ministério da Educação. “É preciso ir atrás desses recursos, coisa que o Crea não fez, e canalizá-los adequadamente”, afirmou. Além disso, Esdras acredita que parte do orçamento de R$ 35 milhões anuais pode ser direcionada a esse objetivo.

Para o candidato, reunindo as condições financeiras, o programa deve estar voltado para duas questões básicas. Uma delas é a atualização ou educação continuada, para que o profissional assimile as inovações tecnológicas e de gerenciamento e possa dar resposta às demandas cotidianas de sua atividade e ser competitivo. A outra é o fato de que parte da mão-de-obra terá de ser requalificada para novos setores da economia, mais aquecidos ou oferecendo oportunidades melhores que os tradicionais. “Muitas vezes o profissional sozinho não consegue identificar onde estão os novos nichos de mercado, nem como ter acesso a eles. O Crea deve fazer a análise e oferecer esses diagnósticos.” Para dar conta disso, ele pretende criar o Centro de Educação Continuada e Requalificação Profissional, que deverá ter unidades em cada entidade ou inspetoria do Conselho.

Esdras lembrou ainda que atualmente essa questão é vital para que os profissionais possam enfrentar o mundo globalizado, organizado em mercados comuns. “Como os profissionais brasileiros vão competir com os de países desenvolvidos, quando 80% dos nossos ainda não dominam o Inglês ou um editor de texto? Entendemos que dar  uma resposta a isso  é missão do Crea.”

 

Lei 8.029

A busca vital pela promoção da atualização e requalificação profissional dos engenheiros se intensificou na década de 90, mas já nos anos 80 estava em pauta para o SEESP. Em 1989, o Sindicato conseguiu incluir no seu acordo coletivo de trabalho 12 dias por ano destinados ao aperfeiçoamento da categoria. Desde então, o tema tornou-se constante e está presente na maioria dos acordos e convenções.

Um segundo marco  aconteceu no dia 3 de setembro de 1992, quando foi aprovada na Assembléia Legislativa a Lei 8.029, que institui a criação de programas de reciclagem tecnológica e desenvolvimento profissional nas empresas públicas no Estado de São Paulo, o que atinge oito categorias profissionais abrangidas pelo Crea. Contudo, passados sete anos da sua aprovação, a legislação ainda não foi regulamentada pelo Executivo para que possa ser aplicada.

 

Titulação necessária

Engenheiro civil, autor de diversos livros que já venderam mais de 50 mil exemplares,  Manuel Henrique Botelho tem uma proposta de incentivo à atualização profissional e valorização do engenheiro. É a titulação por especialização, que seria coordenada pelo Crea-SP e concedida pelas associações de profissionais. “Essa é uma necessidade reconhecida por outras profissões, como médicos e dentistas. Embora esse título seja meramente honorífico e não garanta o mercado de trabalho, diferencia e na prática influencia”, explicou Botelho. “Por exemplo, o profissional pode ter um título de especialista em saneamento, dado pela Associação Brasileira de Engenharia  Sanitária e pelo Crea. Isso estimula o engenheiro a se organizar na sua vida profissional e a se aperfeiçoar”, concluiu.

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