CUSTO DE VIDA ACUMULADO DURANTE PLANO REAL CHEGOU A 82%

 

Os brasileiros enfrentam atualmente desemprego e recessão sem precedentes, situação justificada pelo governo como o preço a se pagar pela estabilidade da moeda. Assim, ao longo dos últimos cinco anos, festejou-se o barateamento dos itens que compõem a cesta básica e índices inflacionários em queda praticamente constante. No entanto, parcela considerável da população continua com salários arrochados e a sensação de um poder aquisitivo cada vez menor. Entre esses, estão os engenheiros e outras categorias com vencimentos acima de 20 salários mínimos. Para se ter uma idéia, o ICV (Índice de Custo de Vida), medido pelo Dieese (Departamento Intersindical Estudos e Estatísticas Sócio-Econômicas) aponta resultados diferentes, dependendo da faixa de renda pesquisada. A taxa geral acumulada no período do Plano Real é de 77,3%, enquanto para o estrato 1 (renda média de R$ 377,00) é de 71%, para o 2 (R$ 940,00) é de 70% e para o 3 (R$ 2.700,00) chegou a 82%.

As disparidades se explicam porque os itens que pesam mais no orçamento da classe média ficaram mais caros. Por exemplo, segundo o economista Peter Greiner Júnior, coordenador da pesquisa do ICVM (Índice do Custo de Vida da Classe Média) da Ordem dos Economistas de São Paulo, durante esse período a variação de preços na Educação atingiu 138%, Saúde, 105,40% e Habitação 105,49%. De acordo com o Dieese, o que mais colaborou para dificultar a vida dessa parcela foram gastos com locação, impostos e condomínios, que chegaram a 402,7%. Pelo IPC da Fipe (Índice de Preços do Consumidor da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), os aluguéis subiram 555,05% desde julho de 1994. Sem considerar o impacto de aumentos como o da gasolina (15,5%) e energia elétrica (21%), pois os efeitos na inflação só aparecerão a partir deste mês de agosto. Também estão fora desses cálculos despesas como Internet, telefone celular e TV por assinatura, a cada dia mais incorporados aos hábitos de muitas famílias.

Sentindo na pele

Essa situação representa perdas salariais significativas, já que os reajustes não acompanharam os 82% medidos pelo Dieese. Mais significativa que índices inflacionários é a realidade de quem sente na pele os efeitos perversos do arrocho associado à carestia. O engenheiro Eugênio Tavares Guerra, ex-empregado da VB Serviços e atual prestador de serviços autônomos à mesma empresa, é um entre os muitos que se viram obrigados a rever hábitos antigos. Com a mudança no trabalho, teve de adquirir um convênio médico para a família, o que compromete 5% de seus rendimentos — entre 20 e 30 salários mínimos —, embora, como sócio do SEESP, tenha optado pelo Plano de Saúde do Engenheiro, que garante preços menores que os de mercado. Viagens mais longas e refeições fora de casa foram abandonadas; a empregada mensalista passou a comparecer apenas um dia por semana e o clube foi cortado; atividades culturais, como teatro, cinema e shows, nem pensar. Para fugir do aluguel e equilibrar o orçamento, está vendendo um imóvel em Santos com o objetivo de conseguir um financiamento e comprar uma casa em São Paulo. Nesse contexto, carro novo ficou impossível. No início do Real, Tavares pagava um consórcio, pegou o veículo em 1996 e não trocou mais. A prioridade é a educação do filho, matriculado numa escola particular e num curso de inglês.

Apesar de toda a economia, a renda é insuficiente para as despesas e o engenheiro é obrigado a fazer malabarismos com os limites do cheque especial e cartão de crédito, de onde saem mensalmente R$ 3.500,00 adicionais.

Engenheiro da Cesp (Companhia Energética de São Paulo) desde 1976, Sérgio Diório avalia que, sem política salarial, as perdas foram significativas nos últimos anos. "A escola dos meus filhos, por exemplo, subiu 170% desde 1995. Em 1999, aumentou 12%, enquanto o meu salário apenas 1,2%", comparou. Segundo ele, também ficaram muito mais caros combustível, condomínio, TV a cabo, Internet e o telefone, itens que consomem perto de 20% do seu orçamento. Como não poderia deixar de ser, isso exigiu mudanças no padrão de vida. O carro que era trocado a cada dois anos até 1994 desde então continua o mesmo. Os cursos de atualização profissional e idiomas, que poderiam ajudar a melhorar de vida, também foram postos de lado.

 

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