crise acirrada

 

Sem exportações, aumenta recessão 

O desemprego aumentou e novas demissões estão na pauta. Expectativa de crescimento acelerado das exportações esbarra na falta de competitividade das empresas nacionais.

Ainda não se concretizou a expectativa de aumento das exportações e retomada do crescimento devido à desvalorização do real. Em janeiro último, o País exportou apenas US$ 2,9 bilhões (US$ 1 bi a menos que em igual período de 1998); em fevereiro, os US$ 3,3 bilhões continuaram abaixo dos US$ 3,7 bi do ano passado. Teoricamente com o preço mais atrativo no mercado internacional, as empresas brasileiras enfrentam agora outros obstáculos. "Há dificuldades em competir, especialmente no setor de componentes eletrônicos, porque o mercado internacional trabalha com escalas muito maiores que as nossas", afirmou Antônio Correa de Lacerda, diretor de economia da Abinee (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica). Segundo ele, alcançar os níveis de produção e qualidade internacionais "não depende só da taxa de juros e câmbio, mas da política industrial do governo". Para se ter uma idéia, os produtos eletrônicos foram responsáveis, em 1998, por um déficit de US$ 8 bilhões na balança comercial — o País comprou pouco mais de US$ 11 bi e vendeu cerca de US$ 3 bi.

Mesmo um setor tradicionalmente exportador, como o de suco concentrado de laranja, que tem 98% de sua produção dirigida ao mercado externo, não está se beneficiando da desvalorização. "A medida não afeta de imediato as exportações brasileiras porque, não tendo mercado interno, o setor não pode optar entre vender aqui ou exportar", informou Ademerval Garcia, presidente da Abecitrus (Associação Brasileira de Exportadores de Cítricos).

Desemprego ascendente

Sem o efeito do principal remédio contra a crise, não se tornaram realidade também os sonhos de vencer a recessão. Pelo contrário, em fevereiro, o número de desempregados subiu para 1,615 milhão na Região Metropolitana de São Paulo, correspondendo a 18,7% da PEA (População Economicamente Ativa). Em janeiro, esse índice havia ficado em 17,8%. Segundo pesquisa realizada pela Fundação Seade e pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos), no período foram fechados 84 mil postos de trabalho. "Só em fevereiro, nós cortamos 14 vagas. Desde setembro de 1998, foram reduzidas 48 mil", informou o vice-presidente de Qualidade e Tecnologia do Sinduscon (Sindicato da Indústria de Construção Civil de Grandes Estruturas no Estado de São Paulo), João de Souza Coelho Filho. "Temos uma evidente perda de atividade e a construção tem um movimento de reação à retração econômica muito acentuado", afirmou. "O setor é o primeiro a entrar na crise e o último a sair. Se tivermos uma queda de 3% no PIB, sua atividade cairá pelo menos 10%", enfatizou o diretor-superintendente da Método Engenharia, Hugo Marques da Rosa. "Se não houver a adoção de uma política para manter o nível de atividade, é muito provável que haja novas demissões nos próximos dois meses", advertiu Coelho.

As perspectivas também não são as mais otimistas no setor de eletroeletrônicos, que emprega 160 mil trabalhadores diretos. "Certamente ocorrerão cortes em algumas áreas, embora possa haver contratações em outras, especialmente em telecomunicações e energia", previu Lacerda.

Perspectivas

O quadro desfavorável, porém, não minou as esperanças de reaquecimento a médio prazo. O vice-presidente do Sinduscon acredita que, em um ano, a demanda reprimida pela atual retração deva alavancar os negócios. "Mas, se a equipe econômica errar como fez nos últimos anos, é claro que vamos pagar um preço por isso." Para começar a acertar, na opinião de Coelho, seria preciso baixar drasticamente os juros, o que ainda está longe do horizonte, já que a primeira redução da taxa básica de 45% para 42%, em 25 de março último, não é o suficiente para estimular os investimentos. Rosa também vislumbra melhoria relativa em breve. "A desvalorização do real acabou acelerando todo o processo de ajuste da economia e o custo para a sociedade vai ser menor dessa forma; teremos uma crise forte, mas pontual." Contudo, ele acredita que os maus bocados por que passará o conjunto da indústria da construção não deve atingir a Método. "Até aqui, tudo indica que 1999 será um dos melhores anos da nossa história. A previsão de volume de negócios é da ordem de R$ 350 milhões." Por conta disso, "se as expectativas se confirmarem", a empresa pode ampliar o quadro de pessoal, hoje com 800 funcionários, dos quais 71 são engenheiros. A esperança de volta do crescimento no segundo semestre persiste no setor de eletroeletrônicos, que, no entanto, deve acompanhar a tendência de queda e faturar neste ano R$ 3 bilhões a menos que os R$ 40 bi de 1998, segundo previsões da Abinee.

Não está tão confiante no reaquecimento da economia o jornalista econômico Aloysio Biondi, para quem o País caminha a passos largos para a moratória. Em palestra na sede do SEESP, em 24 de fevereiro, ele criticou a atuação da equipe econômica para contornar a crise. "Não vejo qualquer mudança de atitude no governo. Fala-se em exportação e no ano passado apenas 500 empresas foram apoiadas pelo Proex (Programa de Financiamento das Exportações)", apontou. Biondi reprovou ainda os projetos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) de reestruturação dos setores de papel e celulose, energia e siderurgia, "exatamente os que já foram privatizados com dinheiro do governo". Na opinião do jornalista, o grande drama continua sendo a falta de um projeto para o País. "Acredito que a principal briga agora seja pela recuperação da soberania nacional e o primeiro resgate a se fazer seja político."

 

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