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10/03/2017

Opinião - Vácuo de poder x fundamentalismo de mercado

Ceci Juruá*

Recorrentemente, há artigos na imprensa enfatizando que temos, no Brasil atual, um vácuo de poder. É difícil aceitar esse ponto de vista, pois há múltiplas manifestações do poder político federal que sinalizam o oposto. Eu destacaria: 

- os recentes debates ocorridos no Congresso e o resultado das votações, onde sistematicamente predomina o ponto-de- vista do Governo Federal; -o encarceramento de inúmeras personalidades de oposição ao Governo, cuja culpa ou responsabilidade em atos tidos como ilícitos não são maiores do que as que poderiam ser atribuídas a membros do poder instalado; bons exemplos são Marcelo Odebrecht, José Dirceu e o Almirante Othon;

- o desmantelamento do setor nacional da engenharia civil e militar, sem maiores protestos por parte dos setores majoritários da sociedade, sobretudo do meio empresarial; 

- a nomeação de dois quadros políticos para o Ministério de Relações Exteriores, em detrimento dos quadros do Itamaraty, com a agravante que se tratou, até agora, de políticos suspeitos de envolvimento em atos que poderiam ser considerados ilícitos, embora ainda não denunciados; 

- a utilização de força policial e militar contra situações de agitação por parte de movimentos sociais ou sindicais, sem maiores manifestações por parte das organizações e entidades de defesa dos direitos humanos e da ordem democrática; 

- entre maio e setembro de 2016, no espaço de quatro meses, o governo federal editou 19 medidas provisórias, média mensal de quase cinco MPs, sem que nenhuma delas tenha sido derrubada pelo Congresso (cf. Agência Senado, setembro de 2016); até esta data (março de 2017) já foram lançadas em torno de 30 medidas provisórias pelo governo federal (de números 726 a 755), em espaço inferior a um ano, média mensal em torno de 3 MPs desde o afastamento da presidente eleita em outubro de 2014; 

- não se poderia deixar de citar o recuo aparente da taxa Selic de 14,15 para 12,25% (queda de 1,9 ponto), enquanto a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ou pelo Índice Geral de Preços-Disponibilidade Interna (IGP-DI) recuou na mesma proporção (o IGP-DI anual medido pela Fundação Getúlio Vargas – FGV passou de 7,18% para 5,26%, queda de 1,92 ponto); comparando-se os dois índices, verifica-se que a taxa real de juros, Selic, permanece em torno de 7% anuais, sem redução portanto em valores reais.

Há também, até agora, nítida deterioração dos dados relativos à economia brasileira. São indicadores: aumento do desemprego, dívida pública bruta superior a 70% do Produto Interno Bruto (PIB), ampliação do déficit público primário e nominal, deterioração da situação econômica das famílias, com perda de poder aquisitivo em torno de 10% no último triênio, fechamento de empresas, desnacionalização progressiva.

Apesar da deterioração verificada, não há manifestação pública das entidades sindicais patronais e de trabalhadores contra a política econômica adotada pelo governo instalado a partir de maio de 2016. Salvo honrosas exceções, caso da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq).

Também inexiste um programa alternativo de política econômica por parte das frágeis oposições.

Tampouco se conhece, da parte do governo, um programa claro, objetivo, sinalizando uma estratégia de retomada do crescimento. Apenas promessas, vagas, como as expectativas em torno dos efeitos das reformas em curso, de cunho neoliberal e apontando para o “fundamentalismo de mercado”.

Fundamentalismo de mercado que, em momento algum de nossa história, foi capaz de promover o desenvolvimento econômico e social. Menos capaz ainda de encaminhar políticas de redução das desigualdades sociais, aspiração histórica do povo brasileiro.

Entre as manifestações de poder desse fundamentalismo de mercado, pode-se apontar a manutenção da taxa de juros Selic, em nível de 7% reais. Com a atual divida pública bruta, a taxa Selic deverá absorver cerca de 5% do PIB, pouco mais de R$ 300 bilhões, neste ano de 2017, apenas para rolar a dívida, isto é, pagar os juros anuais.

São recursos improdutivos, estes destinados à rolagem da dívida pública, tão somente para saciar o apetite voraz dos rentistas, nacionais e internacionais. Constituem no nosso entender o indicador mais adequado, e forte, para sinalizar que não há vácuo algum de poder. Há um poder central forte, capaz de impor um sacrifício desse porte a uma população majoritariamente pobre e incapaz de fazer frente às necessidades materiais do cotidiano de uma família.

Um poder que tende para o despotismo e para a adoção de medidas que contribuirão para o empobrecimento dos brasileiros e, é provável, para o retorno de populações miseráveis vagando tristemente em busca de sobrevivência.

Diante das considerações acima, parece-nos impossivel falar em vácuo de poder no Brasil atual.

 

Ceci Juruá, economista, doutora em Políticas Públicas e membro do Conselho Consultivo da Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários Regulamentados (CNTU)

 

 

 

 

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