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06/10/2016

Esperança e organização, receita José Luiz Del Roio

José Luiz Del Roio é radialista e ativista sindical ítalo-brasileiro. Nascido em 1942, na cidade de São Paulo, ele está envolvido nas lutas sociais desde os 17 anos de idade. Em 19 de setembro último, foi relançado o seu livro “1º de Maio: sua origem, seu significado, suas lutas”, cuja primeira impressão foi na comemoração dos 100 anos da data, em 1986. Força Sindical, Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST), União Geral dos Trabalhadores (UGT), Central Única dos Trabalhadores (CUT) e Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), junto com o Centro de Memória Sindical, e diversas outras entidades, entre elas o Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo (Seesp), se uniram e patrocinaram a republicação da obra. Ao Engenheiro, o escritor falou sobre a atualidade do livro. “O conceito do 1º de Maio é um só, a redução da jornada de trabalho; e ele está mais atual do que nunca em razão dos discursos empresariais que falam em 12 horas diárias.” Del Roio também aponta a relação entre mais de três séculos de escravidão no País e a formação do capitalismo brasileiro. “É um passado que nunca passou”, resume.

Trinta anos depois, o seu livro “1º de Maio” é relançado. Por quê?
José Luiz Del Roio - Quando o escrevi, em 1986, tinha um motivo: explicar aos jovens líderes sindicais, depois de mais de 20 anos de ditadura e repressão, qual o sentido profundo da data, que é um só. Ele só existe em razão da luta pela redução da jornada de trabalho. Esse é o conceito. Noventa e cinco por cento dos países comemoram a data. É a única festa real­mente universal. Ora, estamos vivendo um momento em que dirigentes desse governo golpista falam todos os dias da necessidade de ampliar a jornada de trabalho. Vai contra a história e a lógica, aí está o valor deste livro no Brasil atual.


Foto: Beatriz Arruda/SEESP
Del Roio 5 CNTU 
José Luiz Del Roio: passado escravocrata não ficou para trás.
 

Os discursos patronais de 2016 são os mesmos de 1986?
Del Roio - São idênticos. Àquela época, eles diziam que não dava para reduzir o horário de trabalho porque senão não teriam lucro, e aí ameaçavam fechar as fábricas.

O que acontece no País está dissociado de um projeto mundial?
Del Roio - Faz parte do processo de desmonte dos estados nacionais para reduzir os direitos sociais e para o capital financeiro ficar totalmente livre para fazer o que quiser.

Qual o papel das novas tecnologias nesse cenário?
Del Roio - É claro que o avanço da ciência é fundamental ao desenvolvimento da civilização. Mas a ciência sempre foi dúbia. Infelizmente, a tecnologia tem servido muito ao neoliberalismo para compactar o tempo. Fazemos tudo muito mais rápido, mas a contradição é que não nos sobra tempo para o lazer e para pensar. A razão do 1º de Maio é alongar o tempo, para que o trabalhador possa estudar, ter lazer e fazer política. Isso se perdeu. Agora o tempo livre serve para ficar ligado no celular, e a política é conversar com cinco ou seis pessoas que não conhecemos, sem o olho no olho. Tal situação é muito boa para o neoliberalismo.

Como o senhor vê o cenário brasileiro para o trabalhador neste momento?
Del Roio - Vejo um grande conflito. Voltamos à face horrenda da exploração, quando querem cortar tudo, até a possibilidade da escola e da casa própria. A pior coisa que pode acontecer é acabar a esperança. O movimento sindical vai se ligar à luta dos movimentos sociais e impedir que a classe dominante oligárquica e escravocrata consiga avançar. É exemplar a mobilização dos petroleiros que conseguiram, neste momento, bloquear a entrega do pré-sal.

A classe dominante no Brasil é escravocrata?
Del Roio - Isso é impressionante na história de uma nação. Em grande parte da história do País, as relações de trabalho foram baseadas na escravidão, que não teve ruptura, apesar das muitas lutas. Na verdade, a classe dominante violenta e hábil acabou fazendo essa abolição não por questões internas, mas por pressão internacional. E logo depois se tentou minimizar ou esquecer essa história, dizendo-se que a escravidão aqui era boa ou não era tão ruim.

A escravidão está, então, no DNA do capitalismo brasileiro?
Del Roio - Lógico que está! O capital que se libertou do tráfico negreiro é o mesmo que imediatamente constituiu as lavouras do Centro-sul do País, as grandes fazendas de café. E quem são os grandes fazendeiros? São aqueles que depois, na segunda geração, vêm para São Paulo e Rio de Janeiro para criar as primeiras indústrias. O capital sai do tráfico, vai para o café e vem para a construção do sistema industrial. Não existe contradição, está tudo interligado. Lógico que a ideia é sempre escravagista e o nosso operário é tratado como tal. É um passado que nunca passou. Até poucos anos atrás, falava-se em minorias brasileiras. E quem eram elas? Os índios, os negros, as mulheres. Cinquenta e três por cento da população brasileira é negra. Somos o segundo país negro do planeta, ultrapassados apenas pela Nigéria. Mas se você falar que o Brasil é um país negro, ninguém acredita, nem o próprio negro. Porque o País consegue, ou conseguia, esconder essa maioria.

O livro traz ideias sobre a luta dos trabalhadores.
Del Roio - Sim. Não é um livro água com açúcar. Ele é de luta, de combate e de profundo amor ao proletariado. É uma coisa apaixonante na história da humanidade imaginar homens e mulheres, na sua grande maioria analfabetos, que começavam a trabalhar com dez, 11 anos de idade em jornadas superiores a 16 horas por dia, sábado inclusive, começarem a se reunir para construir um futuro diferente, sob uma repressão feroz e violenta que fez correr muito sangue. Como surgiu a ideia de uma organização, de entender como funcionava o sistema capitalista, o lucro, a máquina, esse movimento é comovente.

Seu recado aos trabalhadores brasileiros.
Del Roio - Esperança, esperança, esperança. Organização, organização, organização.

 

* Por Rosângela Ribeiro Gil
Entrevista publicada no jornal Engenheiro, Edição 173, Outubro de 2016

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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