Cresce Brasil

Rodoanel sul revela queda-de-braço entre Estado e ambientalistas

Soraya Misleh

 

Um projeto de desenvolvimento ao País tem que priorizar a integração territorial e fortalecer o mercado interno. Para tanto, é necessário investimento em obras de infra-estrutura de transportes, as quais devem ser bem planejadas, de modo sustentável, para que não haja distorções em sua real concepção. A diretriz integra o manifesto “Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento”, lançado pela Federação Nacional dos Engenheiros, que propõe as bases ao desenvolvimento nacional com inclusão social.

Para o Governo do Estado de São Paulo, o trecho sul do Rodoanel Mário Covas segue essa orientação. Já a ambientalistas, a obra vai na contramão disso. Cinco anos de discussões e 13 audiências públicas não mudaram esse cenário controverso, mas garantiram que a licença prévia fosse concedida pelo Consema (Conselho Estadual do Meio Ambiente), em 22 de fevereiro. Com isso, foi assegurada a licitação dos cinco lotes à construção e início da empreitada em 19 de setembro último, pelo trevo da Anchieta. Os demais pontos aguardam liberação de recursos – 1/3 provenientes da União e 2/3 do Estado. No total, essa obra deverá custar em torno de R$ 3,5 bilhões, incluindo-se as desapropriações, reassentamentos, mitigações e compensações ambientais.

O rodoanel sul terá 61,4km de extensão, começando em Mauá, passando por Ribeirão Pires, Santo André, São Bernardo do Campo, São Paulo, Itapecerica da Serra e Embu, e terminando na conexão com o trecho oeste na Régis Bittencourt. Interligará essa rodovia à Anchieta e Imigrantes. O objetivo da obra como um todo, segundo o secretário adjunto de Estado dos Transportes de São Paulo, Paulo Tromboni de Souza Nascimento, é separar a logística paulista de longa distância da metropolitana interna, interligando dez rodovias – cinco delas já estão contempladas pelo trecho oeste. “Quer dizer basicamente que os fluxos de mercadorias que passam por São Paulo, 90% por caminhão, poderão passar desimpedidos pela Capital. Isso tem um ganho enorme de produtividade. Um dos equipamentos mais importantes do Brasil, o Porto de Santos, também vai ganhar fluidez (com o trecho sul).” Paralelo a essa iniciativa, pode, de acordo com ele, ser ainda feito o ferroanel sul e com isso retirarem-se os trens de carga de dentro da cidade. Conforme sua avaliação, ao município, implica a enorme vantagem econômica de reduzir o desperdício no tempo de transporte com alguma melhora no tráfego. Conseqüentemente, “o rodoanel, quando ficar pronto, vai resultar em economia anual de R$ 2 bilhões nesses custos. Representa redução de 6% a 8% na poluição do ar de São Paulo devida a veículos automotores. Aos fluxos de passagem, uma economia de tempo médio equivalente a 25%, e aos que têm como destino a região metropolitana, de 12%. Para quem anda dentro da cidade, da ordem de 8%”.

 

Polêmica – Ao meio, obra dessa monta terá algum impacto inevitável. Mas Tromboni garante: “Trata-se do melhor projeto ambiental jamais feito no mundo na área de rodovia. Representa o equivalente à preservação permanente e recuperação de algo próximo de 5 mil hectares. Temos medidas preventivas, mitigadoras e de compensação.” A essas últimas, foi instituído um fundo, para que não sejam adiadas em função de falta de verbas. De acordo com o secretário adjunto, a previsão é que, no total, o orçamento ambiental da obra atinja 25% do seu valor. “O dinheiro está sendo gasto primeiro para evitar impactos negativos e segundo para produzir positivos.” Conforme exemplifica, o rodoanel vai passar próximo à Represa de Riacho Grande, no ABC, conseqüentemente, os remanescentes privados que existem lá serão desapropriados e o conjunto da área será fechado para ocupação. No total, serão 1.700 famílias afetadas, as quais poderão optar entre ser indenizadas ou reassentadas. “Medidas como essa mais a criação de uma faixa de 300 metros de proteção dos dois lados do rodoanel na região geram uma barreira muito grande ao crescimento da mancha urbana em direção aos mananciais e à Serra do Mar.”

Eis aí a principal divergência entre Estado e ambientalistas. É o que aponta Mário Mantovani, especialista em manejo de bacias hidrográficas e diretor da Fundação SOS Mata Atlântica, para quem a obra “vai comprometer a água que São Paulo bebe”. Ele lembra que já há um conflito permanente com o abastecimento da metrópole. “Tem o sistema Cantareira em colapso e Guarapiranga servindo para diluir esgoto e poluição. E o governo tomou a decisão de passar o rodoanel em cima disso.” Na sua concepção, o empreendimento deve induzir o incremento da ocupação na região, que já sofre com o problema. “Há destruição sistemática dos mananciais no Brasil e em São Paulo e falência múltipla nos órgãos de controle. O rodoanel será a gota d´água. Deve antecipar em 20 anos a crise dos mananciais. O EIA-Rima (Estudo e Relatório de Impacto Ambiental) não passa de um protocolo de intenções para justificar a execução de uma obra desnecessária.” Tromboni refuta essa idéia: “É um compromisso assinado. E cada etapa do projeto será fiscalizada pela Secretaria do Meio Ambiente.”

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