VI Conse

Engenheiros apresentam seu projeto nacional de desenvolvimento

Rita Casaro*

 

Retomar o desenvolvimento econômico sustentado com inclusão social, lançando mão de medidas que propiciem crescimento econômico de no mínimo 6% ao ano é tanto urgente quanto possível. Para tanto, será fundamental alterar a política macroeconômica, reduzindo a taxa de juros, e garantir investimentos públicos e privados da ordem de 25% do PIB (Produto Interno Bruto) para se dotar o País da infra-estrutura necessária. Essa foi a tônica do VI Conse (Congresso Nacional dos Engenheiros), realizado em São Paulo entre os dias 13 e 16 de setembro de 2006, que aprovou o manifesto “Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento” (íntegra disponível no site www.crescebrasil.com.br).

A abertura do evento, na noite de 13 de setembro, reuniu cerca de 1.300 pessoas de todo o País, lotando o auditório do Novotel São Paulo Center Norte. “O Brasil precisa crescer e a engenharia tem de mostrar a sua cara e dar a sua contribuição. É o que estamos fazendo em todo esse processo”, afirmou Murilo Celso de Campos Pinheiro, presidente do SEESP e da FNE (Federação Nacional dos Engenheiros), promotora da atividade.

O ato político teve a participação de diversas autoridades paulistas, entre as quais o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, o vereador Paulo Teixeira (PT), representando a Câmara Municipal de São Paulo, o deputado estadual Nivaldo Santana (PCdoB), o presidente da Assembléia Legislativa de São Paulo, Rodrigo Garcia (PFL), os deputados federais Antonio Carlos Mendes Thame (PSDB), Delfim Netto (PMDB) e Arnaldo Faria de Sá (PTB), os secretários de Estado dos Transportes, Dario Rais Lopes, e do Emprego e Relações do Trabalho, Walter Caveanha, além dos presidentes do Crea-SP, José Tadeu da Silva, e do Confea, Marcos Túlio de Melo.

Ao longo da atividade, aconteceram palestras sobre os diversos temas que compõem o documento, além de conferências proferidas por convidados especiais. O primeiro deles foi Marcio Pochmann, professor livre-docente e pesquisador do Instituto de Economia da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). Ele apontou a contradição entre o pífio crescimento de 2,6% do PIB (Produto Interno Bruto) – que, entre suas conseqüências, deixa 6 milhões de jovens sem qualquer conexão com o trabalho – e o fato de ser o Brasil um país ainda por construir. “Existe dinheiro, mas não prioridades definidas. Não foram investidos os R$ 106 bilhões necessários à reforma agrária, mas gastaram-se R$ 160 bilhões com o serviço da dívida em 2005.”

Para Pochmann, o Brasil assemelha-se a um “carro que anda com freio de mão puxado”. Ele denunciou a ideologia por trás do discurso que mantém a estagnação. “Não existe dicotomia entre desenvolvimento e inflação. Isso não é uma questão técnica, mas política”, afirmou.

 

Democracia participativa
O economista Carlos Lessa, professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e ex-presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), endossou as críticas do colega. “Existem recursos, mas com o volume de juros da dívida pública que o Brasil paga, é impossível implementar o programa que os engenheiros propõem”, enfatizou.

Como forma de levar a cabo as mudanças que a Nação precisa, ele propôs que o trabalho desenvolvido pelos engenheiros, que resultou no manifesto “Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento”, transforme-se num movimento permanente. “Os movimentos sociais têm que ocupar espaços que os mecanismos de representação não estão conseguindo.” Nesse contexto, ele enalteceu o trabalho dos engenheiros como precursor de um movimento pela democracia brasileira – que está em crise. “É fundador de uma proposta cultural para colocar o Brasil em pauta.”

 

Globalização
Como conquistar o almejado desenvolvimento em tempos de intensa globalização econômica foi o tema do embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, secretário geral do Ministério das Relações Exteriores. Entre as principais pressões sobre as nações, especialmente as da periferia, está a por abertura comercial e contra formas de regulamentação e proteção da economia. Para que as grandes empresas tenham acesso a todos os consumidores do globo, não pode haver barreiras e aí entram as normas internacionais que podem dificultar políticas públicas de interesse nacional.

O embaixador lembrou que, para realizar o seu potencial, o Brasil terá de se valer de ações que gerem emprego, integrando ao mercado produtivo os 50 milhões que vivem com até US$ 1 por dia. “É preciso que se tenha a possibilidade, por exemplo, de dar subsídios à produção agrícola. Não é possível estimular a indústria com tarifa zero nas importações.” Portanto, lembrou o embaixador, tais questões devem ser defendidas nas negociações internacionais.

 

O desafio da Amazônia
Buscar o desenvolvimento sustentável da Amazônia foi o tema apresentado aos congressistas por dirigentes dos Senges (Sindicatos de Engenheiros) na região. O primeiro a abordá-lo foi Sebastião Fonseca, presidente do Sindicato dos Engenheiros no Acre. Ele destacou o tipo de desenvolvimento que se deseja para a Amazônia, que leve em conta a conservação do meio ambiente, mas não a impeça de “crescer junto com o Brasil”. E alertou: “O País precisa manter sua soberania para uso adequado da região.” Na sua ótica, a Amazônia precisa produzir e ser ocupada por cidadãos brasileiros. Conforme sua preleção, a floresta deserta abre espaço a qualquer tipo de pirataria. “São ações que se somam para deixar o Brasil mais pobre.”

Vice-presidente do Senge-PA, Ricardo José Lopes Batista apontou a importância de se considerar a visão do amazônida. A região vive um processo de degradação há 30 anos, o qual vai na contramão dessa proposta, informou ele. Além disso, sofre com a biopirataria e a garimpagem. O local constitui-se em grande reserva de minério, contudo, como exemplificou Batista, essa não gera valor agregado ao seu desenvolvimento. A diversidade da Amazônia lhe confere grande potencial para tanto, mas padece também com a falta de tecnologia, lembrou ele. Projeto que vise o uso adequado da região, portanto, deve levar em conta essa necessidade.

Problema sério que exige atenção é a tentativa de sua internacionalização. Na opinião de Marcílio Vital de Paula, presidente do Senge-AM, para enfrentar isso, é preciso levar em conta a situação social da maioria da população amazônida e mapear, através de pesquisas integradas realizadas por órgãos nacionais, o que se deve fazer a curto, médio e longo prazo. “Preocupa que a elite brasileira emita pareceres sem conhecer e considerar a realidade local.”

 

Transformar idéias em ação
Estabelecido o consenso sobre quais são os problemas e as soluções, é necessário transformar as idéias em ação. Essa foi a mensagem do antropólogo e consultor de empresas Luiz Almeida Marins Filho, em sua palestra intitulada “E eu com tudo isso?”. “Um dos instrumentos que o ser humano tem para isso é a vontade de fazer”, disse Marins. Conforme ele, a inteligência também é elemento importante – resume-se a perceber quais ações são essenciais e separá-las das demais. Tendo feito seu doutorado na Austrália junto aos aborígenes, Marins relatou sua experiência em meio a essa população para mostrar aos congressistas a importância de definir um foco de atuação e segui-lo. Ele contou que, como povo primitivo, na noite anterior a uma caçada, o aborígene local promovia uma dança em que simulava a ação a ser feita no dia seguinte. Então, definia a função de cada um no grupo e saía para concretizar a caça, não se desviando da meta traçada – no caso, encontrar emus, ainda que surgissem sinais de algo mais apetitoso pelo caminho, como cangurus. Para ir adiante, Marins lembrou, contudo, ser crucial ter motivação e disciplina. “Se perdermos o entusiasmo, que é a crença na capacidade de transformar a realidade apesar das adversidades aparentes, e a paixão do início, perderemos tudo.”

Outra questão imprescindível na época atual, que servirá aos engenheiros na luta pelo desenvolvimento, como apontado pelo palestrante, é manter a unidade em meio à diversidade. “É preciso compreender o poder da união.”

 

* Colaboraram Rosângela Ribeiro e Soraya Misleh

 

Murilo Campos é reeleito presidente da FNE

No encerramento das atividades do VI Conse (Congresso Nacional dos Engenheiros), no dia 16 de setembro, foi eleita a chapa 1 que reconduziu Murilo Celso de Campos Pinheiro à presidência da FNE (Federação Nacional dos Engenheiros) para o triênio 2007-2010. Foram 138 votos a seu favor, dois brancos e um nulo.

Após a apuração, Campos Pinheiro reafirmou seu compromisso com a democracia e com a defesa da categoria dos engenheiros e fez sua avaliação do evento, que reuniu mais de 300 delegados, representando vários sindicatos de engenheiros do País, e cerca de 1.300 congressistas: “Nós realizamos algo extraordinário. Todos juntos, com trabalho e união.” E completou: “Precisamos agora fazer com que os nossos governantes escutem o nosso grito. Sem a implementação das propostas que apontamos não haverá crescimento nem desenvolvimento.”

Ainda no último dia da programação, foram aprovadas diversas moções propostas pelos dirigentes e a “Carta do VI Congresso Nacional dos Engenheiros”, que conclama o País sair da armadilha do encolhimento econômico, valendo-se da contribuição da engenharia, a qual deve resgatar seu papel ativo no esforço de desenvolvimento: “(...) O projeto ‘Cresce Brasil’ desencadeou uma força unitária na categoria dos engenheiros e dos profissionais da área tecnológica, que deve continuar a crescer nas entidades, empresas, faculdades, cidades e regiões, no processo de discussão e implementação das ações propostas. O sucesso dessa nova energia social ligada a uma ação transformadora dependerá da capacidade de articulação, superação das diferenças secundárias, incorporação de novas sensibilidades rumo ao objetivo maior, que decide nosso futuro como nação. Unir a engenharia aos setores produtivistas e desenvolvimentistas é imprescindível para conquistar as mudanças. (...) A engenharia brasileira participou decisivamente do processo em que o Brasil converteu-se numa economia dinâmica e diversificada.(...) O engenheiro é, por conseqüência, o profissional do desenvolvimento (leia íntegra no site www.fne.org.br).”

(RC/RR)

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