Energia

Privatização da Cteep: equívoco e falta de transparência

Rita Casaro

 

Atendendo a recomendação do Conselho Gestor do PED (Programa Estadual de Desestatização), presidido pelo secretário de Planejamento, Fernando Braga, o governador Cláudio Lembo marcou o leilão de venda da Cteep (Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista) para o dia 28 de junho.

A medida ignora argumentos dos técnicos do setor, que vêm apontando o equívoco de se privatizar a transmissão de energia, área estratégica no sistema elétrico interligado. Tal avaliação serviu inclusive de base ao modelo implementado durante o Governo Fernando Henrique Cardoso, que previa a desestatização apenas da geração e da distribuição. Há quem compare a transmissão, que leva a energia da usina à distribuidora, com a via pública por onde se transita e, portanto, não pode ter um dono particular, que possa eventualmente impedir a circulação ou cobrar demasiadamente caro por ela.

Proveniente da cisão da Cesp (Companhia Energética de São Paulo), a Cteep foi criada em 1999 e tem a tarefa de operar 99 subestações, com capacidade de transformação acima de 36.000MVA, e mais de 18.000 quilômetros de circuitos de transmissão, transportando cerca de 136.000GWh de energia. Conta ainda com um sistema integrado de coordenação, supervisão e controle do sistema elétrico. Tal patrimônio já foi avaliado pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) em R$ 13 bilhões.

Irredutível, o secretário de Energia, Recursos Hídricos e Saneamento, Mauro Arce, voltou a afirmar em reunião com dirigentes do SEESP, no dia 12 último, que será mantido o processo de venda, que tem por objetivo, segundo ele, angariar recursos para quitar dívidas da Cesp (Companhia Energética de São Paulo). Essas somam hoje aproximadamente R$ 10 bilhões, o que excede em muito o valor a ser arrecadado com o leilão da Cteep, cujo preço mínimo ficou definido em R$ 970 milhões ou R$ 756 milhões, caso os funcionários comprem as ações a que têm direito pelas regras do PED. “Isso é uma gota no oceano, o Governo não resolverá a situação da Cesp e perderá o controle sobre uma empresa lucrativa. Além disso, entregará a companhia com R$ 685 milhões em caixa, o que torna o preço mínimo ainda mais irrisório”, critica Francisco Oiring, diretor do sindicato.

A operação torna-se ainda mais inexplicável quando se olha para os resultados obtidos pela companhia. Somente em 2005, o lucro líquido chegou a R$ 468 milhões. “O valor acumulado nos últimos quatro anos chega a R$ 1,2 bilhão, o que já paga a empresa”, completa.

O presidente do SEESP, Murilo Celso de Campos Pinheiro, questiona também o fato de a retomada das privatizações acontecer às vésperas das eleições: “Acreditamos que o atual momento não seja o mais apropriado para que medida tão polêmica seja tomada. Mais prudente seria adiar a decisão para o próximo mandato, criando-se condições para que o devido debate sobre o tema seja travado e que a população seja plenamente informada de todas as implicações da privatização da Cteep.”

 

Processo nebuloso
A falta de transparência no processo de privatização da Cteep é justamente um dos pontos questionados na ação civil pública movida pela advogada Flávia Lefèvre em nome do SEESP. “Quando foi estabelecido o cronograma de privatização, estava prevista uma audiência pública, que ocorreu em 2005 quando não havia definição sobre o prazo do contrato de concessão (agora limitado a 2015), não estava pronta a avaliação da empresa que determinaria o preço mínimo e tampouco sabia-se quanto valiam os ativos da Cteep. Portanto, essa audiência aconteceu sem que os participantes pudessem ter informações essenciais, não tendo cumprido seu papel de esclarecer os cidadãos quanto ao processo”, explica ela.

O processo, que seria protocolado no dia 14, com uma cautelar preparatória pedindo a suspensão do leilão, também aponta irregularidades no edital de privatização, que impede a participação de empresas estatais e fundos de pensão na disputa. “Ainda que isso esteja de acordo com a lei do PED, é ilegal. O artigo que determina essa restrição está sendo objeto de uma ação direta de inconstitucionalidade. Copel e Cemig o estão questionando”, informa Lefèvre.

Além desses pontos, ela lembra que o SEESP enviou à Aneel, no mês de abril, uma série de perguntas sobre questões não suficientemente esclarecidas que não foram ainda respondidas pela agência. “Em 22 de maio, voltamos a cobrar essas explicações, mas até agora nada.”

 

 

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