Tecnologia

Caminho para a inclusão digital plena, nova TV aguarda definições

Soraya Misleh

 

A inserção de milhares de cidadãos ao mundo das novas tecnologias deverá ser impulsionada pelo advento da TV digital no País. “Trata-se de um diferente sistema de transmissão que permitirá o acesso à Internet, o ensino a distância e a interação do espectador com o conteúdo veiculado, entre outros benefícios. Poderá ser a porta de entrada do mundo digital nos lares brasileiros”, enfatiza o coordenador da Secretaria de Políticas de Informática do Ministério da Ciência e Tecnologia, Roberto Pinto Martins.

Atualmente, lembra ele, menos de 8% dos brasileiros nas cidades têm acesso à Internet e na região rural o índice é de apenas 0,02%. “Por outro lado, números do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que existem no País aproximadamente 54 milhões de aparelhos de TV. O principal objetivo desse esforço de desenvolver uma TV digital no Brasil é promover a inclusão social.”

Contudo, até o momento, não há definição sobre qual padrão o Brasil adotará para a nova tecnologia. Com o intuito de escolher o que seja adequado à realidade nacional, o Ministério da Ciência e Tecnologia, por intermédio da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos) e em parceria com o Ministério das Comunicações, publicou, em maio último, um edital para chamada pública de instituições, em que destina R$ 50 milhões do Funttel (Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações) para projetos na área – de um orçamento de R$ 65 milhões ao programa. “Foram habilitados cerca de 90 grupos de pesquisa”, afirma Martins. A consolidação dos resultados desses estudos está prevista para 2005, quando se terá, então, a proposta do modelo de referência ao SBTVD (Sistema Brasileiro de Televisão Digital).

Disputam o espaço nacional as plataformas DVB (européia), ISDB (japonesa) e ATSC (estadunidense). Cogita-se, ainda, um padrão próprio. Porém, o presidente da SET (Sociedade Brasileira de Engenharia de Televisão e Telecomunicações), Roberto Franco, alerta: “O sistema tem que ser compatível com os mundiais e é preciso estudar o que vale ou não a pena o Brasil desenvolver, sem desprezar o que já foi feito.”

 

Soluções – Para ele, a vantagem de se buscar o SBTVD é que tal permite o atendimento de necessidades específicas do País. Aqui a plataforma precisará, conforme Ronald Siqueira Barbosa, assessor técnico da Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão), ser flexível, passando por HDTV (alta definição), SDTV (sistema convencional), mobilidade e portabilidade. Na análise de ambas entidades, essa medida é imprescindível em um país tão heterogêneo como o Brasil, pois permite soluções adequadas a cada região. Além disso, o sistema deve ter forte robustez, para garantir a recepção de sinais com antena interna ou externa, alta definição e interatividade. “E há certos tipos de programas de TV para os quais é preciso ter aplicações específicas (softwares)”, acrescenta Franco.

Gunnar Bedicks Junior, professor da Escola de Engenharia da Universidade Mackenzie, acredita que seja possível desenvolver um modelo próprio, mas talvez não manufaturá-lo, em função do custo de produção. Nesse sentido, considera ele, utilizar um que já tenha fabricação em escala baratearia os preços. Conforme Franco, os riscos de se implementar um modelo próprio são de isolamento e desatualização. “O ideal é adotar uma das plataformas já existentes sob a condição de desenvolver soluções específicas ao País, com geração de propriedade intelectual e estímulo à pesquisa”, conclui. Assim, na sua concepção, a Nação não teria um modelo exclusivista e segregacionista e, com uma negociação adequada, não ficaria dependente de sistemas de terceiros, o que estaria longe do desejável. “O Brasil tem que ter poder de influenciar no padrão e o direito de propor modificações”, completa.

Entre os modelos existentes, ele afirma que o europeu é o mais avançado tecnicamente. “Os três têm diferenças tecnológicas significativas. O Brasil poderia fazer acordo com o DVB ou o ISDB e propor adaptações para servir como plataforma. O maior problema no ATSC é que a modulação (camada de transporte final) não tem desempenho tão adequado ao nosso País. Não é robusto o suficiente para a recepção de sinais em condições não muito boas. Não oferece mobilidade, portabilidade e não permite antena interna simples”, continua.

 

Realidade nacional – Além de definir um padrão apropriado, o trabalho que está sendo desenvolvido passa, segundo Martins, pela condição de que todos os brasileiros que têm um aparelho analógico em casa possam adquirir um terminal que converterá o sinal digital para o seu equipamento. “O custo desse dependerá de sua complexidade, das facilidades que oferece. Entretanto, acredito que os mais simples não custarão mais que uma fração do preço de uma TV analógica”, avalia. Segundo Franco, um conversor hoje fica em torno de 100 dólares, o que equivale a 10% do valor encontrado nos Estados Unidos de uma TV digital – e os preços vêm caindo ano a ano.

Com a tecnologia, dá para se vislumbrar um novo cenário. “Além da qualidade do vídeo, eu vejo a possibilidade de o serviço eletrônico do Governo chegar à população mais carente através do rádio e televisão digital”, constata Bedicks. Para o presidente da SET, é o caminho para a inclusão digital plena, à espera da decisão governamental para ser trilhado.

 

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